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Síndrome de Barrichello

Você tem andado com o freio de mão puxado na carreira? Pois trate de acelerar e vencer o medo do sucesso

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 09h32.

A realidade óbvia sobre Rubens Barrichello é que sua Ferrari parece estar permanentemente com o freio de mão puxado." A frase, estampada pelo jornal inglês The Times em um de seus artigos do ano passado, parece resumir o que o mundo todo pensa sobre o principal piloto brasileiro da Fórmula 1 na atualidade. Apesar de estar na Ferrari, a equipe dos sonhos de todo piloto, e receber algo em torno de 5 milhões de dólares por ano, poucos conseguem enxergá-lo como um profissional de sucesso, um verdadeiro campeão capaz de empolgar a torcida. Há um quase consenso de que Barrichello dificilmente atingirá o sucesso alcançado por Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet e Ayrton Senna, todos campeões mundiais. Mas, apesar das críticas, não há como negar que ele tem qualidades. Sua fama de "arrumador" de carros é notória e o conduziu à principal escuderia da F-1. Tecnicamente está entre os melhores da atualidade. Além disso, nunca se descuidou da parte física. Por que, então, esse conjunto de fatores não se traduz em vitórias na pista? Por que o freio de mão continua puxado?

Para piorar a situação e a sua imagem de piloto, Rubinho participou neste ano de um momento nada nobre da história dos grandes prêmios de F-1. No último GP da Áustria, ele foi obrigado a ceder o primeiro lugar a Schumacher. Sem contestar a ordem dos boxes, praticamente parou o carro a poucos metros da bandeirada para deixar o alemão ultrapassá-lo. A repercussão foi muito negativa, tanto para a Ferrari como para Schumacher e para o próprio Rubinho. Os torcedores que pagaram caro para assistir ao GP sentiram-se logrados. Já no GP da Europa, em Nürburgring, realizado em junho, Barrichello liderou praticamente toda a prova. Dessa vez, a orientação da equipe foi para que o alemão, que estava em segundo, não tentasse a ultrapassagem. Com isso, ofuscou o brilho da vitória de Rubens Barrichello, uma vez que haverá sempre a suspeita: ele ganhou por méritos próprios ou porque Schumacher decidiu não apertá-lo? No último GP da França, realizado no dia 21 de julho, o piloto brasileiro sequer largou. A razão é patética: os mecânicos esqueceram um macaco debaixo de sua Ferrari no grid. Nos boxes, o carro apagou e Barrichello desistiu de vez da corrida.

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Traçando um paralelo com o universo corporativo, é possível dizer que o desempenho de Barrichello nas pistas se assemelha ao de inúmeros profissionais que conhecemos em nosso dia-a-dia. Gente de talento que, na hora H, tira o pé do acelerador para não cruzar a linha de chegada em primeiro lugar. Abrem mão de uma promoção, se escondem quando a empresa oferece maiores responsabilidades, deixam de fazer seu marketing pessoal. Pessoas que têm medo do sucesso, por mais absurdo que isso possa parecer. Afinal, esse deveria ser o objetivo de todo profissional. Onde está, então, o entrave? A resposta, para alguns especialistas, está em nossa mente, mais precisamente no inconsciente. Trata-se de um mecanismo de defesa que nos conduz à derrota sem que tenhamos consciência disso. E essa armadilha começa a ser estruturada já na infância. "Por causa da educação tradicional dada pelos pais, as pessoas, com raríssimas exceções, tornam-se perdedoras ao longo da vida", afirma o preparador físico e mental Nuno Cobra, autor do best seller A Semente da Vitória (Editora Senac) e ex-mentor de Ayrton Senna, tri-campeão mundial de F-1.

De acordo com sua tese, os pais, no desejo de fazerem do filho um vencedor, chamam a atenção para seus defeitos a fim de que ele não os repita no futuro. "A criança cresce ouvindo dos pais frases como você não consegue fazer nada direito ou você não aprende mesmo ", afirma. "Depois é a vez da escola, onde professores despreparados anulam o talento do aluno em vez de estimulá-lo. Várias religiões, por sua vez, apontam pecados nas mínimas ações do dia-a-dia. Há um grande conflito interno. Com isso, a sociedade mostra à criança que ela não nasceu para dar certo. É um massacre."

O fantasma do fracasso

Homens e mulheres que crescem e se desenvolvem dentro desse contexto social tendem a não gostar de assumir riscos ao longo da vida. Sentem pavor do fracasso, da possibilidade de errar, de trocar o certo pelo incerto, de perder dinheiro e de prejudicar sua imagem. A psicoterapeuta Norka Bonetti, professora do departamento de psicodrama do Instituto Sedes Sapientiae, de São Paulo, ratifica a tese de Nuno Cobra. "Os pais são responsáveis pela formação da auto-estima da criança", diz. "Se elas recebem estímulos positivos quando pequenas, crescerão mais confiantes." Em sua análise, Norka foi buscar na própria etimologia da palavra sucesso a explicação para o fato de muitos fugirem das boas oportunidades. Segundo o dicionário Novo Aurélio, sucesso tem como um de seus significados aquilo que sucede, que tem uma continuidade. Ou seja: não basta apenas alcançar o sucesso, é preciso mantê-lo com uma série de ações. E é justamente esse processo de manutenção que assusta as pessoas, diz a psicóloga. "Muitos profissionais preferem fazer um trabalho mediano a ter a preocupação de se sustentar a cada novo degrau escalado."

A verdade é que nem todos gostam de se arriscar para manter o lugar ao sol. Um gerente com potencial para assumir um cargo de diretoria, por exemplo, pode achar extremamente desagradável ter de conviver com outros executivos e ser obrigado a fazer alianças que o garantam no novo cargo. Ele começa a se questionar se deseja o mesmo tipo de vida que boa parte desses profissionais leva: trabalho até tarde da noite todos os dias, pressão por resultados, a família em segundo plano. "Nessas horas, a pessoa cria um mecanismo de auto-sabotagem", afirma o psiquiatra e consultor organizacional Roberto Shinyashiki, autor de inúmeros livros, entre eles Sem Medo de Vencer (Editora Gente). "É um conflito intenso: ao mesmo tempo que ele deseja o cargo, sente medo, como se lá no topo uma grande tragédia o aguardasse. Conheço pessoas que se apresentam como vítimas para não ganhar a promoção. Assim, elas permanecem num cargo que não exige horas extras nem a obrigação de liderar grupos. Apenas anseiam desesperadamente pelo fim do expediente."

O consultor de carreira Gutemberg de Macedo, da Gutemberg Consultores, segue o mesmo raciocínio. Segundo ele, diferentemente da pessoa que tem medo de naufragar nesse mar turbulento, o vencedor ignora tais temores. "Ele está sempre um passo à frente, tem autoconfiança, carisma, ambição, gosta de conviver com pessoas exigentes, trabalha em busca de novas oportunidades e tem um plano de longo prazo. Sonha em ficar rico, mas não da noite para o dia."

Voltando à Fórmula 1. Muitos consideram Rubens Barrichello tecnicamente no mesmo nível do piloto alemão Schumacher, tetracampeão mundial. "A diferença está na forma como cada um encara as corridas", diz Nuno Cobra, que trabalhou com Rubinho no início da década de 90. Schumacher dá a impressão de ser capaz de passar por cima dos adversários. Em momento algum ele coloca em questão sua capacidade de vencer. Já Barrichello... "Sinto que ele duvida da própria capacidade, mesmo sendo superior tecnicamente", afirma. "Ele não tem uma atitude mental positiva, que é o que distingue o vencedor do perdedor. No início da carreira, tinha um corpo emocional sólido, que foi se desestruturando aos poucos com a preferência da Ferrari por Schumacher e as implacáveis críticas da mídia." Um dado complementar: Rubinho está com 30 anos e tem apenas duas vitórias na Fórmula 1. Em sua idade, Fittipaldi, Piquet e Senna já tinham pelo menos um título mundial no currículo.

Atitude vencedora

A comparação entre Barrichello e Ayrton Senna é outro aspecto inevitável. Quando Senna morreu, em 1994, recaiu sobre Rubinho toda a expectativa dos brasileiros. E ele não estava preparado nem tinha um carro competitivo nas mãos para corresponder aos anseios da torcida. Mais ainda: não tinha -- e não tem -- a estrela nem uma mente focada no sucesso como Senna. "O Ayrton tinha a visão da vitória", diz Cobra. "Antes das largadas, ele se concentrava e fazia mentalmente todo o trajeto da pista. Imaginava-se fazendo grandes ultrapassagens, trocando as marchas e cruzando a linha de chegada em primeiro lugar. Quando isso não se concretizava, não se lamentava. Não importava se o pneu tinha furado na última volta ou se a gasolina acabado uma curva antes da bandeirada final. Imediatamente começava a pensar na próxima corrida e no que precisava mudar para vencer. Não era uma atitude mental de submissão, de derrota."

Inimigos da perfeição

Há profissionais que perdem boas oportunidades de crescimento por ser perfeccionistas. São pessoas que não se dão o direito de errar. Debruçam-se exaustivamente sobre um projeto e podem perder o prazo da entrega do relatório por causa de um detalhe insignificante. É um comportamento bem diferente do de quem trabalha por excelência. Neste caso, estamos falando daqueles que se dedicam de corpo e alma, mas não se prendem a detalhes porque estão focados no todo. Além disso, têm a humildade de saber que podem errar -- e se isso acontecer, têm a certeza de que possuem todas as condições de corrigir as falhas.

Em seu livro sobre o medo de vencer, Roberto Shinyashiki descreve o que ele acredita ser a postura do vencedor: "Quando não sabe, pergunta. Quando não pode, não promete. Quando promete, cumpre. Quando sabe, assume. Quando assume, faz". Já o perdedor, na sua opinião, assume uma atitude derrotista: procura mostrar-se valendo pouco, mas no fundo se considera o máximo. Não se aprimora porque acredita que não precisa ou que não exista alguém capaz de ensiná-lo. "Ele se coloca como um mendigo, mas se sente um rei. Assim como o sucesso, o fracasso também é resultado de estratégia e dedicação contínua."

Construir uma carreira de sucesso requer mais do que um diploma de primeira linha. Exige disposição e humildade em aceitar que sempre há algo novo para aprender, saber lidar com os erros e aproveitar as oportunidades. É preciso acreditar num sonho pessoal e não desistir dele. Há um fator, no entanto, ainda mais determinante para o sucesso e que é enfatizado pela psicóloga Norka Bonetti: "A raiz do sucesso é o autoconhecimento, que permite enxergar nossas aptidões e, com base nelas, escolher a profissão que as contemple". Talvez falte esse conhecimento a Barrichello. Quem sabe se, ao fazer essa lição de casa, não renasça aquele campeão que fazia um sucesso estrondoso nas categorias inferiores?

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