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O poder dos invisíveis

Muitos de seus melhores profissionais não estão atrás de fama, promoção nem poder. Em seu recém-lançado livro, o jornalista americano David Zweig explica o que buscam essas pessoas e por que elas são fundamentais para sua empresa

Livros em prateleira (inner_vision/Flickr)
DR

Da Redação

Publicado em 16 de outubro de 2014 às 11h42.

São Paulo - Antes de chegar às mãos do leitor, um texto passa pelo olhar atento do revisor, que checa cada palavra, vírgula e ponto. Normalmente, esse trabalho não é notado por quem folheia um livro ou uma revista, mas, se um erro de grafia salta à vista, aquele profissional até então invisível é lembrado. O americano David Zweig, de 39 anos, costumava ser essa pessoa capacitada, mas que raramente se destacava no trabalho.

Foi com base nessa constatação que ele decidiu buscar outros indivíduos com o mesmo perfil e que, apesar de trabalhar nos bastidores, estavam no topo da carreira . A busca durou dois anos e resultou no livro Invisibles: the Power of Anonymous Work in an Age of Relentless Self-Promotion (numa tradução livre, “Invisíveis: o poder do trabalho anônimo na era da autopromoção”).

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Lançada em junho pela editora Penguin Group, a obra do jornalista nova-iorquino fala justamente sobre os talentos que cumprem um papel importante em uma organização, mas que não estão nem pretendem estar sob a luz de um holofote.

De acordo com os estudos de Zweig, que escreve para a Harvard Business School­ e para o jornal The New York Times, os chamados “invisíveis” não são necessariamente tímidos, quietos e antissociais — eles simplesmente mantêm uma relação diferente com o reconhecimento.

Em uma sociedade em que uma em cada sete pessoas do planeta tem um perfil no Facebook, esses indivíduos trocam seu minuto de fama pelo anonimato de um trabalho benfeito. Para eles, mais importante do que se autopromover é buscar a excelência nos desafios lançados e se satisfazer com o sentimento de missão cumprida. Diante desse funcionário mais discreto, surge, então, a pergunta: como gerenciá-lo? Essa e outras dúvidas são esclarecidas por Zweig na entrevista que ele concedeu à VOCÊ RH.

VOCÊ RH - Como surgiu a ideia do livro?

David Zweig - Trabalhei durante muitos anos como revisor em uma revista. Portanto, eu mesmo costumava ser um invisível. Naquela época percebi que, quanto melhor fazia meu trabalho, mais desaparecia — sentido inverso ao da maioria das funções. Essa logística me pareceu muito interessante porque, apesar de não chamar a atenção, aquele era o emprego mais recompensador que tive em anos.

Comecei a pensar em como, em um mundo em que todos procuram seu minuto de fama, alguns escolhem propositalmente profissões que ficam atrás do palco. Queria conhecer outras pessoas com esse estilo e que estivessem no topo de seu campo de atuação. Para isso, saí pelo mundo em uma pesquisa que durou pouco mais de dois anos.

VOCÊ RH - E o que você descobriu?

David Zweig - Descobri indivíduos habilidosos, que desempenham um papel crítico nas organizações, mas que, mesmo assim, não se fazem notar. Ser invisível é mais do que um traço psicológico ou uma característica profissional, é uma mentalidade. Mesmo um CEO pode ser invisível, porque tudo se resume à postura.

Por exemplo, na China conheci um engenheiro civil, chamado Dennis Poon, que havia trabalhado em projetos de muitos arranha-céus. Esses prédios custam bilhões de dólares, e Dennis era encarregado de uma grande equipe e de questões como a segurança dos funcionários. Mesmo sendo um líder com muitas responsabilidades, ele não se preocupava em aparecer ou disputar a atenção com o arquiteto, que fatalmente se destacava mais nas obras.

Em nossas conversas, Dennis colocava o trabalho em primeiro lugar e sempre usava o pronome “nós”, em vez de “eu”. Justamente por não gastar tempo fazendo marketing pessoal, os invisíveis costumam mostrar maior preocupação com o time e, portanto, grande espírito de equipe.

VOCÊ RH - Como eles podem evoluir na trilha de carreira se, de certa forma, são mais reclusos?

David Zweig - O invisível não é necessariamente introvertido ou tímido. Ele também não se esconde pelos corredores da companhia nem abomina a autopromoção. Quem tem esse perfil gosta de ser reconhecido, de ganhar dinheiro, de receber uma promoção, mas não são essas coisas, digamos, mais palpáveis que o estimulam. A motivação é mais intrínseca, ela surge do trabalho em si.

Aliás, essa é uma das três características que notei em todos os invisíveis que conheci. Eles são ambivalentes em relação ao reconhecimento: ao mesmo tempo que ficam felizes em recebê-lo, não gostam da disputa por ele. A verdade é que tais indivíduos não precisam de uma palavra de incentivo a cada hora, pois sua energia está mais voltada para cumprir as tarefas com excelência.

VOCÊ RH - E qual é o papel do gestor de recursos humanos nesse processo?

David Zweig - Um dos conselhos que dou às empresas e aos RHs é o seguinte: mudem sua cultura. Muitas companhias criam programas que não atendem à diversidade de funcionários e, no fim das contas, geram uma competição prejudicial. A política de portas abertas, por exemplo, considerada uma medida revolucionária por tornar os líderes mais acessíveis, não agrada a todo mundo.

Alguns podem se sentir intimidados a ir à sala do chefe ou obrigados a visitá-lo porque todos na equipe têm essa atitude. Talvez eles prefiram tratar os assuntos por e-mail. Em uma organização em que os funcionários sentem que precisam fazer marketing pes­soal sempre, surge um sentimento de competitividade.

E quem não é adepto da autopromoção pode forçar esse comportamento por medo de ficar estagnado no organograma. Isso não é bom, pois gera mais competição. Não estou dizendo que o marketing pessoal seja ruim, mas que a obsessão por anunciar suas conquistas e qualidades pode tirar o foco do que é mais importante: o trabalho. Se a cultura muda, em vez de competir uns com os outros por atenção, os funcionários ficam mais preocupados em trabalhar melhor, entregar-se mais e sentir satisfação nisso.

VOCÊ RH - As empresas já sabem identificar e lidar com os invisíveis?

David Zweig - Os processos e programas ainda se voltam, na maior parte das vezes, para um tipo único de perfil, aquele que é mais expansivo. Não que ele não tenha seu papel na estrutura empresarial, mas falta um olhar mais cuidadoso para os outros. O processo seletivo, por exemplo, acaba muitas vezes excluindo gente extremamente talentosa, mas que tem dificuldade de discursar sobre si mesma.

Em uma entrevista, você deve, sim, falar de suas conquistas, de seus pontos fortes, de seus planos futuros, mas entendo que o RH deveria investigar também o que motiva essas pessoas.

Adam Grant, professor e pesquisador na Wharton School­, da Universidade da Pensilvânia, defende que, quando há indivíduos que se doam, que não estão preocupados em ser o centro das atenções e que são de fato colaboradores, não só a organização prospera como também essas pessoas têm grande chance de liderar o grupo.

VOCÊ RH - Os invisíveis, então, seriam bons líderes?

David Zweig - Sim, e acho que o principal motivo é o exemplo que eles dão. Quando você se importa mais com o projeto em si ou com a qualidade de seu trabalho, isso demonstra um enfoque maior na corporação do que no “eu”. Líderes invisíveis não são líderes omissos, são gestores cuja motivação está no trabalho e no coletivo. E, hoje em dia, as empresas precisam mais disso.

VOCÊ RH - Quais lições esses profissionais podem dar?

David Zweig - Ao longo de minha pesquisa, percebi que existe muita gente por aí que não quer se expor, e hoje isso é complicado, pois estamos num mundo em que a palavra de ordem é aparecer. O que meu livro oferece é quase uma permissão para os invisíveis serem assim. É como se dissesse: “Ei, você não precisa estar sob os holofotes para ser bem-sucedido”.

Todos os invisíveis que conheci me ensinaram que, sim, é possível crescer na carreira e ser o primeiro em sua área de atuacão focando apenas a carreira, e não a autopromoção. Nenhum dos personagens do livro precisou chamar a atenção para si mesmo para subir na carreira.

O reconhecimento profissional é fruto da alta qualificação. Expansivos são importantes, mas as empresas também precisam de mais pessoas “silenciosas” e que se bastem.

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