Networking de qualidade
Um novo estudo mostra que na hora de gerenciar a rede de contatos, confiança e troca de conhecimento valem mais que mil cartões corporativos
Da Redação
Publicado em 15 de julho de 2013 às 16h39.
São Paulo - Se você considera importante manter mais de 500 contatos no LinkedIn ou se orgulha da coleção de cartões corporativos, é melhor repensar sua estratégia de networking. Dois estudos recentes mostram que qualidade é melhor que quantidade na hora de montar uma rede de contatos eficiente — aquela que de fato vai ajudá-lo a resolver problemas de negócios e a encontrar um novo emprego.
Uma das pesquisas é a do antropólogo inglês Robin Dunbar, que ficou conhecido nos anos 90 por pregar que o cérebro humano é capaz de estabelecer círculos de amizade com no máximo 150 pessoas. O cientista, da Universidade de Oxford, refez a pesquisa analisando o tráfego de sites de relacionamento, como Facebook e Plaxo, e concluiu que a tecnologia não ajuda na expansão da rede de amigos.
Mesmo com mil contatos no LinkedIn, uma pessoa interage pela web, no período de um ano, com no máximo 150, repetindo o comportamento do mundo real. Em outro estudo, os americanos John Hagel e John Seely Brown, do Center for the Edge, instituto de análises da consultoria Deloitte, propõem uma revisão na maneira convencional de fazer networking.
Segundo os consultores, a abordagem comum, que consiste em conhecer muitas pessoas e recorrer a elas quando necessário — como na hora de procurar emprego —, acaba criando relacionamentos baseados em interesse, em que um lado enxerga o outro com desconfiança. O método não funciona na prática porque, dizem os autores, não cria engajamento entre as partes na solução do seu problema.
O que dá certo numa rede de contatos, diz John Hagel em entrevista a VOCÊ S/A, é investir na criação de relacionamentos consistentes, baseados em confiança. Só que isso leva tempo e exige esforço pessoal, o que acaba por eliminar a possibilidade de envolver muitas pessoas. Mas como desenvolver essa rede qualificada?
“A resposta é a troca de conhecimento”, explica Hagel, que, com seu colega Brown, lançará em abril, nos Estados Unidos, o livro The Power of Pull (“O poder de puxar”), sem previsão de publicação no Brasil, no qual apresentam a teoria de networking eficaz.
A base da tese é a utilização de um tipo de conhecimento que os autores batizam de “tácito”, uma série de aprendizados que a pessoa guardou de suas experiências, mas que não tem facilidade para expressar. Ao contrário das realizações que o profissional usa para fazer marketing pessoal, o conhecimento tácito só vem à superfície quando há um diálogo franco entre duas pessoas.
“Uma conversa atenta permite que a experiência mais rica do profissional apareça”, diz Flávia Portella, consultora da DBM, empresa de outplacement, que trabalha com executivos que precisam aprimorar o networking para se recolocar.
Explorar a sabedoria que você tem, mas não sabe, não é um exercício fácil. Requer do profissional disposição para ouvir com atenção e aprender com a outra pessoa. A partir do que o outro diz, você pode verificar o seu repertório — seu conhecimento tácito — e sugerir soluções para ele.
Quando o conselho é bom, e se transforma em ajuda efetiva, você ganha pontos com essa pessoa. Ela se sentirá grata e, quando você tiver um problema, ela vai tentar ajudá-lo. Agora, imagine fazer isso com mil pessoas. É improvável que você consiga. Por isso, colecionar cartões de apresentação é uma tarefa quase inútil se não tiver um vínculo forte com o dono do cartão.
Para os consultores da Deloitte, fazer networking é, acima de tudo, um exercício de coragem. “Expressar esse saber tácito é desafiador porque exige disposição para reconhecer fraquezas pessoais e erros”, explica Hagel. Pode ser duro, mas conseguir fazer isso, porém, é a chave do sucesso.
“Mostrando suas questões mais pessoais você deixa os outros saberem quem você realmente é”, diz Flávia Portella, da DBM. Mais importante e eficiente que ficar perguntando a história dos outros profissionais, segundo Hagel, é encontrar pessoas que compartilhem o mesmo desafio que você e, a partir daí, tentar resolver o problema em conjunto. “Além de somar os conhecimentos existentes, as pessoas podem desenvolver coisas novas juntas, o que é mais legal”, explica.
Ajuda natural
Em busca de compartilhar questões profissionais, um grupo de vice-presidentes e diretores de marketing de grandes empresas se reúne mensalmente em São Paulo, no comitê de executivos de marketing da organização internacional World Trade Center (WTC). O grupo é restrito a 40 pessoas, para garantir alto nível na conversa.
Isso cria um espaço onde os executivos se sentem à vontade para expor questões estratégicas, que são difíceis de ser discutidas dentro da empresa. A base da coisa é confiança. Os números discutidos ali nunca são expostos e concorrentes são proibidos.
“Isso permite que a gente receba conselhos qualificados, estabeleça boas parcerias de negócios e crie uma proximidade profissional”, diz Marcus Vinicius Georgi, diretor de marketing da SAP, responsável pela unidade Business Objects. Quando o networking é feito dessa maneira, as sondagens de emprego aparecem de modo natural entre dois conhecidos. “O lado da carreira faz parte desse convívio”, diz Marcus Vinicius.
No networking convencional, você empurra seus interesses para os outros, disparando e-mails e telefonemas para pessoas com as quais tem pouca intimidade. O certo, diz John Hagel, é fazer o contrário, ou seja, atrair pessoas para perto de você. A sugestão do consultor é comunicar quais são as coisas de que gosta, nas áreas em que se considera competente.
“Isso pode ser feito em qualquer meio, de redes virtuais a festas, de apresentações corporativas a discussões no café do corredor”, afirma. “Se o interlocutor tiver interesses e conhecimento nos mesmos assuntos, o receio de se expor diminuirá e será superado pelo desejo de se conectar e aprender.”
Embora estejam ligados à imagem do networking comum, na qual quantidade é mais importante do que qualidade, sites de relacionamento, como LinkedIn e Facebook, podem ser bem utilizados. A boa prática consiste em buscar pessoas que compartilhem o mesmo interesse, o que é diferente de pedir favor.
“Você pode atrair gente que vive dilemas semelhantes ao seu que você nem sabia que existia”, diz Hagel. Esta é, por exemplo, a história razoavelmente conhecida da origem do sistema operacional Linux, rival do Windows, da Microsoft.
Seu “pai”, o finlandês Linus Torvalds, tentando solucionar um problema pessoal de programação de computador, resolveu pedir a ajuda de outros programadores pela Usenet, uma rede ancestral à internet. Sem querer, descobriu que havia, ao redor do mundo, vários programadores com o mesmo desafio.
“O Linus Torvalds publicou o código do sistema e, a partir daí, angariou uma comunidade de voluntários que tinha os mesmos objetivos e problemas, que se dispôs a contribuir”, conta Rafael Peregrino da Silva, CEO da Linux Media, editora que publica a revista Linux Magazine.
Novas práticas
Para John Hagel, do Center for the Edge, esse novo tipo de networking exige que as pessoas mudem seus hábitos. Entre as ações citadas estão desde a criação de blogs ou a participação de discussões online até escolher viver em cidades ou bairros onde um determinado tipo de conhecimento é explorado de maneira mais intensa.
“A meta é pensar sempre em como atrair para nós mesmos a atenção de pessoas relevantes”, diz Hagel. O publicitário paulista Guilherme Loureiro, de 28 anos, gerente de mídia digital da agência de publicidade Talent, ganhou notoriedade na comunidade de mídia eletrônica por meio de um evento que começou a organizar há dois anos, o Happy Hour do Mercado Digital.
De um encontro de networking para 16 pessoas, o evento cresceu e chegou a ter 500 participantes em uma de suas edições. Em um determinado momento, Guilherme resolveu criar uma comunidade virtual na rede Ning, a Happy Hour do Mercado Online (HHMOnline), que hoje conta com 1 600 profissionais de publicidade digital.
“Conheci muitas pessoas, já fui convidado para dar palestras”, diz. A maior contribuição da rede, afirma Guilherme, é exatamente proporcionar que pessoas com desafios comuns se encontrem e troquem informações.
“Pensei na rede como uma forma de conectar profissionais jovens, que sofrem com pouco espaço para crescer no mercado”, diz ele. “O legal é ver as pessoas se conectando, trocando informações, fazendo negócios e arrumando vagas.”
Segundo Hagel, o mundo está entrando numa fase em que para ser inovador ou manter-se competitivo é importante ter acesso aos locais onde circulam as melhores informações — e as pessoas só vão conquistar esse acesso por meio de relacionamentos de confiança. Se você ainda não havia pensado nesse tipo de networking, está na hora de começar.