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Nem a Mulher-Maravilha nem o Superman estão bem o tempo todo. E tá tudo bem!

Assumir sua vulnerabilidade é um bom remédio para a liderança deixar de ser zumbi e assumir a busca pelo conhecimento, diz Adriano Lima, o novo colunista da EXAME

Adriano Lima: "Com a covid-19, o medo do futuro e a incerteza do que seria a vida dentro e fora das organizações causou pânico nos sabichões da liderança. Não havia resposta certa, como nunca há ou houve." (Divulgação/Divulgação)

Adriano Lima: "Com a covid-19, o medo do futuro e a incerteza do que seria a vida dentro e fora das organizações causou pânico nos sabichões da liderança. Não havia resposta certa, como nunca há ou houve." (Divulgação/Divulgação)

Adriano Lima
Adriano Lima

Autor do livro "Você em Ação"

Publicado em 26 de julho de 2023 às 12h44.

Última atualização em 26 de julho de 2023 às 13h36.

Já pensou em como é bom admitir que seu conhecimento é limitado, que você também erra, que é vulnerável ou, simplesmente humano, no ambiente de trabalho? Se você tem medo de expor esse seu lado, é melhor repensar para não perder grandes prêmios.

"Certo! Absolutamente certo!". A frase, para muitos, pode ser desconhecida, mas para quem tem um pouco mais de anos de vida (ou que faça uma rápida pesquisa no Google), era o bordão que o apresentador J. Silvestre soltava a cada resposta correta dada pelo candidato ou candidata que participava do programa “O céu é o limite” – que ficou no ar por cerca de 30 anos, entre 1955 e 1985, passando por várias emissoras.

Dar a resposta certa não era apenas um dever de quem buscava, diante das câmeras e de quase todo o Brasil, ganhar milhões de cruzeiros (moeda da época) ou o grande prêmio final, uma espécie de tudo ou nada, com uma única pergunta que colocava todas as conquistas até então na corda bamba. Responder corretamente era, e em muitos casos ainda é, uma necessidade de muitos profissionais – em especial em posições de liderança.

Sem querer fazer uma alusão a outro programa de TV exibido no Brasil, "Papai sabe tudo" (ou "Father knows best", no original), ainda vemos muitos gestores e líderes bancando o grande sábio que tem todas as respostas para tudo, uma espécie de panaceias corporativas ambulantes. Isso porque panaceia significa remédio para todos os males.

Na verdade, estão muito mais para zumbis corporativos. “Morreram”, mas ainda continuam zanzando por entre corredores ou conversas via algum dispositivo de comunicação a distância, sempre cientes de tudo. Zumbis de super homens e mulheres maravilhas.

Por que é bom não saber de tudo

Um pouco antes da pandemia, em muitas empresas já se percebia um movimento a favor de uma liderança mais “humana”, com empatia, escuta ativa e outras competências básicas do convívio humano civilizado que colocaram o nome de soft skills.

Com a covid-19, o medo do futuro e a incerteza do que seria a vida dentro e fora das organizações causou pânico nos sabichões da liderança. Não havia resposta certa, como nunca há ou houve.

No entanto, admitir essa fraqueza de não saber o que responder era algo impensável. Era como fazer uma prova e ter de tirar sempre as maiores notas por meio das respostas sempre certas – encontradas no texto do livro didático. Infeliz ou felizmente, nem sempre o by the book funciona em termos de carreira ou de mercado, sobretudo em um mundo VUCA e BANI.

O que é muito bom, assim como expor que não sabemos tudo sobre tudo, que não temos sempre a solução na ponta da língua. Se assim fosse, para que falar tanto de lifelong learning, por exemplo?

Você já deve ter ouvido falar de muitas vantagens sobre mostrar-se vulnerável no trabalho. Para a liderança, isso significa criar uma relação mais próxima, empática e de confiança com os demais colaboradores, por exemplo. O que, a reboque, impacta em aumento de produtividade, engajamento...

Além disso, vejo outras vantagens em assumir que somos simplesmente humanos. Não se fala tanto em “gestão humanizada”? É o passo principal para isso. Bem como é a base para fortalecer aquele espírito de eterno aprendiz. Em um mundo que muda rapidamente, essa característica é fundamental. Saber que nada sabe é algo filosófico, sem dúvida.

"Nos dias de hoje, quando você para de aprender e de evoluir, você começa a morrer. É preciso estarmos nos reinventando sempre, procurando outras coisas, nos adaptando ao novo ambiente, porque o ambiente está sempre evoluindo", disse-me Roberto Setubal, copresidente do conselho de administração do Itaú Unibanco, para meu primeiro livro que está para chegar nas livrarias.

Os tais zumbis a que me referi são essas pessoas que deixaram de lado a humidade de assumirem sua vulnerabilidade e hoje andam sem destino, caricaturas de si mesmos ou de um estilo de gestão ou de liderança que não encontra mais espaço no mundo do trabalho. A não ser em programas de TV.

O fim da ditadura do marketing pessoal

Outro aspecto positivo que vejo com a vulnerabilidade é o fim da ditadura do marketing pessoal como o conhecemos hoje. Uma das premissas básicas do saber se vender é ressaltar o que você tem de melhor e esconder o que não é essas coisas. E caso alguém do RH pergunte, em uma entrevista de emprego, qual é seu maior defeito, responder que é ser perfeccionista é a melhor alternativa. Afinal, qual empresa não gostaria de ter um super herói em suas fileiras?

Pensando bem, a vulnerabilidade não apenas nos coloca diante da busca contínua por conhecimento e derruba por terra a ditadura do marketing pessoal de um ou de uma profissional sem defeitos (o único defeito é buscar ser sem defeito): ela faz repensar os processos de recrutamento e seleção.

Como o entrevistador pode tirar do candidato esse lado humano e colocá-lo na conversa de forma sadia? Como o candidato pode se abrir, sem medo de ser entendido como fraco ou não apto?

Talvez a resposta esteja em nosso jeito de ser. Para compensar ou embarcar no sucesso de "Papai sabe tudo", foi criada a série "Papai sabe nada". Exibida nos anos 1960 pela TV Record, ela trazia as confusões criadas por Renato Corte Real, um pai de família que não sabia lidar com questões familiares e cotidianas. Foi um dos programas humorísticos de maior audiência da época.

Saibamos usar nossa vulnerabilidade em admitir que não sabemos de tudo. Não banquemos os zumbis corporativos. Sejamos sinceros em dizer, diante de um grupo ávido por uma resposta, “não sei, vamos descobrir juntos?” Assim, você estará certo, absolutamente certo. E o CEO pode ser seu (posto) limite, rs.

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