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Um Cade paralisado à espera do embaixador Eduardo Bolsonaro

A autarquia responsável por analisar aquisições está com processos na geladeira desde julho. O principal motivo? A indicação de Eduardo à embaixada

Eduardo Bolsonaro: governo se mexe para conseguir a aprovação do deputado federal como embaixador nos Estados Unidos (Paola de Orte/Agência Brasil)

Eduardo Bolsonaro: governo se mexe para conseguir a aprovação do deputado federal como embaixador nos Estados Unidos (Paola de Orte/Agência Brasil)

AJ

André Jankavski

Publicado em 2 de setembro de 2019 às 16h38.

Última atualização em 3 de setembro de 2019 às 16h11.

São Paulo – No último sábado (31), em almoço com jornalistas, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que atendeu pedidos de congressistas para preencher as vagas abertas do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A justificativa dele foi que era necessário para “conseguir governar”. Ele, no entanto, omitiu que é parte interessada no “toma-lá-dá-cá” da vez: em troca dos cargos, Bolsonaro que ver o filho, Eduardo, embaixador nos Estados Unidos.

Essa é uma opinião consonante no Congresso e até entre profissionais que atuam na área de fusões e aquisições. “O governo vai negociar com tudo e com todos para ter a nomeação do Eduardo Bolsonaro no Senado”, diz o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP). O grande problema é que essa disputa está paralisando o Cade desde o dia 17 de julho. O ocaso do conselho começou com o fim do mandato do conselheiro Paulo Burnier.

A autarquia, vinculada ao Ministério da Justiça e que atua na análise de fusão de empresas e pelo julgamento de infrações, como a prática de cartéis, é composta por 7 membros. Até agora, estão atuando apenas o presidente, Alexandre Barreto, e os conselheiros Paula Farani e Maurício Maia. Para se realizar julgamentos e aferir decisões é necessário, pelo menos, a participação de quatro integrantes.

Resultado: 47 negócios, que foram anunciados desde então, estão na geladeira. No total, são mais de 70 negócios a serem analisados – dos mais simples aos mais complexos. Entre os que ainda estão sem qualquer avanço está a compra da operadora Nextel pela rival Claro, anunciada em março, e a parceria de distribuição feita entre as empresas de bebidas Ambev e Red Bull Brasil, revelada em maio. Em ambos os casos, os concorrentes entraram com reclamações no Cade contestando os negócios. “Essa demora é prejudicial, pois em fusões e aquisições, perder o timing é perder o negócio", diz Patricia Agra, advogada da área de defesa da concorrência do escritório L.O. Baptista Advogados.

Nesta segunda (2), o Cade voltou a funcionar a conta gotas. Duas aquisições consideradas simples foram aprovados pela autarquia – a compra realizada pelo banco Itaú de uma fatia da empresa de benefícios Ticket, controlada pelo grupo francês Edenred, e a aquisição pelo grupo português de energia Galp por um percentual da Belem Bioenergia Brasil, então propriedade da Petrobras.

Mas as operações mais complexas continuam atrasando. Pior: há outras deixando de ser fechadas durante a paralisação. EXAME ouviu diversos advogados e há casos de grandes transações, que ultrapassam os bilhões de reais, paradas à espera do Cade. “As empresas não querem se expor, fazer uma aquisição e ficar na mão do atraso do Cade. E tudo isso para aprovar o filho do presidente como embaixador”, diz uma profissional, que viu seus clientes diminuírem o ímpeto por fusões e aquisições.

A opinião é compartilhada pelo advogado Miguel Neto, do escritório Miguel Neto Advogados. “Essa demora tem causado transtorno e acredito que vai demorar para recuperarmos o atraso”, diz ele. "E mesmo se anunciar a compra, as empresas não poderão atuar de nenhuma maneira, nem com um 'clean team' até um parecer do Cade." O advogado também lembra que há cláusulas em contratos que afirmam que se a aprovação levar mais do que 90 dias, o fechamento da operação só pode ser fechada após outro processo de due diligence, o que encarece ainda mais a aquisição.

Corrida contra o relógio

O governo tenta se mexer. No último dia 26, Bolsonaro indicou quatro nomes para compor o Cade. Para o conselho, foram enviados os nomes de Luiz Augusto Azevedo de Almeida Hoffmann, advogado sócio do escritório Almeida Prado e Hoffmann, Luis Henrique Bertolino Braido, economista mestre pela FGV e doutor em economia pela Universidade de Chicago, Sérgio Costa Ravagnani, advogado e subchefe adjunto de Política Econômica da Casa Civil. Para a procuradoria foi indicado o nome de Walter de Agra Júnior para ser reconduzido ao cargo, três dias depois de Bolsonaro ratificar o nome de Lenisa Prado para o posto para anular logo depois.

Graças a esse vai ou não vai, até agora, os nomes não chegaram para o senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Os candidatos precisarão ser sabatinados e aprovados pelos membros dessa comissão. “Assim que os nomes chegarem para ser lidos na Comissão, faremos os trâmites da maneira mais rápida possível”, diz Aziz.

Uma questão que permanece entre os participantes do mercado é quanto o Cade estará blindado e manterá a independência após os acordos admitidos pelo próprio presidente. Congressistas apontam que dois nomes são ligados ao presidente do Senado, David Alcolumbre (DEM-AP). Além disso, parlamentares acreditam que as negociações pela aprovação de Eduardo Bolsonaro como embaixador não pararão pelo Cade.

“O governo gastará o dobro em emendas pela aprovação do filho como embaixador em comparação com a reforma da Previdência”, aposta um deputado federal. Um levantamento realizado pela consultoria CNT/MDA aponta que 72,7% dos brasileiros acreditam que a indicação é inadequada. Caso continue envolvendo dinheiro e cargos, essa conta deve subir ainda mais.

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