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Procuradora pediu para adiar operação contra Serra, diz força-tarefa

Membros da Lava-Jato de São Paulo mandaram uma carta ao Conselho Superior do Ministério Público Federal relatando o episódio

Senador José Serra e sua filha Verônica Serra são investigados pela Lava-Jato (Robson Fernandes/Estadão Conteúdo)

Senador José Serra e sua filha Verônica Serra são investigados pela Lava-Jato (Robson Fernandes/Estadão Conteúdo)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 3 de setembro de 2020 às 17h33.

Última atualização em 3 de setembro de 2020 às 19h18.

Integrantes da força-tarefa da Lava-Jato em São Paulo informaram o Conselho Superior do Ministério Público Federal que a procuradora natural da operação, Viviane Martinez, teria solicitado o adiamento de uma operação que atingiria a cúpula do governo tucano em São Paulo, especificamente o senador José Serra (PSDB), que governou o estado entre 2007 e 2010.

Serra é investigado pela Lava-Jato por lavagem de propinas pagas pela Odebrecht nas obras do Rodoanel Sul. O tucano e sua filha, Verônica, foram denunciados em julho pela força-tarefa, mas a ação penal foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal.

Os procuradores da Lava-Jato SP pediram o desligamento da operação nesta quarta, 2, por divergências internas com Viviane Martinez, que lhes pareceu "muito aquém do que se esperaria de um procurador natural". O ofício com a renúncia coletiva foi enviado ao procurador-geral da República, Augusto Aras.

Em outra carta, endereçada ao Conselho Superior do MPF, os integrantes da força-tarefa expõem diversas divergências com a condução de Viviane Martinez, que assumiu em março o comando do 5º Ofício da Procuradoria da República em São Paulo.

Segundo a força-tarefa, as investigações que miravam Serra estavam sendo conduzidas ao longo do primeiro semestre de 2020, quando a Lava-Jato bandeirante se debruçou sobre "complexo esquema de lavagem de ativos" envolvendo o senador e "ilicitudes praticadas nas obras do Rodoanel Sul".

"Cumprindo seu papel, esta força-tarefa organizou, nesse plano, numerosos pleitos investigatórios sujeitos a reserva de jurisdição (entre quebras de sigilos bancário, fiscal e telemático e buscas e apreensões), e as minutas respectivas foram sendo trocadas, seguindo prática comum a casos sensíveis, em um grupo de troca de mensagens, para que todos pudessem ler o que fosse produzido e, querendo, pudessem opinar a respeito, sugerir modificações e etc.", relata a Lava-Jato SP.

Foi nesse contexto que, em 11 de junho, sete peças com pleitos investigatórios foram concluídas para assinatura dos integrantes da força-tarefa. Os documentos seriam remetidos à Justiça Federal para autorização de possível operação "fartamente embasada em provas". As diligências, segundo os procuradores, atingia "agentes da cúpula do então governo do estado de São Paulo, e apuraria crimes praticados entre 2006 e, pelo menos, 2014".

"Surpreendentemente, contudo, apesar de não ter feito qualquer objeção na época das trocas de minutas, a procuradora Viviane enviou um e-mail, em 12/6/2020, aos demais integrantes da força-tarefa, pedindo que as peças fossem recolhidas do [Sistema] Único, e que a operação planejada fosse adiada", apontam os procuradores.

Segundo a força-tarefa bandeirante, a procuradora não apresentou "qualquer razão jurídica para fundamentar o que pedia", argumentando somente que o Conselho Superior do Ministério Público Federal poderia aprovar, em agosto, a criação da Unidade Nacional Anticorrupção (Unac), estrutura que centralizaria as forças-tarefa em Brasília. Se isso ocorresse, a procuradora afirmou que os autos poderiam ser remetidos para a capital federal.

"Em outras palavras, a procuradora Viviane considerou razoável postergar por quase dois meses o protocolo de pedidos investigatórios pertinentes a uma operação de relevo [a maior até então planejada pela força-tarefa Lava-Jato de São Paulo] apenas na expectativa [de duvidosa concretude, considerando os próprios termos do anteprojeto que trata da Unac] de uma decisão da cúpula da instituição fazer com que este caso deixasse de ser de sua atribuição", afirmam os procuradores.

A atitude da procuradora deixou a percepção à força-tarefa que ela "estava movida pelo intento central de reduzir drasticamente seu acervo, seja alegando que parte dele teria sido distribuída irregularmente, seja pedindo para que novas investigações não fossem conduzidas".

Baixas da Lava-Jato

A saída dos procuradores ocorre em meio a reveses da Lava-Jato bandeirante em investigações que miram o senador José Serra (PSDB). Na semana passada, o ministro Gilmar Mendes ampliou liminar concedida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, e suspendeu a ação penal que mira o tucano por suposta lavagem de propinas pagas pela Odebrecht.

A denúncia contra o tucano havia sido aceita em julho pelo Diego Paes Moreira, da 6ª Vara Criminal de São Paulo, 1 hora depois de Toffoli suspender "toda a investigação" contra Serra. Por "cautela", o magistrado decidiu suspender a ação penal até novo entendimento do STF sobre o caso — Gilmar ampliou a medida, aplicando o entendimento que a liminar deve alcançar as investigações em vigor e também a ação penal.

"Ao fim e ao cabo, a força-tarefa ainda tinha muito a produzir, em frentes de investigação de enorme importância, envolvendo, por exemplo, corrupção em grandes obras [como em diversas linhas do Metrô de SP e nos trechos Sul e Norte do Rodoanel], setores do sistema financeiro e milionários esquemas de lavagem de dinheiro, tanto no Brasil quanto no exterior", apontam os procuradores.

Deixam a Lava-Jato de São Paulo:

• Guilherme Rocha Göpfert: a partir de 8/9/2020

• Thiago Lacerda Nobre: a partir de 8/9/2020

• Paloma Alves Ramos: a partir de 11/9/2020

• Janice Agostinho Barreto Ascari: a partir de 30/9/2020

• Marília Soares Ferreira Iftim: a partir de 30/9/2020

• Paulo Sérgio Ferreira Filho: a partir de 30/9/2020

• Yuri Corrêa da Luz: a partir de 30/9/2020

Defesa de Serra

Após a deflagração da Paralelo 23, em julho, o senador José Serra lamentou o que chamou de "espetacularização" da operação da PF e negou ter recebido caixa dois.

"É ilegal, abusiva e acintosa a atuação dos órgãos de investigação no presente caso, ao tratar de fatos antigos, para gerar investigações sigilosas e desconhecidas do senador e de sua defesa e nas quais ele nunca teve a oportunidade de ser ouvido", afirmaram os advogados Sepúlveda Pertence e Flávia Rahal, que defendem o tucano.

MPF

Procurado, o Conselho Superior do Ministério Público Federal ainda não se manifestou.

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