Problemas com planos de saúde afetam 96% dos usuários em SP, diz pesquisa
Associação classificou o crescimento como "salto estrondoso" e entendeu que as dificuldades com os planos são "universais"
Estadão Conteúdo
Publicado em 19 de julho de 2018 às 22h37.
Última atualização em 19 de julho de 2018 às 23h06.
Uma pesquisa do Instituto Datafolha feita a pedido da Associação Paulista de Medicina mostrou que 96% dos usuários de planos de saúde no Estado de São Paulo já enfrentaram algum problema na utilização dos serviços nos últimos dois anos - em 2012, o número era de 77%. A associação classificou o crescimento como "salto estrondoso" e entendeu que as dificuldades com os planos são "universais", levando o usuário a buscar serviços particulares ou o atendimento público.
A pesquisa teve entrevistas realizadas entre 25 de abril e 2 de maio e ouviu 836 pessoas de 18 anos ou mais usuárias de planos ou seguros de saúde no Estado . Hoje, 13,7 milhões de pessoas em São Paulo têm planos, 40% da população adulta que vive em cidades paulistas.
Consultas médicas e exames diagnósticos foram os serviços mais usados pela população. Segundo a associação, em todos eles o índice de problemas aumentou de seis anos para cá, em especial no pronto-atendimento (pronto-socorros). "Nas consultas médicas, as dificuldades passaram de 64%, em 2012, para 76% agora. Para um paciente conseguir exames e diagnósticos, está virando milagre. As queixas aumentaram em quase 50%, pulando de 40% para 72% no período. No pronto-atendimento, oito em cada dez pacientes de planos de saúde que utilizaram serviços enfrentaram algum um tipo de problema."
A associação diz que por falta de opções e em razão das dificuldades para o atendimento nos planos de saúde, os usuários, "mesmo pagando altas mensalidades, vêm sendo empurrados para o SUS ou para o atendimento particular". Há seis anos, 15% engrossavam as estatísticas dos que se viam obrigados a buscar tratamento na rede pública. Hoje, são 19%. "Já aqueles que tiveram de recorrer a serviços particulares, por absoluta falta de opção do sistema suplementar, aumentaram em mais de 100%: eram 9% em 2012 e são 19% em 2018."
A instituição atribui o desconhecimento dos usuários quanto aos prazos máximos para atendimento a um não cumprimento adequado do papel de regulação por parte da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Por parte dos usuários, há ainda a percepção de que os planos estariam dificultando a realização de procedimentos de custo elevado, colocando restrições ao trabalho dos médicos, inclusive pressionando-os a antecipar altas (reduzir tempo de internação), postergando a autorização de exames e procedimentos, além de não estar cumprindo todas as regras do contrato.
A pesquisa foi divulgada na semana em que o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a resolução da ANS que previa a cobrança de até 40% de clientes em planos de saúde em coparticipação ou franquia.
O que pensam os médicos
Em uma segunda pesquisa, a associação procurou a opinião dos médicos sobre os planos e a assistência pública. Foram ouvidos 615 profissionais entre 12 de junho e 2 de julho. Noventa porcento dos médicos declararam que há interferência das empresas da área suplementar no exercício da medicina. "Seis em cada dez apontam restrições quanto à solicitação de exames para o diagnóstico e alternativas de tratamento. Ficam evidentes também entraves para a prescrição de medicamentos de alto custo, tempo de internação e de pós-operatório, entre outros."
Sobre o Sistema Único de Saúde, dois entre cada dez declaram conseguir internar um paciente com facilidade. Quanto ao tempo para internação, queixas foram relatadas por 9 entre cada dez. "Oitenta e cinco por cento dos médicos que atendem SUS não vêm facilidade para obter uma sala de cirurgia. Dificuldade excessiva é relatada por 91%. Também são 9 em cada 10 profissionais os que apontam que o SUS não possui equipamentos adequados para exames e diagnósticos."
O que dizem os planos e o Ministério da Saúde
Em nota, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), entidade representativa da saúde suplementar, disse que "por repetidas vezes pesquisas de opinião realizadas por órgãos competentes, como o próprio Datafolha, o Ibope ou ainda o IBGE, apontam que os serviços prestados pelas operadoras de planos de saúde são sempre bem avaliados, com média entre 70% e 80% de satisfação".
A associação disse estranhar a ausência da pergunta sobre o grau de satisfação na pesquisa realizada neste ano, como ocorreu em anos anteriores. "A Abramge se mantém à disposição para manter um diálogo aberto e conclama as entidades e categorias profissionais a buscar, em conjunto com as operadoras e as autoridades, soluções para os desafios do setor", declarou.
A Abramge acrescentou que "não é regra o descredenciamento de médicos que pedem mais exames, mas é oportuno lembrar que no Brasil há sim um excesso de solicitações de exames, prova disso que o país é o campeão mundial de realização de ressonância magnética, um triste exemplo de desperdício, pois, com toda a certeza, muitos desses exames são completamente desnecessários."
A reportagem também contatou o Ministério da Saúde para respostas sobre as reclamações contra o SUS. A pasta não se referiu diretamente ao conteúdo da pesquisa, mas ressaltou que o "Brasil conta com um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo, que garante acesso, exclusivamente pelo SUS, a mais de 160 milhões de brasileiros".
"É importante frisar que a gestão do SUS, conforme estabelece a Constituição Federal, é compartilhada entre a União, estados e municípios. Estes últimos responsáveis pela execução dos serviços, por complementar o financiamento e pela organização da rede de assistência", acrescentou o ministério.
A reportagem fez questionamentos para a ANS, mas não obteve respostas até o horário de publicação desta matéria.