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Ponte de Lula sugere o alcance global da corrupção no Brasil

A Ponte Orinoquia, na Venezuela, é um monumento de US$ 1,2 bilhão financiado pelo Brasil que quase não é usado

A Ponte Orinoquia, na Venezuela: hoje, poucas pessoas usam a ponte, que parece ligar o nada a lugar nenhum (Meridith Kohut/Bloomberg)

A Ponte Orinoquia, na Venezuela: hoje, poucas pessoas usam a ponte, que parece ligar o nada a lugar nenhum (Meridith Kohut/Bloomberg)

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Da Redação

Publicado em 18 de agosto de 2015 às 23h01.

Na exuberante savana ao norte da América do Sul repousa um monumento de US$ 1,2 bilhão aos crescentes problemas do Brasil.

Cruzando o poderoso Rio Orinoco, na Venezuela, a Ponte Orinoquia é uma recordação enferrujada de uma época não muito distante em que um Brasil próspero destinava recursos volumosos para projetos ambiciosos pelo continente e fora dele.

Hoje, poucas pessoas usam a ponte, que parece ligar o nada a lugar nenhum.

A placa que marca sua inauguração, em 2006, desapareceu, e uma área próxima para piqueniques está coberta de mato.

“Todo dia é um dia melhor”, proclama um cartaz do governo, com um otimismo que poucos brasileiros compartilham nessa época de ansiedade econômica e política.

Em um momento no qual meio milhão de brasileiros vão às ruas para protestar contra o escândalo de corrupção que está sacudindo o país, cada vez se pergunta mais se a corrupção brasileira pode ter se espalhado pelo mundo.

Projetos remotos construídos pela Odebrecht SA, um conglomerado brasileiro envolvido nas investigações, alguns financiados pelo BNDES, o poderoso banco estatal de desenvolvimento do Brasil, estão sendo examinados com uma crescente urgência em investigações paralelas.

“Esses assuntos internacionais estão nas fases iniciais de investigação. Ainda há muito material a ser analisado”, disse Deltan Dallagnol, um dos procuradores líderes do histórico caso criminal envolvendo a Petrobras, a companhia petrolífera controlada pelo Estado.

Obra inacabada

Enquanto investigadores da Lava Jato se debruçam sobre a Petrobras no Brasil, outros em Brasília estão lentamente voltando sua atenção a contratos lucrativos concedidos a outras empresas para obras em lugares como Cuba, Equador e outros tão distantes quanto Moçambique e Angola.

Quando a Polícia Federal começar a investigar, encontrará uma série de obras inacabadas com orçamentos inflados -- aproximadamente US$ 25 bilhões para a Odebrecht só na Venezuela.

A PF também verá que dos US$ 12 bilhões em financiamento à exportação do BNDES, entre 2007 e maio deste ano, US$ 8 bilhões -- ou 420 dos 539 contratos -- foram para a Odebrecht.

O elemento internacional ameaça ampliar a lista de líderes políticos citados e envolver ainda mais o ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva no escândalo, que levou boa parte dos negócios no Brasil para uma quase paralisia.

Conhecido no mundo todo como Lula, ele escolheu a dedo sua sucessora, a presidente Dilma Rousseff, que agora está enfrentando pedidos de impeachment.

Agora, aos 69, Lula está sendo investigado por suposto tráfico de influência em favor da Odebrecht depois de deixar o cargo.

Marcelo Odebrecht, a terceira geração de presidentes da empresa familiar, está sob prisão preventiva porque teria supervisionado outro esquema de corrupção, envolvendo a Petrobras.

A investigação atualmente em curso em Brasília se refere à ajuda que ele teria dado à Odebrecht para garantir contratos internacionais financiados pelo BNDES após seus dois mandatos como presidente, entre eles linhas de metrô de Caracas.

Ainda não se sabe como isso se conecta a outros líderes latino-americanos, ao período de Lula no governo ou com qualquer função mantida no Partido dos Trabalhadores (PT), a legenda de esquerda que ele fundou.

A Transparência Internacional anunciou que vai investigar os contratos das construtoras brasileiras em sete países incluindo a Venezuela, onde quatro empreiteiras venceram mais de 30 contratos com o governo nos últimos anos.

A organização que combate corrupção quer saber se as empresas repetiam em outros países o esquema de cartel e pagamento de propina reproduzido no Brasil.

‘Relação transparente’

A Odebrecht confirmou que arcou com as despesas da participação paga de Lula em eventos em países como Venezuela, Angola, Cuba, Portugal, Peru e Panamá, mas disse que não há nada condenável nesse tipo de atividade, realizada por muitos ex-líderes políticos, incluindo presidentes dos EUA.

Lula chegou a recebeu R$ 300.000 (até US$ 180.000 à época) por palestras, revelou o chefe do Instituto Lula em uma entrevista à Folha, um jornal brasileiro.

Lula, por meio de seu instituto, disse que não fez nada errado ao promover empresas brasileiras no exterior.

Outros três países latino-americanos estão investigando a Odebrecht.

A Venezuela, onde a empresa diz ter vencido 21 contratos desde 1992, não é um deles.

O ministério da Informação da Venezuela e o gabinete do presidente Nicolás Maduro não responderam aos pedidos de comentário.

Em resposta a perguntas por e-mail, a Odebrecht disse que “no caso da Venezuela, a relação com o governo é transparente”.

A empresa acrescentou que apenas três de seus contratos com a Venezuela foram financiados pelo BNDES.

“A maioria dos projetos e a maior parte do valor foram financiados com recursos próprios da Venezuela”.

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