Polícia que tem sanção para matar é a mais corrupta, diz ex-ministro
Especialistas debatem quais são os principais desafios de segurança pública enfrentados pelo Brasil, no EXAME Fórum nesta segunda-feira
Naiara Albuquerque
Publicado em 9 de setembro de 2019 às 11h39.
Última atualização em 9 de setembro de 2019 às 18h43.
São Paulo - “Polícia que tem sanção para matar é a mais corrupta das polícias”, afirma Raul Jungmann , ex-ministro da Defesa e da Segurança Pública do governo Temer, durante o evento EXAME Fórum , que acontece nesta segunda-feira, (09).
Para o ex-ministro, é necessário que haja uma reformulação profunda na política de Estado adotada para frear as taxas de violência e criminalidade no Brasil.
"Você conhece algum político que se elegeu com base em reforma do sistema prisional? Eu não conheço", enfatiza.
Para Jungmann, a questão de segurança pública ainda é tratada com políticas públicas passageiras, centrada em figuras políticas isoladas e não pensadas ao longo prazo. “Em nenhum momento as últimas Constituições colocaram a responsabilidade que o governo central tem em relação a segurança pública. Nunca tivemos uma política nacional de segurança”, critica.
Jungmann chama a atenção para a necessidade de se pensar em um programa, focado em jovens de 18 a 29 anos, voltado para áreas como cultura e educação para mudar a realidade, desde cedo, de jovens que conhecem precocemente a criminalidade "Prendemos muito e mal, precisamos estancar esse fluxo de criminalidade dessa faixa etária".
Para palestrantes que participaram do evento, é consenso que a questão da segurança pública, no Brasil, é extensa e complexa, sem uma saída óbvia para ser erradicada.
Cor e endereço certo
Thiago Amparo, professor de direitos humanos e anti-discriminação na faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, afirma que os homicídios que acontecem no Brasil “têm cor e endereço certo”, em referência aos jovens negros que são, em sua visão, os mais afetados pela política estatal de segurança pública.
“A segurança pública é colocada como sinônimo de polícia e especialmente de polícia ostensiva”, diz Amparo. Para especialista da FGV, os mapas de incidência mostram que há relação forte entre criminalidade e fatores sociais como a evasão escolar e até mesmo a gravidez precoce.
Ele diz que não há soluções fáceis mas podemos aprender com base em políticas que já deram certo no Brasil e em outras partes do mundo. “Nos EUA, os policiais utilizam câmeras no corpo e precisam explicar melhor quando ocorre alguma morte por parte da polícia”, diz.
“Não basta apenas lamentarmos as mortes, precisamos fazer polícias melhores e mais inteligentes”, pontua especialista. "A adoção de tais medidas que parecem não ter relação com a questão racial”, explica Amparo, “podem ajudar” nela.
O pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e conselheiro do Fórum Brasileiro de segurança pública, Daniel Cerqueira, analisa que nutrimos, ao longo dos anos, um sistema falho. “Acreditamos que com as mudanças na legislação algo se transformaria. Criamos um tipo de populismo penal”, pontua.
A boa notícia, explica Cerqueira, é que o Brasil já tem exemplos de políticas de segurança pública que funcionam, como o programa Pacto pela Vida, que foi lançado em 2007, em Pernambuco, pelo então governador Eduardo Campos.
Os números confirmam: nos meses iniciais de implementação do programa, Pernambuco viu uma queda de 32% nos índices de violência letal e a taxa de homicídios foi de 55,1 para cada 100 mil habitantes, em 2006, para 37,1 em 2014.
Veja nos vídeos a seguir as análises dos três especialistas sobre a segurança pública no Brasil.