Brasil

Odebrecht: promotores negam acordos e recorrem a outras empresas

Objetivo é tentar avançar nas investigações e evitar arquivamento de inquéritos por falta de provas

Promotores paulistas que se recusam a assinar os acordos de colaboração propostos pela Odebrecht em SP estão recorrendo a outras empresas implicadas na Lava Jato (Nacho Doce/Reuters)

Promotores paulistas que se recusam a assinar os acordos de colaboração propostos pela Odebrecht em SP estão recorrendo a outras empresas implicadas na Lava Jato (Nacho Doce/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 2 de julho de 2018 às 11h35.

São Paulo - Promotores paulistas que se recusam a assinar os acordos de colaboração propostos pela Odebrecht em São Paulo estão recorrendo a outras empresas implicadas na Lava Jato ou tentando um compartilhamento do material colhido pela força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF). O objetivo é tentar avançar nas investigações e evitar ser obrigados a arquivar seus inquéritos por falta de provas.

Ao menos oito casos decorrentes da delação da Odebrecht na Lava Jato estão com o grupo de quatro promotores do Patrimônio Público e Social que não concordam com os termos celebrados pelos colegas com a empreiteira baiana. Entre eles os inquéritos que investigam o ex-prefeito da capital Fernando Haddad (PT) e o ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) por improbidade administrativa nas denúncias de caixa 2 em campanhas eleitorais. Ambos negam irregularidades.

Pela Odebrecht, os acordos têm sido negociados pelo escritório do advogado Marco Vinicio Petrelluzzi, ex-procurador de Justiça e secretário de Segurança Pública de São Paulo entre 1999 e 2002, nos governos do PSDB. Os defensores da empreiteira têm procurado os promotores para negociar um termo de autocomposição (espécie de acordo de leniência) para cada inquérito - no caso do MPF, foi um único acordo global envolvendo todos os crimes e o pagamento de R$ 3,8 bilhões de ressarcimento e multa.

As premissas básicas das propostas são não processar a empresa pelo crime delatado, cobrar a devolução do valor desviado em 22 parcelas anuais, como fez o MPF, e permitir que a Odebrecht continue participando de licitação de obras públicas. Diante de resposta negativa, advogados avisam que não vão colaborar com a investigação como têm feito com os promotores que assinaram os termos com a empreiteira.

Sem os depoimentos formais dos ex-executivos da Odebrecht, os promotores precisam buscar outros meios para tentar encontrar provas suficientes para condenar agentes públicos e empresas envolvidas em fatos ilícitos. O compartilhamento de provas obtidas pela Lava Jato só é autorizado a quem aderir ao acordo de leniência de 2016.

Camargo Corrêa

O promotor Marcelo Milani, por exemplo, que já tinha uma ação civil pública contra a Odebrecht e outras 13 empresas por formação de cartel e fraude nos contratos da Linha 5-Lilás do Metrô de São Paulo, firmou um acordo de delação premiada com dois executivos da empreiteira Camargo Corrêa. Eles relataram pagamento de R$ 2,5 milhões de propina ao ex-diretor da estatal Sérgio Brasil.

Em fevereiro deste ano, a Justiça homologou o acordo de delação premiada no qual a Camargo Corrêa aceitou devolver cerca de R$ 48 milhões aos cofres públicos e condenou as demais empresas do cartel, entre as quais a Odebrecht, a pagar R$ 326,9 milhões de ressarcimento. As empresas ficaram proibidas de contratarem com o poder público. A Odebrecht já recorreu da sentença.

"Não dependo do acordo com a Odebrecht, tanto é que fiz um acordo com uma outra empresa que veio aqui, reconheceu a fraude, apontou os agentes públicos e trouxe provas documentais do pagamento da vantagem indevida por meio de um contrato fictício com uma empresa de consultoria", afirmou Milani.

Os promotores admitem, porém, que a estratégia pode funcionar nos casos em que houve conluio com outras empreiteiras, mas não naqueles em que a empresa corrompeu sozinha o agente público. É o caso do relato de pagamento de R$ 3 milhões de propina para influenciar um julgamento do Tribunal de Impostos e Taxas, da Secretaria da Fazenda de São Paulo.

"Cada órgão que foi lesado por ato de corrupção tem autonomia para negociar seu próprio acordo de leniência. É bom saber que há mobilização das autoridades de São Paulo para tentar recuperar os danos ao erário mediante o instrumento de Justiça negociada, que deve ser sempre pautada pelo interesse público", disse o advogado Valdir Simão, ex-ministro da Controladoria-Geral da União (CGU).

"Cooperação"

Em nota, a Odebrecht defendeu os acordos firmados na Promotoria do Patrimônio Público de São Paulo. "O acordo é instrumento de cooperação com as autoridades e possibilita o ressarcimento do dano, integrando-se ao acordo de leniência já assinado em dezembro de 2016", disse a empreiteira.

Negociações necessárias

Responsável por negociar os acordos com a Odebrecht no Ministério Público paulista, o promotor Silvio Marques defendeu as negociações com a empreiteira dizendo que elas são necessárias para recuperar o dinheiro desviado e reunir provas para responsabilizar os agentes públicos envolvidos.

Para Marques, os cinco acordos fechados até agora foram feitos de forma transparente. Segundo ele, caso a Justiça não homologue os termos pactuados, a ação de improbidade movida contra a empresa segue normalmente.

"Os acordos se baseiam na Lei 13.140/2015 e na Resolução 179/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público. Todos estão sendo elaborados de forma transparente entre o Ministério Público e a Administração Pública com as empresas. A recuperação do prejuízo sofrido pelo erário e as provas estão sendo garantidas", afirmou.

Ele sustenta que, embora as ações tenham sido ajuizadas, os inquéritos continuam abertos para que a Promotoria, com a colaboração da empresa, possa obter provas além das delações. Quanto ao parcelamento em 22 anos do dinheiro que será devolvido, ele afirma que o prazo "segue o mesmo critério da Lava Jato".

Sobre a possibilidade de a Odebrecht retomar a obra do túnel Roberto Marinho mesmo após a admissão de cartel, Marques afirmou que "a cláusula foi acordada entre a Prefeitura e o MP" e que a administração municipal disse "que não tem perspectiva de realizar a obra".

Em nota, a gestão Bruno Covas (PSDB) afirmou que "não há no Termo de Ajustamento de Conduta nenhuma cláusula que obrigue a realização da obra (túnel), muito menos que a mesma seja conduzida pela empresa (Odebrecht)". "A construção depende da captação de recursos", disse a Prefeitura, destacando que "qualquer decisão sobre sua execução" será tomada em momento oportuno.

Gilberto Kassab, Elton Santa Fé Zacarias e Paulo Vieira de Souza negaram ter praticado os atos ilícitos delatados pela Odebrecht. As defesas de Sérgio Brasil, Orlando Filho e Francisco Chagas não responderam aos contatos da reportagem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Acompanhe tudo sobre:Camargo CorrêaMinistério PúblicoNovonor (ex-Odebrecht)Operação Lava Jato

Mais de Brasil

Acidente com ônibus escolar deixa 23 mortos em Alagoas

Dino determina que Prefeitura de SP cobre serviço funerário com valores de antes da privatização

Incêndio atinge trem da Linha 9-Esmeralda neste domingo; veja vídeo

Ações isoladas ganham gravidade em contexto de plano de golpe, afirma professor da USP