Conforme Tarcísio, o "grande vilão" da crise foi a quantidade de árvores, que, por falta de manejo adequado, caíram na rede aérea (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Redação Exame
Publicado em 7 de novembro de 2023 às 10h17.
Última atualização em 7 de novembro de 2023 às 11h00.
Nesta terça-feira, 7, completou quatro dias desde o apagão que afetou 2,1 milhões de moradores de 24 municípios da região metropolitana de São Paulo abastecidos pela distribuidora Enel. A falta de energia ocorreu após o temporal de sexta-feira, 3, e está sendo restabelecida aos poucos, mas nesta segunda, 6, ao menos 500 mil pessoas ainda estavam sem luz, segundo informou a Enel.
Ao menos 200 mil endereços ainda permanecem sem energia elétrica em 24 municípios da região metropolitana de São Paulo, incluindo a capital paulista, atendidos pela Enel Distribuição São Paulo. O balanço foi divulgado pela concessionária na manhã de terça-feira, 7, quatro dias após as fortes chuvas e ventania que atingiram a região. Cerca de 90% dos imóveis tiveram o serviço restabelecido.
Alguns pontos seguem com as atividades prejudicadas, a exemplo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), que anunciou a suspensão, nesta terça-feira, das atividades acadêmicas regulares, assim como eventos presenciais no câmpus de Perdizes, zona oeste.
"A Enel colocou quase 3 mil profissionais nas ruas que seguem trabalhando 24 horas por dia para agilizar os atendimentos e normalizar o fornecimento para quase a totalidade dos clientes até esta terça-feira, conforme anunciado em reunião com o prefeito de São Paulo", disse a companhia. A previsão é que o serviço seja totalmente restabelecido até a noite desta terça-feira.
As fortes chuvas e rajadas de vento que atingiram grande parte do Estado de São Paulo na sexta-feira (3) também deixaram ao menos sete mortos. Em Osasco, na Grande São Paulo, duas árvores caíram sobre um muro na Avenida Luiz Rink, atingindo um veículo e matando uma pessoa que estava no interior do automóvel, de acordo com a Defesa Civil.
Na capital paulista, funcionários da limpeza, agentes das subprefeituras e equipes de iluminação pública e de reparos em semáforos continuam nas ruas para restabelecer a normalidade na capital paulista.
Mais de 72 horas depois do temporal que causou apagão em São Paulo, ao menos 315 mil imóveis seguiam sem luz nesta segunda-feira, 6 - com previsão de restabelecimento apenas nesta terça, 7. Após uma reunião de cerca de três horas no Palácio dos Bandeirantes, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou que as concessionárias vão estudar opções para ressarcimento de moradores e de melhoria nos canais de atendimento à população. Além disso, será montado um grupo de trabalho no âmbito da Aneel (agência federal) para acompanhar as ações e adequar os serviços a eventos extremos.
Mais cedo, o governador paulista havia acenado com "um TAC (termo de ajustamento de conduta) para que a gente possa facilitar a vida desse cidadão (prejudicado pelo apagão), porque não seria razoável que esse cidadão entre num caminho ordinário de atendimento e acabe não tendo resposta", disse. À noite, não detalhou o que pode ser feito. "Não adianta pensar no que passou", disse. Segundo ele, eventos extremos serão cada vez mais recorrentes, "estão aí e vieram para ficar". E salientou a importância de se criar planos de contingência para evitar novas crises.
Conforme Tarcísio, o "grande vilão" da crise foi a quantidade de árvores, que, por falta de manejo adequado, caíram na rede aérea. "Um plano de manejo arbóreo é uma das soluções mais baratas e efetivas para lidar com o problema", disse. Um projeto será enviado para Assembleia Legislativa para lidar com a questão, adiantou. Antes, ele evitou culpar a Enel, concessionária responsável pelo fornecimento de energia na capital paulista, pela falta de luz em diversos bairros.
Mas propôs alterações no modelo de contrato firmado entre empresas do setor e a União, ente detentor do poder concedente e que firma tais acordos. "Foi um fato extraordinário. Agora, eu acho que algumas medidas deixaram de ser tomadas ao longo do tempo. O contrato eventualmente não tem as servidões que deveria ter. A gente precisa olhar para trás para ver como estabelecer a normalidade o mais rápido possível e olhar para frente para garantir que isso não aconteça novamente", afirmou, após participar de um painel do BTG Pactual Macro Day com governadores.
Na conta da distribuidora ficou, porém, o problema de comunicação. Segundo o governador, o contato com a empresa precisa ser mais "azeitado". Tarcísio afirmou que durante encontro com as distribuidoras esse foi um ponto de discussão. O dirigente afirmou que há esforço por parte das concessionárias de investir em redes de comunicação e torná-las mais inteligentes.
Ele ainda evitou durante o dia qualquer ligação do problema com a privatização da Sabesp. Conforme o governador, o contrato estudado para a privatização da Sabesp tem um modelo "absolutamente diferente" daquele adotado no setor elétrico. "Não é um contrato aberto, não é um contrato frouxo. É um contrato muito descritivo em termos de servidões", disse.
O Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional do Consumidor, informou que vai notificar a concessionária de energia elétrica em São Paulo, a Enel, para explicar a interrupção no fornecimento de luz. O Ministério Público de São Paulo também abrirá uma apuração.
Entre os moradores que enfrentam transtornos estão pacientes que dependem de aparelhos ligados à rede de energia elétrica para continuar o tratamento médico. Um dos pacientes é Pedro Ducati Lima, de 12 anos, que mora na Vila Invernada, zona leste paulistana. Por causa da atrofia muscular espinhal (AME) tipo 1, sua casa tem uma UTI domiciliar. Ele não respira, não engole e não se mexe sozinho, mas as funções cognitivas estão preservadas.
Por isso, o menino precisa de ventilação mecânica para respiração, do aspirador de secreção pulmonar e de uma bomba de infusão para se alimentar, além de um colchão pneumático para evitar escaras. Também faz parte do cuidado permanente um aparelho para fisioterapia respiratória. "Quando perdemos a energia elétrica, nós perdemos tudo isso", diz a mãe, Cristiane Graziela Ducati, de 49 anos.
A saída foi deslocar o paciente para a casa da avó, no bairro da Vila Diva, também na zona leste, ou simplesmente levar os aparelhos para serem recarregados lá emergencialmente. Outra preocupação era recarregar os aparelhos celulares para continuar em contato com a Enel. "Além de todo esse transtorno, nós tivemos o desgaste emocional. Ficamos muito preocupados. E se faltar energia na casa da minha mãe?"
Outro paciente com tratamento comprometido é William Ferreira de Oliveira, de 29 anos. O rapaz vive com mucopolissacaridose (MPS III-A), doença rara genética causada pela falta de um tipo de enzima e que leva à regressão neurológica. Recentemente, ele ficou dois meses na UTI.
William utiliza BiPAB, aparelho eletrônico que funciona como um respirador artificial. O drama foi relatado pela mãe Patrícia Ferreira nas redes sociais, durante o final de semana. O abastecimento de energia em sua região, no Jardim Santa Margarida, zona sul de São Paulo, já foi normalizado. "Minha luta começou na sexta-feira à tarde. Passei à luz de velas. Foram 36 horas sem luz ligando para a Enel e tentando um nobreak (equipamentos de proteção à rede). Mas na hora que você mais necessita ninguém ajuda. É muito difícil ter um filho acamado. Sou cuidadora. Tudo tem de ser com muita luta", lamenta Patrícia.
O diretor-geral da Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Sandoval de Feitosa, explicou ontem que as distribuidoras de energia possuem isenção de responsabilidade em caso de eventos críticos, como as fortes chuvas na grande São Paulo na sexta-feira, 3.
Sandoval se reuniu com representantes das distribuidores de energia, entre elas, a Enel, com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e com o prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB), para tratar da crise. Centenas de milhares de consumidores na região metropolitana de São Paulo ainda estão sem luz.
O diretor-presidente da Enel em São Paulo, Max Xavier, rebateu as críticas relacionadas à demissão de funcionários, apontada como um dos possíveis agravadores do problema. Segundo ele, o atual efetivo da empresa é o suficiente para atender objetivos técnicos e comerciais.
Xavier pontuou ainda que a empresa investiu, nos últimos 5 anos, R$ 6,7 bilhões na concessão, e com esses recursos, os indicadores da companhia apontam para melhorias.
Durante coletiva nesta tarde, as árvores foram apontadas como "grandes vilãs" da crise que começou na sexta-feira.
Sobre o apagão deste feriado, Sandoval afirmou ser necessário o engajamento e coordenação dos Estados e municípios. O diretor da Aneel chegou a citar como exemplo de engajamento o "plano verão" de São Paulo, no qual a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), e as distribuidoras se preparam para lidar com eventos climáticos previstos.
Após especialistas apontarem o aterramento da rede elétrica como uma proposta de solução, Sandoval lembrou que a medida tem um custo elevado, podendo ser entre oito a nove vezes mais caros que o cabeamento aéreo, e a sua implementação precisa ser analisada de caso a caso.