Rodoanel: obras foram entregues em 2010, nos governos José Serra e Alberto Goldman, ambos do PSDB, ao custo de R$ 7 bilhões (Mário Rodrigues/Veja SP)
Da Redação
Publicado em 23 de maio de 2016 às 21h33.
Última atualização em 22 de fevereiro de 2018 às 15h14.
São Paulo — O Ministério Público Estadual (MPE) investiga a denúncia de que a empresa Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa), do governo paulista, pagou indenizações a criminosos ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC) no programa de reassentamento das obras do Trecho Sul do Rodoanel e do prolongamento da Avenida Jacu-Pêssego, na Grande São Paulo.
Ambas foram entregues em 2010, nos governos José Serra e Alberto Goldman (PSDB), ao custo de R$ 7 bilhões.
Os promotores já identificaram pelo menos dez pessoas indenizadas pela Dersa na cidade de Mauá e na zona leste de São Paulo que têm passagens pela polícia por roubo, furto e tráfico de drogas.
A investigação teve origem nos depoimentos de uma ex-funcionária da Dersa chamada Mércia Ferreira Gomes, que trabalhava à época em um consórcio contratado para executar o programa de reassentamento. As indenizações custaram mais de R$ 100 milhões e beneficiaram cerca de 40 mil pessoas.
Segundo Mércia, no processo envolvendo o Rodoanel, "a bandidagem que domina a área começou a fazer ameaças e, para possibilitar que o pessoal da empresa contratada pela Dersa fizesse seus trabalhos, se deveria pagar algum valor para a criminalidade". Ainda de acordo ela, se o valor não fosse pago, funcionários sofreriam "represálias", como ficar trancado na sala do plantão social. "Diante de tanta solicitação nesse sentido, o dinheiro acabou", disse.
A ex-funcionária relatou que os pagamentos eram feitos em dinheiro e "a maioria dos bandidos recebia valores na Dersa e comparecia armada". Segundo Mércia, eles entravam, pegavam o dinheiro e muitos saíam sem assinar nenhum recibo. Os pagamentos ocorreram entre agosto e outubro de 2009 e eram indicados por uma pessoa chamada Hamilton Clemente Alves, que, segundo funcionários da Dersa, apresentava-se como assessor do ex-deputado estadual Adriano Diogo (PT), que nega o fato.
À época, Alves chegou a participar de audiência pública sobre o caso na Assembleia Legislativa como presidente do Movimento em Defesa das Famílias do Traçado Jacu-Pêssego. Entre 2013 e 2015, ele trabalhou por duas vezes como assessor parlamentar do ex-vereador Alessandro Guedes (PT) e foi exonerado em março deste ano do cargo de assessor na Subprefeitura de Cidade Tiradentes na gestão Fernando Haddad (PT).
De acordo com Mércia, as indenizações variavam de R$ 1,6 mil a R$ 250 mil e chegaram a ser pagas até três vezes a uma mesma pessoa que invadiu diferentes áreas que seriam desapropriadas para as obras. Segundo ela, os pagamentos foram autorizados pelo ex-diretor de Engenharia da Dersa Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, que também nega o fato. As informações foram prestadas ao MPE em abril de 2015 e ratificadas em recente depoimento prestado por ela, após fechar um acordo de delação premiada.
"Um dos indícios que temos é de que o dinheiro era encaminhado para pessoas ligadas ao crime organizado. As pessoas que trabalhavam e foram indicadas por Mércia, em depoimento, serão chamadas para prestar esclarecimentos", disse o promotor Cássio Conserino.
Ao ser ouvido em 2015, o ex-diretor do Departamento de Assentamento da Dersa Geraldo Casas Vilela disse que a empresa recebeu uma carta atribuída ao PCC na qual são feitas ameaças, caso as remoções das famílias prosseguissem. Segundo ele, "diversas foram as dificuldades encontradas nesses processos de pagamento, sobretudo porque as áreas geralmente eram dominadas por pessoas ligadas a atividades criminosas".
Desvios
Mércia é investigada por ter incluído ilegalmente 16 pessoas ligadas a ela no cadastro de reassentamento das obras e desviado R$ 813 mil de indenizações. Ao MPE, no dia 9 deste mês, ela disse que fez isso a mando de Vilela e de Paulo Preto, para pagar pessoas que moravam na favela e não tinham documentos para o cadastro. Ambos negam as acusações. Segundo Mércia, nenhum parente seu ficou com o dinheiro.
Na semana passada, os três e uma filha de Paulo Preto foram denunciados à Justiça por incluir ilegalmente o nome de seis pessoas ligadas ao diretor na lista de indenizados com apartamentos da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), no valor total de R$ 374 mil. Na lista de beneficiários estão três babás, duas empregadas e funcionário que trabalhava para a família dele, que nega irregularidades.