Maria de Fátima da Silva, mãe do dançarino Douglas Pereira: ela acredita que policiais militares tenham desfeito o local em que ele foi morto (Tânia Rego/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 24 de abril de 2014 às 15h43.
Rio - A auxiliar de enfermagem Maria de Fátima Silva, mãe do dançarino Douglas Pereira, vai denunciar o assassinato de seu filho à Anistia Internacional.
Ela acredita que policiais militares tenham desfeito o local em que ele foi morto.
"Meu filho foi assassinado com requinte de crueldade, foi torturado. Eu trabalho com cirurgia de tórax. Ele tinha toda característica de afogamento. Quando fui reconhecê-lo no IML, ele tinha espuma na boca. Nos lábios, a pele estava azul, a gente chama de cianose, provocada por edema agudo no pulmão. No caso, ele teve edema agudo por derramamento de sangue na cavidade torácica. Se fosse tiro transfixante, a bala estaria na parede. E não tinha bala nenhuma ali. Estranho, né?", disse, em entrevista à Rádio Estadão.
Maria de Fátima acredita que seu filho foi morto por desavença anterior, que tinha com PMs da UPP do Pavão-Pavãozinho. A auxiliar de enfermagem conta que o filho foi abordado de forma truculenta por um policial militar e reagiu.
"O policial prendeu o Douglas e apreendeu a moto, com a autoridade dele. Na verdade, tinha que levar o Douglas para delegacia, tinha que mandar a moto para um depósito do Detran. E não prender o menino. (O policial) viu que as pessoas estavam ligando e liberou ele, mas manteve a moto presa por três dias. Encheram o tanque de areia de praia e mandaram ele buscar depois. Essa moto desceu quase no braço de amigos deles, para não destruir todo o sistema", contou Maria de Fátima.
Ela disse ainda que três meses depois, a moto foi furtada na favela. Moradores disseram que um PM colocou a moto numa Fiorino e levou o veículo.
"Nós recebemos multa dessa moto, que estava rodando em Nova Iguaçu (Baixada Fluminense). Essa moto agora não vai existir mais. Certamente alguém já tocou fogo nela".
Ela fez uma crítica à política de pacificação de favelas do governo do estado.
"A UPP tem que mudar. Comunidade não pode ser afrontada, viver em baixo de pau. Se você investigar, a comunidade tem mais medo de policial do que do bandido", afirmou Maria de Fátima, que reiterou a intenção de processar o Estado pela morte do filho.
A entrevista de Maria de Fátima à Rádio Estadão foi acompanhada pela ouvidora das UPPs, Tatiana Lima. Ela disse que estava ali para dar esclarecimentos para a família de Douglas.
Pela internet
O pintor Paulo César Calazans Pereira, de 50 anos, disse que soube da morte do filho pela internet, na terça-feira, 22.
Um dos sete irmãos do dançarino navegava pela página do Facebook de Douglas quando a mensagem de um amigo que dizia "Saudades eternas" chamou sua atenção e ele disse ao pai que algo de grave tinha acontecido com o irmão.
"Estou passando mal desde que soube que meu filho morreu, assim, de repente. Nunca pensei que isso fosse acontecer com meu filho. Ele tinha um futuro pela frente".
Calazans mora no bairro Imbariê, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, mas estava em Cabo Frio, na Região dos Lagos, quando soube do assassinato do filho.
Calazans afirmou que os policiais "bateram, roubaram e deram tiro" em Douglas. "Tinham que ter socorrido. Deixaram ele como um cachorro (o corpo do dançarino foi encontrado no chão de uma creche). Até o dinheiro da pensão eles levaram".
Douglas deixou uma filha de quatro anos que morava com a mãe no morro Pavão-Pavãozinho.
Ele questionou a efetividade do projeto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). "Que segurança é essa que um trabalhador não pode sair de casa na hora que quer, não pode usar uma jóia, ter seu carro? Esses são os policiais que colocam para tomar conta da comunidade. Todos despreparados".
"Daqui a três semanas vocês (jornalistas) estarão entrevistando outras pessoas (vítimas de violência)", completou.
Com o andamento das investigações, o pai de Douglas espera que haja justiça. "Sonhar não custa nada, então estou sonhando com a justiça".