Brasil

Leis ainda não dão aos índios direito à posse de terras

Objetivo da Constituição atual não é mais civilizar o indígena, mas não lhe dá direito à posse de suas terras

EXAME.com (EXAME.com)

EXAME.com (EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 16 de outubro de 2012 às 09h05.

São Paulo - Ao longo de suas edições, a Constituição Brasileira mudou seus propósitos para os indígenas. Em 1988 fica claro que a intenção do Brasil não é mais civilizar os “selvagens”, como se desejava no final do século 19, início da República (1889), mas de protegê-lo e garantir seu espaço territorial.

Ainda assim, o que mostra pesquisa da Faculdade de Direito (FD) da USP é que os modos que o Estado utiliza para manter o indígena protegido é semelhante ao de épocas passadas: tornando-o usufrutuário das terras que ocupa e não lhes dando legitimamente o controle sobre elas.

As fontes principais para a pesquisa foram as leis, buscadas nas constituições brasileiras desde o início da República no Brasil. “É importante frisar que é um trabalho sobre a história do direito, mas minha análise não foi a partir da história, mas especificamente das leis. Outra pesquisa pode partir de um outro ângulo e chegar a outras conclusões, por exemplo”, diz Rodrigo Sérgio Meirelles Marchini.

O que ficou claro é que desde a época do Império existia essa intenção de integrar o índio à sociedade, de modo que ele deixasse de lado suas tradições, e isso está expresso em leis e decretos. “O modo de vida do índio não era respeitado. Podemos ver na Constituição de 1967, no artigo quinto “incorporação dos silvícolas à comunhão nacional”. Isso não era apenas um desejo, era um objetivo expresso na constituição”, diz ele.

Tratamento não mudou

Em 1973 é criado o Estatuto do Índio com o objetivo de priorizar ainda mais a proteção do índio dentro do plano de governo. Entretanto, ainda se planeja realizá-lo introduzindo-o à sociedade.


Havia uma forte pressão envolvendo os direitos de terra, já que empresários e agricultores alegavam ter o direito legal sobre elas. “Alguns apresentavam documentos de 1850 pra provar que eram donos das terras. Cada estado tomava uma providência diante disso, o que dificultava muito o controle por parte da União.”

A posição da União foi de declarar ser a proprietária de todas as terras, mas ter liberado a ocupação e utilização dos recursos naturais por parte dos índios. A explicação legal dada para a questão é a de que o indígena era incapaz de gerir as propriedades e, portanto, seria apenas um usufrutuário dela. O que se veiculava era que, a partir do momento que o índio se integrasse à sociedade, ele poderia ser dono de uma porção de terra, assim como qualquer outro cidadão brasileiro.

Marchini diz que o método deu certo pois a única opção para os indígenas terem proteção estatal era se passassem a trabalhar junto aos agricultores e grandes produtores, deixando de ficar isolados e sendo mais participativos socialmente. “Isso funcionava como um aviso “se você quer ter proteção e direitos, você vai ter que obedecer as nossas normas. Se você continuar isolado, não vai receber nenhum tipo de assistência”. Isso começou a influenciar a escolha do índio de se integrar mais”, diz ele.

Essa pretensão mudou ao longo do tempo. Na Constituição de 1988, o objetivo de civilizar o índio não está mais expresso. A cultura e o modo original de vida do indígena começaram a ser respeitados. Mas o que Marchini destaca é que ele ainda continua sendo tratado como um incapaz perante à lei, pois não é dono de suas terras, mas apenas um usufrutuário. A proprietária das terras continua sendo a União.

O autor da dissertação de mestrado reuniu os documentos que utilizou para seu trabalho em um blog. Ele diz que o intuito é facilitar o trabalho de outros pesquisadores que queiram estudar o tema, já que muitos documentos utilizados ainda não estavam disponíveis na internet, o que prolonga e dificulta o processo de pesquisa.

Acompanhe tudo sobre:IndígenasPolíticareformas

Mais de Brasil

Ministério Público vai apurar acidente de avião em Ubatuba

'Presidente quer fazer eventuais mudanças ainda este mês', diz Rui Costa sobre reforma ministerial

Prefeito de BH, Fuad Noman volta a ser entubado após apresentar instabilidade respiratória

Lula edita MP que prevê pagamento de R$ 60 mil a pessoas com deficiência causada pelo zika vírus