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Hospitais de campanha do Rio não têm mais data para abrir

TCE afirma que instituto contratado por R$ 836 milhões não tem qualidade técnica comprovada para montar e operar sete hospitais no Rio de Janeiro

Coronavírus: abertura de hospital de campanha em São Gonçalo é adiada pela quinta vez (Luis Alvarenga/Getty Images)

Coronavírus: abertura de hospital de campanha em São Gonçalo é adiada pela quinta vez (Luis Alvarenga/Getty Images)

AO

Agência O Globo

Publicado em 29 de maio de 2020 às 08h46.

Última atualização em 29 de maio de 2020 às 08h59.

O Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas) não tem qualidade técnica comprovada para montar e operar sete hospitais de campanha do governo estadual, num contrato emergencial originalmente orçado em R$ 836 milhões. A conclusão é do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que, na terça-feira, determinou a suspensão dos pagamentos à organização social. Ontem, o Iabas, que só entregou uma unidade, no Maracanã, informou que prestará esclarecimentos ao tribunal e alegou que, sem os repasses, poderá atrasar ainda mais as obras dos outros hospitais. O governo, por sua vez, afirmou que cumprirá a decisão.

Em sua análise sobre o contrato emergencial, que tem duração prevista de seis meses, o conselheiro Christiano Lacerda destacou que serviços complexos encomendados pelo estado estão “genericamente condensados em um item”. Ele chamou a atenção para alguns custos, como o de R$ 4,5 milhões mensais, para cada hospital, relativo à manutenção de tendas. Lacerda citou ainda os gastos de R $1 milhão em “assessoria e consultoria” e de R$ 611 mil em “limpeza predial e jardinagem”.

Diante da falta de detalhes sobre precificações, serviços e descrições técnicas das estruturas, o TCE deu 5 dias (contados a partir de ontem) para a Secretaria estadual de Saúde e o Iabas prestarem esclarecimentos, a fim de evitarem “a permanência da possível situação ilegal relatada no processo”. O governo já repassou R$ 256,5 milhões à OS, que já deu várias justificativas para os atrasos nas obras dos hospitais, incluindo funcionários impossibilitados de trabalhar por terem contraído a Covid-19, entraves burocráticos e até tiroteios nas proximidades de um dos canteiros, em São Gonçalo.

Os questionamentos são feitos após o ex-subsecretário de Saúde Gabriell Neves — preso desde o dia 7 sob a acusação de liberar pagamentos para contratos superfaturados — afirmar, em depoimento a promotores do estado, que seu antigo chefe estava ciente de todos os processos. Em entrevistas, Edmar Santos, que comandava a pasta, havia dito que não acompanhava a elaboração e o recebimento de propostas. O ex-secretário não foi localizado para dar entrevista.

Detalhamento é exigido

O contrato entre o governo e o Iabas foi orçado em R$ 836 milhões em abril. Estabelecia a abertura de 1.400 leitos em sete hospitais de campanha, número reduzido para 1.300. Assim, o valor caiu para R$ 770 milhões.

O Iabas, segundo o TCE, prevê custo mensal de R$ 19,8 milhões para cada unidade com 200 leitos. Do total, R$ 5,1 milhões são destinados a gastos com pessoal; R$ 2,1milhões para remédios e insumos, R$ 763 mil para “material de consumo” e R$ 11,8 milhões para serviços terceirizados. Este último item chamou a atenção do TCE: Christiano Lacerda pediu detalhamentos de todas as contas, incluindo as de educação continuada (R$ 255mil), serviços assistenciais médicos (R$ 595 mil), locação de equipamentos (R$ 68 mil) e fretamento logístico terrestre e aéreo (R$ 498 mil).

Abertura em São Gonçalo é adiada pela quinta vez

Prometida para 30 de abril e mudada para outras quatro datas, a abertura do hospital de campanha de São Gonçalo foi adiada pela quinta vez. A última estava programada para ontem, e a justificativa para seu cancelamento é a necessidade de troca de piso. Segundo o Iabas, o mais novo problema teve início com uma visita do deputado estadual Filippe Poubel (PSL). Seguranças do parlamentar teriam pisado em piche e sujado o chão, criando risco de contaminação.

Até a noite de ontem não havia sido divulgada uma nova data para a inauguração da unidade, uma das seis sob a responsabilidade do Iabas que estão atrasadas. Em nota, a organização social informou que já iniciou “a troca de parte do piso do hospital”. “Diante dessa adversidade, o Iabas precisou utilizar os pisos que iriam para a unidade de Nova Iguaçu, que será finalizada com material comprado ontem à noite (quarta-feira), disponível no mercado com valor próximo ao dobro do preço”, diz um outro trecho do comunicado.

Hospital de Campanha durante pandemia de coronavírus em São Gonçalo, Rio de Janeiro

Questionada sobre nova previsão para a inauguração, a OS evitou fazê-la: “Atualizaremos a imprensa tão logo tenhamos novas informações sobre São Gonçalo e Nova Iguaçu”.

Mesmo que os sapatos sujos de piche dos seguranças tenham atrapalhado a abertura do hospital de São Gonçalo, imagens registradas na noite de anteontem por um fotógrafo do GLOBO revelaram que ainha havia muito a ser feito. Operários trabalhavam apressadamente em vários pontos do entorno da unidade, inclusive abrindo um buraco para a instalação de uma tubulação de esgoto. Ao mesmo tempo, escavadeiras eram usadas numa rua de acesso completamente alagada.

Caxias e Nova Iguaçu seguem sem data de inauguração

A unidade de Duue de Caxias também não tem uma data de inauguração. Inicialmente, os dois hospitais seriam entregues até sábado. O GLOBO esteve ontem no local onde vai funcionar o hospital de Nova Iguaçu. Na área externa, havia uma retroescavadeira fazendo limpeza e três funcionários. Durante uma hora, não houve movimentação de pessoas nem de veículos. O deputado estadual Marcelo do Seu Dino (PSL) esteve na unidade de Caxias na última terça-feira e mostrou o quanto ainda falta para o local começar a receber pacientes:

— Dentro do hospital, não tinha ninguém. É um abandono, descaso. Nada andou. Tudo jogado, colchões cheios de poeira, uma bagunça total. Entrei com vários requerimentos de informação, pedindo todas as informações possíveis, e vou acionar o Ministério Público.

Atualmente, Caxias conta com 134 leitos de UTI exclusivos para a Covid-19: 128 do Hospital Municipal São José e seis do Hospital Municipal Dr. Moacyr Rodrigues do Carmo. Na UPA Beira Mar, há 32 leitos de enfermaria de retaguarda. Na rede estadual, são 39 leitos de UTI e 36 de enfermaria para Covid no Hospital Adão Pereira Nunes, o Hospital de Saracuruna. Já Nova Iguaçu possui 75 leitos, todos no Hospital da Posse. Desses, 40 são de CTI.

— Chama a nossa atenção o pouco caso que os governantes têm em relação à Baixada. Se já tivéssemos os hospitais de campanha funcionando, o número de óbitos pela Covid na região seria menor — lamentou Adriano de Araujo, coordenador executivo do Fórum Grita Baixada (FGB).

Além do FGB, 20 instituições da sociedade civil assinaram a carta manifesto “Hospital de Campanha Já”, solicitando a criação de um hospital de campanha em São João de Meriti.

Meriti solicitou hospital

Sobre a carta manifesto, a Prefeitura de São João de Meriti informou que o prefeito Dr. João Ferreira “já solicitou e vem solicitando constantemente aos governos federal e estadual a construção de um hospital de campanha na Vila Olímpica do município, localizada à beira da Rodovia Presidente Dutra. O local é amplo e tem infraestrutura para receber um projeto como esse”.

O governo disse ainda que o município, sozinho, não tem condição financeira para montar a unidade. No último dia 20, foi inaugurado no município o Hospital Municipal de São João de Meriti - Abdon Gonçalves, o primeiro da cidade, contando com 30 leitos de UTI. No loca, funcionava o PAM Meriti.

Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, há 37 leitos com monitores e respiradores e 17 leitos de enfermaria destinados aos pacientes da Covid-19. Além desses, o município conta com dois leitos da rede estadual, no Hospital da Mulher Heloneida Studart, sendo um de UTI.

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