Luís Roberto Barroso: . "Um tema tem que ser muito chinfrim para não chegar ao Supremo" (Divulgação)
Diretor de redação da Exame
Publicado em 13 de outubro de 2023 às 06h45.
Última atualização em 13 de outubro de 2023 às 10h23.
PARIS - Luís Roberto Barroso, que assumiu no fim de setembro a presidência do Supremo Tribunal Federal, falou do papel da corte e de uma agenda para o Brasil num evento em Paris nesta sexta-feira. O ministro foi convidado a falar para autoridades e empresários no evento Esfera Internacional, realizado na Place Vendôme, um dos endereços mais charmosos da capital francesa.
Barroso começou o evento reconhecendo o protagonismo do STF na vida pública brasileira. "O STF no Brasil tem um papel diferenciado em relação a outras supremas cortes", afirmou. "O Brasil tem uma Constituição abrangente, que não só organiza o estado, os poderes e os direitos fundamentais".
A Constituição brasileira, segundo ele, também cuida de temas como tributário, previdenciário, saúde, educação, sistema de proteção ambiental, educação, família, direitos fundamentais. "O constituinte trouxe para a Constituição questões que em outras partes do mundo ficam com a vontade discricionária da política".
Há, também, segundo Barroso, outras razões para o protagonismo do STF. "É fácil chegar ao Supremo com ações diretas. Entidades e órgãos que podem fazer questionamentos são muitas, como partidos políticos, confederações nacionais, mesas diretoras da Câmara e do Senado", afirmou. "Um tema tem que ser muito chinfrim para não chegar ao Supremo".
Além disso, afirmou Barroso, os ministros da Cortes trabalham "na frente dos holofotes" porque as sessões são televisionadas. "Há uma exposição pública do modelo institucional", disse. "Existe muita cobertura da imprensa e grande exposição pública, e por isso é preciso vir a público e explicar o papel da corte".
Barroso também usou o espaço no evento do Grupo Esfera para defender o papel do STF no apoio ao empreendedorismo, com decisões em prol da atividade empresarial. "O Brasil tem muita complexidade, mas temos a segurança jurídica como vetor", disse.
Entre as decisões, ele apontou a validação da reforma trabalhista, a supressão da contribuição sindical obrigatória, a validação da terceirização em atividades econômicas fim, além de ter derrubado as leis que proibiam o transporte individual por aplicativos.
Barroso afirmou que o Brasil tem áreas de insegurança jurídica, como o custo de relações trabalhista. "Temo uma imensa litigiosidade trabalhista, com mais de 5 milhões de processos em curso, às vezes porque empresários se comportam mal, mas às vezes porque a legislação é de tal complexidade que fica difícil cumpri-la", disse. O Brasil, elencou, também tem "litigiosidade trabalhista imensa", asim como insegurança jurídica na saúde, na litigiosidade a aceso a medicamentos, nos debates sobre a cobertura dos planos de saúde.
Por fim, o presidente do STF apresentou uma agenda para o Brasil que, segundo ele, é retirada da Constituição. Entrou em temas da vida pública e da agenda política e econômica de forma ampla e abrangente.
"A Constituição apresenta uma agenda para o Brasil. E pode unificar liberais, conservadores e progressistas", afirmou. "O Brasil precisa de um momento de pacificação e de civilidade. É o salto civilizatório que precisamos dar, e a Constituição pode ser uma boa bússola".
Barroso elencou, nesta agenda, a importância de combater a pobreza e a desigualdade; a retomada de um crescimento econômico sustentável; a prioridade para a educação básica; o investimento em ciência e tecnologia; e o apoio ao empreendedorismo.
"Precisamos superar o preconceito que ainda existe com a livre iniciativa e o empreendedorismo. A história mostrou que a iniciativa privada é a melhor geradora de riqueza que pode ser distribuída de maneira justa e adequada", disse. "O imaginário social brasileiro ainda associa o sucesso empresarial com favorecimentos. De fato tivemos problemas, mas há muita gente que inova, corre riscos. O estado tem que ser protagonista na rede de proteção social, na rede de proteção pública. Mas precisamos de regulamentação e incentivo à inovação".
Barroso fechou seu discurso falando da importância de o Brasil assumir uma liderança ambiental no mundo.
O conjunto do discurso de Barroso, segundo Nicolas Sarkozy, ex-presidente francês convidado ao evento do Grupo Esfera, foi além da pauta judiciária para tratar de um projeto de país. "É um discurso de orientação política forte", disse Sarkozy.
Sarkozy comentou ainda que o discurso mostra que Barroso estaria pronto para “uma nova presidência”, deixando subentendido um potencial para a carreira política. Após o painel, Barroso comentou que a possibilidade “não passa pela minha cabeça”. O ministro tem mais dois anos como presidente do Supremo Tribunal Federal e pode ficar até mais dez anos na corte antes de chegar à idade limite de 75 anos.
*Lucas Amorim viajou a Paris a convite do grupo Esfera Brasil.