Câmara discute restringir atuação de partidos de oposição ao governo
Ideia é desidratar os dispositivos regimentais para obstrução de matérias, ou seja, para atrasar ou impedir votações
Estadão Conteúdo
Publicado em 4 de outubro de 2019 às 13h18.
Deputados discutem nos bastidores alterações no regimento interno da Câmara para dificultar a atuação dos partidos de oposição ao governo de Jair Bolsonaro e, ao mesmo tempo, facilitar o andamento da pauta econômica adotada pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), destaca o jornal O Estado de S. Paulo. A ideia é desidratar os dispositivos regimentais para obstrução de matérias, ou seja, para atrasar ou impedir votações.
Maia tem sido cobrado por parlamentares governistas a levar adiante as mudanças - promessa de campanha do presidente da Câmara para se reeleger, no início do ano. Deputados de partidos como PT, PCdoB e PSOL, no entanto, não aceitam discutir novas regras se a intenção for aplicá-las ainda nesta legislatura, mas somente a partir de 2023.
"Precisamos discutir a reforma do nosso regimento. Que continue garantindo os direitos da minoria, mas que não seja o regimento que o cidadão na televisão ache que isso aqui é um picadeiro", disse Maia em fevereiro, após ser reeleito.
Atualmente, há 17 tipos de dispositivos previstos no regimento interno para obstrução de matérias, desde o pedido para retirada de um projeto da pauta até o adiamento da votação por uma ou duas sessões. Um dos pontos em discussão é o que prevê o fim do tempo determinado de sessão. Hoje, cada período tem, no máximo, seis horas regimentais - cinco de sessão mais uma de prorrogação.
Após a abertura de uma nova reunião, qualquer deputado pode pedir verificação de quórum - para atestar se há número suficiente de parlamentares presentes - e reapresentar um dos 17 requerimentos do "kit obstrução", mesmo se eles tiverem sidos debatidos anteriormente. Além disso, os líderes ganham direito a falar novamente. A derrubada do limite visa evitar o adiamento das votações.
De acordo com o deputado Eli Borges (SD-TO), autor da proposta de mudanças no regimento, uma única votação pode ter mais de nove horas de debate, mesmo se todas as ferramentas de obstrução forem rejeitadas. O cálculo leva em conta que cada um dos 17 dispositivos regimentais pode ser discutido pelos líderes partidários e de bloco, além de dois deputados a favor e dois contrários ao requerimento.
Se todos usarem o máximo de tempo permitido, cada discussão terá, no mínimo, 33 minutos. "O que vemos hoje é um tremendo desperdício de tempo do Parlamento. O regimento foi feito para paralisar, não para produzir", disse.
Bancadas
A oposição tem 97 deputados, de quatro partidos (PT, PSB, PSOL e Rede), além da adesão de legendas como PDT e Cidadania, o que eleva o número para 130 parlamentares. Sozinho, o grupo não tem voto suficiente para barrar uma votação, mas consegue adiar o debate.
Para o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), a medida teria de valer imediatamente. "Sei que a oposição não vai querer, porque eles querem obstruir o governo. Eu quero é votar. Quem tem maioria, ganha."
Parlamentares da oposição, por outro lado, veem com ressalvas as mudanças. O deputado Henrique Fontana (PT-RS) disse achar válido discutir a atualização do regimento, desde que para futuras legislaturas, para evitar "casuísmos".
Para o líder do PCdoB, Orlando Silva (SP), o regimento pode ser aperfeiçoado para melhorar a dinâmica do plenário, mas o direito das oposições precisa ser respeitado. "Fala-se de alteração regimental, que só se aplicaria para a Legislatura seguinte."
O regimento, que está em vigor desde 1989, já foi alvo de emendas. As novas alterações foram apresentadas em dois projetos de resolução em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O Estado apurou que a proposta já circulou na mão de Maia e de parte dos líderes partidários. Se for aprovada, entrará em vigor 90 dias após sanção.