Em voo, Míriam Leitão é hostilizada por militantes do PT
Em sua coluna, a jornalista relatou ter sido ameaçada, xingada e chamada de "terrorista" por cerca de 20 pessoas durante uma viagem
Estadão Conteúdo
Publicado em 13 de junho de 2017 às 14h35.
Última atualização em 13 de junho de 2017 às 15h05.
São Paulo - Associações de jornalismo repudiaram o ataque verbal sofrido pela jornalista Míriam Leitão, colunista da Globonews e do jornal O Globo, por parte de delegados do PT durante um voo, de Brasília para o Rio de Janeiro, da companhia Avianca. Segundo a jornalista, ela foi ameaçada, xingada e chamada de "terrorista" durante a viagem por cerca de 20 pessoas.
O diretor executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Ricardo Pedreira, afirmou que a associação se solidariza com a jornalista e que o comportamento violento revela autoritarismo.
"É preocupante esse tipo de manifestação de intolerância em relação à atividade jornalística. Revela autoritarismo, obscurantismo e um lamentável comportamento violento. A ANJ se solidariza com a Míriam, na certeza de que ela continuará fazendo o jornalismo de grande qualidade que sempre fez", disse.
Já a Associação Brasileira de Jornalista Investigativo (Abraji) divulgou nota repudiando o comportamento dos passageiros que "de maneira covarde e intolerante, atacaram a colunista Míriam Leitão".
Para a associação, não há nada que justifique assédio violento a qualquer cidadão por suas posições ou seus atos. "Infelizmente o acirramento de posições políticas tem levado à proliferação de situações como essa, seja em aviões, restaurantes e mesmo hospitais", afirma.
"O dissenso é saudável para uma democracia, e o embate civilizado de ideias é o melhor caminho para a construção de uma sociedade mais justa. A violência, a intolerância e a incompreensão do papel da liberdade de expressão, ao contrário, podem ferir de morte o regime democrático", continua a nota.
O episódio aconteceu no dia 3 de junho, último dia do Congresso do partido em Brasília. A jornalista contou nesta terça-feira, 13, que foi hostilizadas por "homens e mulheres representantes partidários", "alguns já em seus cinquenta anos", durante todo o percurso, de duas horas. Míriam chegou a ser chamada de "terrorista" e lembrou, em seu texto, que um coronel, durante a ditadura militar, usou o mesmo termo para se referir a ela.
O piloto de avião, afirma Míriam, não fez nada para restabelecer a ordem a bordo, nem a tripulação, que, segundo ela, se permaneceu "inerte" diante de "gritos, slogans e cantorias".
Míriam, que estava na poltrona 15C, próxima de algumas das pessoas que a hostilizaram, conta que uma comissária, a pedido do comandante, a convidou a sentar na frente. Ela, porém, recusou-se a trocar de lugar. Em outro momento, a aeromoça afirmou que a Polícia Federal estava mandando a jornalista trocar de lugar e, do contrário, o avião não sairia. A jornalista, que disse não ter visto ninguém da PF, recusou novamente o pedido, lembrando que já enfrentou a ditadura.
Míriam termina sua coluna afirmando que "não acha que o PT é isso", mas repetindo que "os protagonistas desse ataque de ódio eram profissionais do partido". A jornalista diz que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva citou, mais de uma vez, seu nome em comícios e reuniões do partido. "Como fez nesse último fim de semana. É um erro. Não devo ser alvo do partido, nem do seu líder", escreveu.
No Twitter, o termo "Míriam Leitão" já está no topo dos assuntos mais comentados nesta terça-feira.
A senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT, informou por nota que lamenta o constrangimento sofrido por Míriam Leitão. Ela afirmou que o partido orienta a militância "a não realizar manifestações políticas em locais impróprios e a não agredir qualquer pessoa por suas posições políticas, ideológicas ou por qualquer outro motivo, como confundi-las com empresas para as quais trabalhem".
Ainda de acordo com a senadora, o partido entende que "esse comportamento não agrega nada ao debate democrático" e afirma que muitos integrantes do PT, inclusive a Gleisi, "já foram vítimas de semelhante agressão dentro de aviões, aeroportos e em outros locais públicos".
Ainda na nota, a senadora criticou a Rede Globo e disse que a emissora é "em grande medida, responsável pelo clima de radicalização e até de ódio por que passa o Brasil e em nada tem contribuído para amenizar esse clima do qual é partícipe". "O PT não fará com a Globo o que a Globo faz com o PT", finaliza a nota.
A Avianca disse, por meio de nota, que repudia "qualquer ação que viole os direitos dos cidadãos". Afirmou, ainda, que a presença da Polícia Federal foi solicitada na aeronave que fazia o voo 6327 "após a tripulação detectar um tumulto a bordo que poderia atentar à segurança operacional e à integridade dos passageiros". De acordo com a companhia, o procedimento seguido pelo comandante "seguiu a praxe do setor para esses casos".
Procurado, o Instituto Lula disse que não ia se posicionar sobre a citação de Míriam ao ex-presidente.