Jackeline, 26, segura seu filho Daniel, de 4 meses de idade e nascido com microcefalia, enquanto andam na rua em direção a sua casa em Olinda (REUTERS/Nacho Doce)
Raphael Martins
Publicado em 17 de fevereiro de 2016 às 17h30.
Última atualização em 1 de agosto de 2017 às 15h43.
São Paulo – Conforme aumenta o surto de casos notificados de microcefalia em bebês no Brasil, cresce o temor das gestantes com relação aos riscos apresentados pelo zika vírus. Entre 2015 e 2016, já são mais de 4,7 mil suspeitas da malformação em crianças brasileiras, provavelmente associadas à expansão do vírus.
Sem vacina ou cura conhecida pela ciência, o governo brasileiro tenta mitigar os efeitos da epidemia concentrando esforços no combate ao Aedes aegypti.
No próximo sábado (13), uma força-tarefa convocada pela presidente Dilma Rousseff colocará na rua 220 mil militares e agentes de saúde para visitar 3 milhões de residências em busca de focos de reprodução do mosquito, como pontos de água parada. Uma medida provisória, inclusive, dá permissão às autoridades para entrar à força em casas e terrenos abandonados para erradicar as qualquer forma de reprodução da praga.
Enquanto isso, porém, a população de risco fica à mercê de prevenções alternativas para se proteger das contaminações. As dúvidas, principalmente de gestantes, ainda são muitas: quais as melhores formas de prevenção? O que fazer se o mosquito me pegar? Se tiver zika é certeza que meu filho terá problemas?
Para apresentar as melhores formas de prevenção e desmascarar alguns mitos com relação ao zika durante a gravidez, EXAME.com consultou especialistas para formular respostas — ou, ao menos, dizer o que já se sabe nesse sentido.
Veja a lista a seguir, elaborada com a ajuda de Jessé Alves Reis, coordenador do Ambulatório de Medicina do Viajante do Hospital Emílio Ribas, e José Paulo Pereira Júnior, gerente da Área de Atenção Clínico-Cirúrgica à Gestante do Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz).
Em prevenção, dois pontos precisam ser levantados. Um deles é a transmissão do zika por contato sexual.
Os Estados Unidos, através do serviço de saúde de Dallas, no Texas, divulgaram o registro com o caso de uma pessoa infectada após se relacionar com alguém que voltava da Venezuela. Como há a possibilidade de contaminação, gestantes devem usar preservativo em qualquer relação sexual.
Mas a principal preocupação deve ser, sem dúvida, evitar a picada do mosquito.
Começando pela casa, é fundamental manter a organização e eliminar quaisquer focos próximos de criadouros de mosquitos. Uma vistoria completa e chamar a atenção de vizinhos com relação à prevenção são mais que válidos.
Instalar mosquiteiros nas janelas é bastante eficaz — tê-los também no entorno da cama aumenta a proteção durante a madrugada. Inseticidas em spray e de tomada são bem vindos em locais ventilados.
Caso haja terrenos baldios, imóveis abandonados ou moradores da região que não colaboram em extinguir os focos, é recomendado que se procure a fiscalização das prefeituras. Em horários de alta concentração de mosquitos, como o período da noite e início da manhã, a atenção deve redobrar.
Apesar de o calor do verão dificultar o uso, vale priorizar as roupas compridas, reforçadas em mangas e pernas. Para as partes expostas, o uso de repelentes de insetos é necessário.
Qualquer repelente aprovado pela Anvisa ajuda na prevenção às picadas, mas a gestante deve estar atenta ao tempo de permanência na pele. Os três mais comuns são Icaridina, DEET, IR 3535.
“Icaridina tem o tempo de ação mais longo, de acordo com o fabricante, que pode durar até 10 horas na pele”, diz Jessé Alves Reis, do Emílio Ribas. “É fundamental lembrar sempre que esse tempo de duração é em situação ideal. Em momentos de transpiração alta, muito calor, é preciso reaplicar com mais frequência.”
Ler as instruções no rótulo do produto é obrigatório para que a eficiência seja assegurada e não haja tempo de exposição ao mosquito.
Ministério da Saúde e Organização Mundial da Saúde não chegaram a proibir viagens de gestantes para regiões mais afetadas pelo surto de zika, mas recomendam precaução.
Cientistas, porém, divergem sobre o assunto. O CDC (Centro de Prevenção e Controle de Doenças dos Estados Unidos) é um dos órgãos que abertamente desencoraja as viagens — principalmente de gestantes — a países com surto de zika.
“Vale realmente a pena fazer a viagem? É preciso conversar com o seu médico e pensar em adiar até que se tenha um plano mais claro do que está acontecendo”, afirma Reis, do Emílio Ribas.
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O exame diagnóstico que já foi desenvolvido para o zika vírus é inútil sem a presença de sintomas, então não há motivo para fazer exames preventivos. Além de só detectar o problema na fase aguda, 80% dos casos de zika são assintomáticos.
“Infelizmente, o único teste que temos no momento, chamado RT-PCR, só é eficaz nos primeiros 5 a 16 dias de sintomas”, afirma José Paulo Pereira Júnior, da Fiocruz. ”Ainda não temos sorologias [exames laboratoriais] confiáveis que possam rastrear se o zika esteve no corpo em algum momento, nem se está em quantidade para causar malformação.”
Segundo Pereira Júnior, no futuro, quando estes exames laboratoriais estiverem aprimorados, esta pode ser uma estratégia para combater ocorrências de microcefalia.
Em geral, após contrair uma doença viral e se curar, o corpo produz anticorpos por toda a vida. O “senso comum” da medicina acredita que o mesmo acontece para o zika. O problema é que a ciência ainda não sabe o quanto é necessário de vírus para desencadear casos de microcefalia, nem quanto tempo essa quantidade leva para sair do corpo da paciente.
A estimativa dos órgãos médicos, até o momento, é de que o zika demora cerca de 16 dias para ser eliminado do corpo. Como não há comprovação do ponto de vista definitivo, médicos e cientistas chegaram a essa conclusão colocando como referência o funcionamento de outras doenças virais, como a rubéola, sífilis e toxoplasmose.
Ambas causam malformação congênita, assim o zika parece fazer. Em nenhum caso, porém, há precedentes de microcefalia em pessoas que tiveram a doença antes da gravidez.
“Os efeitos de infecções virais sempre são mais preocupantes nesse período, porque é a fase de multiplicação das células e formação dos órgãos”, diz José Paulo Pereira Júnior, da Fiocruz. “No modelo hipotético, é pior. Mas, por ser uma doença nova e não conhecermos todas as nuances, é necessário se proteger a todo o tempo.
“Não pode esmorecer nos cuidados, pois não se sabe o quanto a infecção pode ser prejudicial em momentos específicos da gravidez”, afirma.
O maior pesadelo de uma gestante nesse cenário é ser diagnosticada com a zika. Mas antes de se desesperar, é necessário saber que não são 100% dos casos de mulheres que contraíram o vírus que geraram bebês com malformação. Essa proporção ainda é desconhecida pela ciência e está em estudo.
Pereira Júnior, da Fiocruz, atende 43 mulheres grávidas que foram comprovadamente diagnosticadas com o zika em seu consultório. A proporção de bebês com malformação é alta, mas sua amostragem não é suficiente para comprovar algo.
“Do ponto de vista técnico, só consigo falar de depois de comparar grupos doentes com saudáveis por anos, entendendo as regras de cada situação. Estudos como este começaram a ser feitos agora”, diz. “Daqui um ano ou dois que teremos esses números.”
É importantíssimo estar atenta aos sintomas: os efeitos mais comuns do vírus no corpo são febres intermitentes e moderadas, vermelhidão nos olhos por conjuntivite, dores no corpo e articulações, além das características manchas vermelhas na pele. Se houver qualquer desconfiança, é necessário procurar os serviços de saúde.
“Uma vez contraído o vírus, não há muito mais o que fazer — é acompanhar para ver se esse criança será afetada”, diz Jessé Alves Reis, do Emílio Ribas. “É difícil cravar qualquer estimativa, pois não sabemos quantas pessoas contraíram e não tiveram nada, não sabemos a proporção de mulheres infectadas que efetivamente passaram pelo problema adiante.”
Em crianças pequenas e idosos, essa família de vírus pode causar eventos mais sérios que em adultos, como febre, comprometimento do fígado, etc.”, disse Ralcyon Texeira, supervisor do Pronto Socorro do Hospital Emílio Ribas, em entrevista a EXAME.com.
Texeira destaca que é completamente falso o boato que corre na internet sobre a possibilidade de crianças já nascidas, e até os 7 anos de idade, contraírem microcefalia se infectadas com o zika vírus.
“Não haverá qualquer tipo de malformação”, diz. “Isso é completamente falso.”