A gripe que ameaça, mais uma vez, a produção de ovos nos EUA — e fez os preços dispararem
H5N1 atingiu 43 milhões de aves em 2024 nos EUA, segundo o USDA
Repórter de agro e macroeconomia
Publicado em 9 de janeiro de 2025 às 16h20.
Última atualização em 9 de janeiro de 2025 às 23h48.
Os Estados Unidos enfrentam, no início de 2025, um novo surto de gripe aviária H5N1 , colocando novamente em risco sua produção de ovos. O país é o terceiro maior produtor mundial, com uma produção anual de 113 bilhões de ovos, segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).
O surto de gripe aviária nos EUA não é inédito. Em 2022, o país registrou 50,5 milhões de aves infectadas, o que resultou em uma queda de 12,7% na produção de ovos em relação a 2021, quando foram produzidos 10,2 bilhões de dúzias, segundo o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA).
Desde abril daquele ano, aproximadamente 70 pessoas contraíram o vírus no país, a maioria trabalhadores rurais expostos a aves infectadas, segundo os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).
Nos anos seguintes, o impacto continuou. Em 2023, 58 milhões de aves foram atingidas, reduzindo a produção para 8,9 bilhões de dúzias de ovos. Já em 2024, com 43 milhões de aves infectadas, a produção caiu ainda mais, para 8,6 bilhões de dúzias. Para este ano, contudo, ainda não há estimativas.
A redução da oferta de ovos já pressiona os preços. Em dezembro de 2024, o preço médio de uma dúzia de ovos no varejo chegou a US$ 3,60, um aumento expressivo frente aos US$ 2,50 registrados em janeiro do mesmo ano, segundo a Reuters.
O cenário pode piorar em 2025, com o plano do presidente eleito, Donald Trump , de aplicar tarifas sobre produtos importados.
Entre os mais afetados estaria o Canadá , principal fornecedor de ovos para os EUA, com 46,8 milhões de dúzias exportadas em 2023, incluindo produtos processados. Nesta semana, inclusive, o republicano sinalizou que pretendia anexar o Canadá aos EUA, chegando a afirmar que usaria a“força econômica” para forçar uma fusão entre os dois países.
Surto de gripe aviária nos EUA
A crise nos Estados Unidos pode abrir oportunidades comerciais para o Brasil. Em 2024, as exportações brasileiras de ovos para o mercado norte-americano cresceram 85%, totalizando 3,253 milhões de dúzias, segundo dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
“A chance de termos problemas graves com a influenza aviária é mínima devido à blindagem que possuímos. Nos últimos anos, vimos surtos na União Europeia, nos EUA, na África do Sul e até na América do Sul, mas o Brasil continua seguro graças ao alto grau de proteção do nosso sistema de produção”, afirma Fernando Iglesias, analista da SAFRAS & Mercado.
Apesar do otimismo, Luizinho Caron, especialista da Embrapa Suínos e Aves, destaca que, mesmo sendo referência em biossegurança, o Brasil não pode ignorar os riscos.
Segundo Caron, os impactos da gripe aviária podem ser positivos, como no fortalecimento da balança comercial, com o Brasil atendendo à demanda por carne, leite ou ovos que os Estados Unidos deixam de suprir. No entanto, há também possíveis desdobramentos negativos, como a disseminação do vírus, que pode afetar o país no futuro.
“Principalmente se a enfermidade passar a ser transmitida entre seres humanos, um risco que, embora remoto, não pode ser considerado inexistente”, diz Caron.
No ano passado, o Brasil registrou um caso da Doença de Newcastle em uma granja no Rio Grande do Sul, provocado por aves migratórias. O episódio resultou na suspensão temporária das exportações de carne aviária, medida que foi rapidamente revertida graças à agilidade das autoridades brasileiras em responder à situação.
“O que podemos fazer é continuar preservando nosso status sanitário na produção industrial, que nunca registrou foco da doença. Paralelamente, na produção não industrial ou criação doméstica, temos promovido campanhas de conscientização para orientar sobre os cuidados necessários com as aves e evitar eventuais riscos de contaminação, caso o país volte a registrar focos em aves silvestres”, afirma Ricardo Santin, presidente da ABPA.
Na terça-feira, 7, um idoso de 65 anos morreu nos EUA em decorrência da enfermidade, tornando-se a primeira fatalidade humana registrada no atual episódio.
Na quarta-feira, 9, a Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) emitiu um alerta global, enfatizando que a gripe aviária exige “atenção global urgente, pois transcende suas origens aviárias para afetar mamíferos domésticos e selvagens com frequência crescente”.
O documento reforça a necessidade de vigilância e cooperação internacional para mitigar os impactos da doença.
O que é a gripe aviária?
A gripe aviária , de acordo com a Embrapa Suínos e Aves, é uma doença que afeta aves domésticas e silvestres, causada pelo vírus Influenza A (IAV) altamente patogênico.
O vírus pode infectar aves e mamíferos, incluindo humanos, e sua transmissão ocorre de forma eficiente por meio de aerossóis respiratórios, fezes e fluidos corporais.
O contágio pode ser direto, através da proximidade entre hospedeiros, ou indireto, por meio de água ou objetos contaminados.
Em aves domésticas , a doença se manifesta principalmente por alta mortalidade e problemas respiratórios, como tosse, espirros, presença de muco nas narinas e hemorragias em áreas desprovidas de penas e mucosas.
Também podem surgir sinais clínicos de natureza neurológica, como o andar cambaleante. Em aves destinadas à produção de ovos, há uma queda significativa na postura.
O contato entre aves domésticas e silvestres é um dos principais fatores para o surgimento de surtos de gripe aviária na avicultura comercial e doméstica.
Segundo a Embrapa, dependendo da cepa e da espécie de ave, o vírus pode ser inofensivo ou letal. Quando as aves silvestres apresentam poucos ou nenhum sintoma, tornam-se vetores eficazes para disseminar o vírus a países vizinhos ou por longas distâncias, seguindo suas rotas migratórias.