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Volkswagen vs. Tesla: a nova guerra dos carros elétricos

Excentricidade de Herbert Diess espelha a de Musk enquanto preços de ação da Volkswagen saltam 80% em 2021

 (Reuters/Reuters)

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Laura Pancini

Publicado em 5 de abril de 2021 às 07h00.

Última atualização em 5 de abril de 2021 às 07h29.

Elon Musk e Herbert Diess

CEO da Tesla, Elon Musk (esquerda), e CEO da Volkswagen, Herbert Diess (direita) (BRENDAN SMIALOWSKI/Getty Images)

Ele não namora uma estrela do synthpop, fuma baseados em público ou diz que tem planos de morrer em Marte, mas Herbert Diess está começando a falar e parecer até demais com Elon Musk. O executivo-chefe da Volkswagen começou uma coletiva de imprensa em 15 de março nos mesmos moldes do “Dia da Bateria” da Tesla – Diess chamou o evento da VW de “Dia da Potência” – ao declarar que só há um jeito de reduzir depressa as emissões dos meios de transporte: migrando para o modelo de carros elétricos.

É compreensível que os mais céticos tenham levantado as sobrancelhas ao ouvir esta mensagem, já que ela veio da mesma montadora de carros que passou anos enrolando o mundo na questão do “diesel limpo”. Porém, finalmente a VW está vendo o retorno de seu esforço de cinco anos para criar uma plataforma padronizada capaz de dar conta de dúzias de modelos elétricos.

“Muitos na indústria questionaram nossa abordagem”, afirmou Diess durante o infomercial de duas horas comandado por ele direto do quartel-general da VW na cidade alemã de Wolfsburg. “Hoje eles estão seguindo nosso exemplo, enquanto nós colhemos os frutos.”

No ano passado, a VW se tornou a montadora de veículos elétricos número 1 da Europa, região em que as vendas de carros movidos a bateria dispararam graças aos limites mais rigorosos de emissão de dióxido de carbono. Após o lançamento do hatchback ID.3 em 2020, o híbrido ID.4 – primeiro modelo global baseado na plataforma elétrica da VW – está começando a chegar aos showrooms de Xangai a Chicago.

Neste ano, a VW planeja entregar um milhão de veículos híbridos plugáveis e totalmente elétricos, e Diess busca ultrapassar a Tesla em número de vendas de EVs (veículos elétricos, na sigla original em inglês) até 2025, no pior dos cenários. Alguns analistas preveem que isso deve acontecer muito antes.

Além de armar eventos-ostentação, bater bola com o público no Twitter e soltar bravatas descaradas, Diess tem outra coisa em comum com Musk nos últimos tempos: um preço de ação a caminho da estratosfera. Sem dúvida, a avaliação estelar da Tesla significa que Musk conseguiria comprar a VW amanhã se quisesse (não quer), mas as ações comuns da VW deram um salto de mais de 80% neste ano. Há tempos Musk tem dito que vê com bons olhos a competição da VW e que a missão da Tesla era acelerar a chegada da energia sustentável. Ele conseguiu o que queria.

EVs estão mudando de algo que parecia uma banda de um homem só para um festival com um palco cada vez mais cheio. Embora a VW tenha tantas chances quanto qualquer outra montadora de disputar o palco principal com a Tesla, o que está menos evidente são as atrações.

A CEO da General Motors, Mary Barra, fez disparar o preço das ações de sua empresa em janeiro, quando disse que planejava eliminar gradualmente os carros a gasolina e a diesel até 2035. Muitas montadores chinesas estão botando no mercado EVs mais econômicos, e a Hyundai está planejando quase duas dúzias de modelos.

A Renault emplacou um hit surpresa na Europa no ano passado com seu Zoe, um hatchback alimentado por bateria. Nos EUA, o Mustang Match-E da Ford está chegando aos showrooms, e a Rivian (apoiada pela Amazon) e a Lucid Motors – clone da Tesla prestes a conseguir US$ 4,4 bilhões em fundos – vêm buscando reproduzir o sucesso de Musk.

A Tesla está fazendo com o setor automobilístico o que a Netflix fez com a TV a cabo, acelerando a migração dos motores de combustão externa do mesmo modo que o acesso fácil a Breaking Bad e centenas de outros shows estimularam consumidores a passar a tesoura em seus contratos da Comcast (operadora de TV a cabo dos EUA).

Porém, do mesmo modo que a Netflix tem hoje um desafio crescente vindo de partes da velha guarda – pense em Walt Disney e HBO –, as montadoras rivais na disputa pela liderança estão começando a copiar as recém-chegadas. (Sem dúvida, as empresas de TV a cabo também têm pela frente a ameaça de companhias nos moldes de Amazon, Apple e Google, que nesta analogia são...Amazon, Apple e Google.)

Ainda que a Disney+ esteja anos atrás da Netflix, o serviço da Disney tem sido um sucesso absoluto com novas opções como O Mandalorian oferecidas em meio à oferta oceânica de clássicos Disney como Pinóquio, Toy Story e Mulan. Do mesmo modo, Diess vem conquistando investidores ao argumentar que a VW pode tirar proveito de algo que a Tesla ainda não tem muito: escala.

Com uma dúzia de marcas para ocupar cada canto e recanto do mercado de automóveis – e vendas de 9,3 milhões de veículos no ano passado, comparado ao meio milhão da Tesla –, a VW está posicionada de modo único para juntar recursos e bancar o custo de desenvolver novas tecnologias. Até o ano que vem, a VW terá 27 modelos baseados em sua plataforma padronizada. “Nossa transformação será rápida”, Diess afirmou em seu evento, “maior do que qualquer coisa que o setor já viu no último século”.

Do mesmo modo que Musk, Diess tem apostado alto em baterias e estações de recarga. Até 2025, a VW e seus parceiros terão mais de 35 mil carregadores públicos pelo mundo. Até porque um componente do acordo legal da empresa com os EUA e a Califórnia sobre as fraudes nos testes de emissões foi um compromisso de gastar US$ 2 bilhões promovendo plugues e construindo infraestrutura de recarga. Em 2017, a VW montou uma afiliada chamada Electrify America que hoje se gaba de ter a maior rede de recarga rápida dos EUA.

Diess também está planejando meio dúzia de fábricas de baterias na Europa, que a BloombergNEF (braço de pesquisa estratégia da Bloomberg) estima que irão exigir um investimento de quase US$ 18 bilhões. A pesquisadora de energia diz que melhoras no design das células, a química das baterias e a produção puseram a VW a caminho de cortar pela metade o custo de baterias até 2025. Isso poderia tornar os EVs mais baratos do que veículos semelhantes equipados com motor a explosão.

Alguns adversários insistem que o mergulho de cabeça da VW nos carros elétricos é imprudente porque eles continuam a ser uma lasca das vendas globais – cerca de 3% dos veículos entregues no mundo todo no ano passado. A Toyota, que passou por pouco a VW como maior montadora do mundo em 2020, há tempos vem dizendo que os híbridos são uma solução intermediária mais sensata. E a BMW vem abraçando a flexibilidade, fabricando vários de seus modelos em diversas versões: movidos a gasolina, híbridos, plugáveis híbridos e elétricos.

“Acreditamos que uma estratégia única de propulsão pode ser algo muito perigoso”, disse à TV Bloomberg o CEO da BMW, Oliver Zipse, em 17 de março. “A chance de 150-160 mercados convergirem em um período muito curto de tempo – e uma década é um período curtíssimo – em um única locomotiva é altamente improvável.”

Diess não tem planos de pisar no freio. Mesmo que os primeiros modelos da plataforma atual estejam começando a ser lançados, a VW vem desenvolvendo incansavelmente um conjunto separado de peças padrão para veículos elétricos da Audi, Porsche e outras de suas marcas de luxo.

A versão premium da plataforma promete tempos de carga mais rápidos, distâncias mais longas e aceleração maior do que os modelos de primeira geração. Até o meio da década, a VW diz que terá um sistema único e escalável para atender todos os carros movidos a bateria da empresa – não importa a marca ou segmento –, já que a meta da VW é vender 26 milhões deles nos próximos dez anos.

“Eles estão confiantes de que conseguem alcançar a Tesla”, diz Michael Den, analista na Bloomberg Intelligence, que espera que a VW coloque a coroa mundial dos EVs até 2023. “A entrada deles na eletrificação é pra valer.”

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