Tanque controlado por Game Boy combate guerras do futuro
De Alepo a Donetsk, planejamento de combates está passando para cenários urbanos onde acesso à internet facilita táticas de guerrilha
Da Redação
Publicado em 9 de setembro de 2014 às 17h32.
Washington - Em um quintal de Alepo , rebeldes sírios construíram um tanque para combate urbano. Tudo o que foi preciso foi um smartphone com Android para baixar um manual de faça você mesmo.
Eles montaram algumas autopeças enferrujadas com um console Game Boy e uma televisão de tela plana que controla uma metralhadora.
O resultado: uma arma menor do que um Mini Cooper, alternativa ideal em becos estreitos ao tanque Abrams de 70 toneladas utilizado pelos EUA nos desertos iraquianos e nos vales afegãos.
De Alepo a Donetsk, Ucrânia, o planejamento de combates e guerras está passando para cenários urbanos onde o acesso à internet facilita táticas de guerrilha do século 21°.
Com 1,5 milhões de pessoas migrando às cidades cada semana – a maioria no mundo em desenvolvimento –, os novos campos de batalha serão megalópoles cheias de favelas, mas conectadas, como Lagos e Mumbai, onde insurgentes e chefões do crime podem explorar a tecnologia para controlar anéis de território sem lei.
“Se três quartos da população mundial morarão em cidades, e ainda lutamos em guerras, então as guerras vão ser lutadas nesse ambiente”, disse Richard J. Norton, professor de Assuntos de Segurança Nacional na Naval War College. Uma década atrás, ele cunhou o termo ‘feral cities’ (“cidades selvagens”) para descrever lugares “onde a lei foi substituída há tempos por uma semianarquia”.
Hoje em dia, os talibãs, espertos usuários de tecnologia, encontram uma melhor proteção nas ingovernáveis ruas de Karachi do que nas cavernas de Tora Bora.
Até mesmo em Mogadíscio, cenário da derrubada de dois helicópteros americanos em 1994 popularizada pelo livro “Black Hawk Down”, de Mark Bowden, o grau de conectividade é surpreendente.
Acesso fácil
“Na verdade, o acesso à internet é bem mais fácil em Mogadíscio do que em partes dos Estados Unidos”, disse recentemente David Kilcullen, ex-assessor dos comandantes americanos no Iraque e no Afeganistão, a uma audiência que incluía fuzileiros navais.
O conflito armado passará para cidades “que estão experimentando esse tsunami de população entrante, e as informações, o dinheiro, as drogas e as armas que vêm junto com a urbanização rápida”, disse Kilcullen na palestra em São Francisco.
Em 2008, somente foram precisos 10 atiradores para transformar Mumbai, a capital financeira da Índia com 21 milhões de habitantes, em um cenário de guerra.
Sete grandes monumentos foram atacados em três dias em um violento ataque controlado remotamente por terroristas no Paquistão.
Dura conclusão
Embora ainda haja muita disposição de lutar em campos tradicionais de batalha, no mês passado as cabeças do exército americano chegaram a uma dura conclusão após simularem operações militares em uma cidade com mais de 10 milhões de habitantes: suas opções são poucas, suas forças estão mal equipadas e o cenário não é tão hipotético assim.
Até agora, o treinamento e os gastos se concentram na guerra tradicional. A maior compra militar dos EUA é o jato F-35 – com um custo projetado de US$ 398,6 bilhões por 2.443 aviões. O somatório supera os orçamentos anuais para defesa da China, da Rússia e do Reino Unido.
Algumas das ferramentas que os militares deveriam desenvolver são veículos não tripulados para mapear túneis e conjuntos ajustados para proteger os soldados de agentes infecciosos com que possam se deparar enquanto avançam por sistemas de esgoto, segundo Norton.
Misturar equipamentos militares com ambientes civis é um coquetel explosivo e imprevisível. Basta olhar o caso de Ferguson, Missouri, um subúrbio de 21.000 moradores que no mês passado se assemelhou a uma zona de guerra.
Manifestantes indignados com a morte a tiros de um adolescente negro desarmado receberam balas de borracha, granadas de fumo e gás lacrimogêneo atirados de veículos à prova de balas.
À noite houve enfrentamentos entre manifestantes e policiais com caminhões blindados e uniformes militares.
Lisha Williams, veterana do exército que mora perto de Ferguson, corria para se proteger enquanto a polícia local passava com veículos blindados.
“Eu fui ao Iraque e lutei pelo meu país”, disse ela. “Agora, eu voltei, e na minha própria terra, eles fazem isso?”