Tecnologia

Muito além da licença

A TI não precisa mais ter a posse do software. Novas modalidades de cobrança permitem ao CIO mais flexibilidade e menos custos. A hora é de negociar. Aproveite!

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h43.

A necessidade de reduzir os custos operacionais e buscar cada vez mais eficiência para a área de TI chegou aos contratos de software. Essa constatação tem dois significados importantes. O primeiro diz respeito à negociação entre CIOs e fornecedores, que caminha para se tornar muito mais dura. O segundo mostra uma realidade improvável até pouco tempo atrás: o questionamento do modelo de licenças. Hoje o CIO procura modelos flexíveis de compra de software, que se ajustem às suas necessidades atuais e futuras.

A boa notícia é que os fornecedores estão cientes de que mudança é uma constante na vida de seus clientes e já começam a oferecer contratos alternativos. Até a forma tradicional, de receber por licença de uso, está mudando. Hoje ela está atrelada não apenas à CPU, mas também ao número de usuários,ao núcleo do processador, ao faturamento da empresa e até a métricas setoriais, como o número de leitos de um hospital. O CIO pode optar pelo software sem ter a posse da licença, pagando uma taxa mensal pelo uso em máquinas dentro ou fora de casa. Já é possível também contratar software de terceiros como serviço.

"Os modelos de cobrança ainda não estão totalmente consolidados pela indústria do software, por isso nos próximos 18 meses os CIOs têm grandes chances de conseguir os melhores acordos", diz Julie Giera, vice-presidente do instituto Forrester Research. Segundo Julie, as software houses estão desesperadas para manter seus clientes e começam a criar atrativos que as diferencie. "Os fornecedores sabem que terão de passar da venda de licenças para a de serviços, baseada em uso, o que fatalmente afetará sua lucratividade. Quem está com a vantagem nas mãos agora é o CIO", afirma Julie.

Mauro Negrete, diretor de tecnologia da empresa de comércio exterior Cotia Trading, concorda que a tendência é pagar conforme o uso. "Do ponto de vista do negócio, o melhor é transformar o custo fixo do software em variável", diz Negrete. Mas, segundo ele, o desafio é negociar certo na primeira vez. "Depois que a gente vira cliente, que os nossos processos passam a depender do parceiro, aí o poder de barganha cai", afirma Negrete, que estabelece contratos de software com prazo máximo de dois anos. Os que estão para vencer serão renegociados de olho nos indicadores de negócio. "O ideal seria atrelar a remuneração do software à contribuição do parceiro para o resultado", diz Negrete. Mas quando encomenda às fábricas de software aplicativos que sejam customizados para seu negócio, Negrete não quer apenas ter nas mãos a licença do software, mas também seu código fonte. "É preciso pensar bem antes de colocar o que é estratégico na mão de terceiros", afirma.

Os fornecedores passaram a oferecer um leque extenso de opções. Alguns gerenciam seus próprios pacotes quando o cliente não tem a infra-estrutura necessária ou não pode desembolsar grandes somas no início da operação. A Oracle, por exemplo, oferece três modalidades de cobrança, sendo duas com licença - a tradicional e a on demand - e uma de software como serviço. Quando o cliente tem posse da licença e usa a infra-estrutura da Oracle para rodar o software, trata-se da opção on demand. Se não quiser pagar pela licença, o CIO pode optar pela operação completa do serviço, com mensalidade referente ao uso, processamento e suporte do sistema. "No futuro, software será claramente um serviço, pela redução da complexidade e do custo total de propriedade do ambiente de TI", afirma Silvio Genesini, presidente da Oracle do Brasil.

A Microsoft também se mexe. "Estamos testando todos os modelos possíveis, desde software como serviço até hosting, assinatura e o pré-pago", afirmou Emílio Umeoka, presidente da Microsoft Brasil a cerca de 100 CIOs reunidos em maio num evento do Geti (Grupo de Executivos de TI) para discutir o futuro dos pacotes de ERP. Na forma de cartão pré-pago, a Microsoft testa a venda dos aplicativos do pacote Office ao consumidor final. Seus dois modelos ainda mais usados são a licença perpétua de uso, mantida por anuidade, e cuja atualização requer um pagamento adicional; e a assinatura, com renovação anual e direito a todas as atualizações.

De acordo com Fabio Costa, presidente da consultoria IDC Brasil, o back office adapta-se mais facilmente à cobrança por uso, bem como os serviços funcionais, como finanças e RH. "Nos aplicativos de negócios, que exigem maior esforço de customização, não há grandes ganhos financeiros na migração para o aluguel", afirma Costa.

Como optar entre licença e aluguel?

A conta para saber se vale a pena comprar ou alugar software é o TCO (custo total de propriedade). "Também é preciso levantar os custos diretos e indiretos e lembrar que a licença tem um custo aparente, pois a implementação do software é duas a três vezes esse valor", diz Costa. A produtora de alumínio Alcoa tem um plano de expansão em refinaria e mineração iniciado no ano passado e com previsão de entrega para 2008. Nesse período, a demanda por TI será variável. "Adquirimos apenas o mínimo de licenças do software de CAD para engenharia pensando no que será necessário manter após a entrega do projeto. Até lá, vamos pagar mensalmente conforme a quantidade de usuários nas diferentes fases da obra", diz Tânia Nossa, gerente de TI para a América Latina da Alcoa Alumínio. Mesmo para outros projetos e para a operação de TI como um todo, Tânia pretende adotar as modalidades de assinatura e leasing tanto quanto possível. "É uma forma de diluir os custos, evitar ociosidade e garantir a atualização tecnológica", afirma.

Ainda que pareça mais caro no começo, o custo da licença para contratos de longo prazo pode ser a melhor escolha. "Para efeitos contábeis, a licença é um ativo, e por isso seu custo pode ser amortizado em cinco anos. Considerando esse período, compensa pagar pela licença", diz Keiji Sakai, CIO do Deutsche Bank. Para Sakai, é importante também mensurar o risco em qualquer modalidade escolhida. "Mesmo que o software não tenha licença, como no caso do código aberto, a empresa não está livre do investimento. O trabalho de empacotamento da solução é feito por algum fornecedor e há custos", afirma Sakai.

Quer partir para o aluguel? Vá de contrato híbrido

A Avipal, empresa gaúcha do setor de agronegócios, com faturamento de 2,3 bilhões de reais em 2005, iniciou em junho passado a substituição de seu ERP caseiro pelo E-Business Suite, da Oracle. O contrato mistura licenciamento, para os 450 usuários do software, e aluguel do data center com a própria Oracle. "O aluguel nos permitiu postergar a decisão de investimento e minimizar os custos iniciais da operação. Assim, TI consegue dar mais resultados aos olhos do acionista", diz Rogério Schultz Rodrigues, gerente de informática da Avipal. O prazo do contrato é de um ano, durante o qual Rodrigues avaliará a relação custo/benefício para, então, decidir se migrará totalmente para o pagamento por uso, no modelo que a Oracle chama de on demand, se manterá as licenças ou, ainda, se internalizará o data center, que hoje está localizado no centro da Oracle em Austin, nos Estados Unidos. "O modelo on demand traz uma mudança de cultura, de se habituar a trabalhar com SLAs. E há um aspecto intangível, que é o valor de usar um serviço que nunca conseguiríamos criar dentro de casa, em termos de segurança, disponibilidade, performance e suporte 24 por 7", diz Cláudio Santos, gestor do centro de serviços compartilhados da Avipal. Santos conta que a negociação com a Oracle levou um ano e meio.

"Conversamos muito, pois era necessário um modelo flexível para acompanhar o crescimento da empresa no curto prazo, de forma que rapidamente usuários pudessem ser adicionados e novos serviços contratados", diz Santos. A expectativa é que o novo sistema entre em operação em junho do ano que vem, conectando as 11 unidades industriais no Rio Grande do Sul, mais os abatedouros de Mato Grosso e Bahia. O sistema de ERP foi o segundo grande investimento feito pela TI da Avipal nos últimos meses, precedido pela virtualização da infra-estrutura, com o software VMware, da EMC. Desde o início de 2005, quando a empresa fez a consolidação dos 40 servidores Dell nas plataformas Oracle e Linux e adotou a solução de middleware MetaFrame, da Citrix, a redução de custos com manutenção de infra-estrutura chegou a 30%.

O negócio vai mudar? Considere alternativas

Por mais atraente que seja uma negociação de longo prazo, com perspectiva de redução de custos em três ou cinco anos, nem todos os CIOs têm esse horizonte em sua estratégia de TI. A indústria de papel Ripasa, por exemplo, está aguardando uma posição do Conselho de Administração e Desenvolvimento Econômico (Cade) para definir seu modelo de negócio. Por isso, grandes investimentos em TI no momento podem comprometer toda a estratégia da companhia. Suas controladoras, as gigantes do papel e celulose Suzano e Votorantim (VCP), propõem um regime especial de atuação, sob forma de consórcio, para não configurar concentração de mercado. Para deixar a TI de prontidão, Francisco Açakura, gerentede TI da Ripasa, optou por um ERP da Microsiga com número ilimitado de licenças. "Assim, vou reduzir a quantidade de sistemas especialistas e ganhar flexibilidade quanto ao número de usuários, ao mesmo tempo mantendo o rigor e a legalidade do licenciamento de software", diz Açakura.

O redimensionamento da TI da Ripasa está sendo pautado por confiabilidade e controle, mais do que por redução de custos. "Não posso ficar na dependência de um provedor de serviço, no caso de um outsourcing, ou colocar meu modelo de negócio em risco com a adoção de Linux, que os usuários não estão acostumados", afirma Açakura. O contrato com a Microsoft também mudou. Por seis anos, a Ripasa adotou a modalidade Enterprise Agreement, com bônus em produtos e atualizações, e desde junho último passou a ser Select, com portfólio reduzido e pagamento adicional caso queria fazer upgrade das licenças para os servidores SQL, Exchange e Windows Server. "Dos vários modelos da Microsoft, esse é o mais adequado para nosso momento atual", afirma Açakura.

Dá para atrelar o custo do software aos indicadores de negócio?

A CHG, distribuidora de autopeças com sede em Campinas (SP) e revendedores espalhados pelo Brasil, contratava 50 licenças de ERP, cobradas por usuário. Quando a Totvs, dona da marca Microsiga, ofereceu a alternativa de migrar para o chamado plano corporativo, com quantidade ilimitada de licenças e cobrança relativa ao faturamento da empresa, Newton Rodrigues, diretor de tecnologia da CHG, aderiu. "Hoje os 200 funcionários acessam o sistema. E se a empresa crescer, poderei adicionar usuários sem custos", diz Rodrigues. Outra vantagem, segundo ele, é o cálculo do pagamento do software, atrelado ao faturamento da empresa e negociado uma vez por ano. Atualmente, metade da receita da Microsiga vem desse modelo alternativo de cobrança. "Conforme cresce o negócio do cliente, crescemos junto", diz Wilson de Godoy Soares Jr., vice-presidente da Totvs, que além da Microsiga controla a RM Sistemas e a Logocenter. A idéia é que o cliente pague conforme uma métrica de negócios, que pode ser o faturamento ou um índice setorial, como a quantidade de leitos de um hospital.

Software com terceiros? Exija nível de serviço

Quando os serviços de TI são operados fora de casa, o contrato deve prever níveis de atendimento rigorosos. A Visa Vale, por exemplo, processa 1500 transações por minuto, em horários de maior movimento, para cerca de 30 mil empresas clientes. "O parceiro de tecnologia precisa entender que, se o sistema ficar fora do ar por dois minutos, 3 mil pessoas deixarão de usar cartões", diz Sérgio Souza, diretor de tecnologia da Visa Vale.

Os 150 funcionários da empresa de cartões-benefício usam o pacote Office, contratado no modelo básico, diz Souza, e um terço deles tem acesso ao ERP da SAP. Essas licenças estão internalizadas e são pagas anualmente. Já o banco de dados, o data center, o suporte, o call center e outras operações são pagas mensalmente na forma de serviço para fornecedores como EDS e Diveo. Mas dependendo do patamar de negócios que a Visa Vale atingir - a previsão é aumentar o faturamento em 40% este ano -, Souza pode rever essa estratégia. "Para o banco de dados, por exemplo, estamos consultando a Oracle. A intenção é entender se é mais vantajoso ter as licenças e pagar como serviço", afirma Souza.

Software como serviço vai pegar?

Das diversas modalidades de compra de software, a nova onda é o software-as-a-service (Saas). De acordo com o Gartner, trata-se do software mantido, entregue e gerenciado remotamente por um provedor, e pago por uso pelo cliente. Os analistas do instituto afirmam que esse modelo tem limitações. Funciona bem para ferramentas de uso final, como e-mail, e-learning, teleconferência, mensagens instantâneas e ferramentas de busca, mas tem pouco impacto nos aplicativos de negócio. A idéia do Saas não é nova, já foi praticada sob a denominação ASP (Application Service Provider). "No modelo ASP, os maiores interessados eram os integradores de serviço, que tinham a infra-estrutura para vender e precisavam de conteúdo para elevar o tíquete de host. Agora, os fabricantes de software é que estão de olho no software como serviço", diz Fabio Costa, presidente da consultoria IDC.

A Oracle prepara-se para oferecer em breve um modelo de serviço totalmente online para a linha Siebel. "Será parecido com o que faz a SalesForce.com", afirma o presidente da empresa, Silvio Genesini, referindo-se ao fornecedor de CRM virtual por assinatura online que é referência mundial em Saas.

Já a SAP tem uma postura bem mais conservadora. Embora lá fora ofereça o aplicativo de CRM sob demanda, pago por assinatura e com opção de serviço operado pela IBM, parceira nesse projeto, no Brasil o foco é a tradicional licença por usuário. "Não vejo demanda forte por parte dos clientes", diz José Ruy Antunes, presidente da SAP. Segundo Antunes, o único cliente brasileiro que adota um contrato alternativo é a construtora Camargo Corrêa, que adotou o módulo de RH do mySAP em parceria com a Accenture. "Se o cliente pedir, atenderemos, mas não acredito que pagamento por uso seja uma tendência de mercado", afirma Antunes.

O multicore pode ser fator de pressão?

O surgimento de servidores com mais de um núcleo não pode ser descartado na negociação de software. O CIO que tem nas mãos licenças cobradas por CPU ou processador deve ficar atento ao movimento dos fornecedores quanto ao dualcore (dois núcleos) ou multicore (mais núcleos). Não há ainda no mercado um modelo predominante. A Microsoft cobra dual core como se fosse um único núcleo, ao passo que a IBM fatura uma licença por cada core. A BEA Systems, por sua vez, oferece uma tabela progressiva, com um adicional de 25% ao preço a partir do terceiro núcleo. "É uma forma de incentivo para o cliente elevar sua capacidade", afirma Marcos Pupo, gerente-geral da BEA. Julie Giera, consultora do Forrester, aconselha o CIO a traçar esses comparativos e a usar a informação da concorrência a seu favor na hora de renegociar as licenças para núcleos múltiplos, ainda que não tenha se decidido pela compra dos novos equipamentos.

Mudou de idéia? Como trocar o modelo

O que fazer se o aluguel do serviço não der conta da demanda? E se depois de reduzido o parque de servidores for constatada sobra de licenças? Como trazer o banco de dados de volta antes dos três anos acordados? "Os CIOs estão receosos de assinar contratos, por achar que amanhã pode surgir uma opção mais vantajosa", diz Julie Giera, do Forrester. Mas o fornecedor está encrencado se não começar a fazer concessões. Assim, é bom pensar em definir no contrato cláusulas de rompimento (termination fee) e transferência de serviços. "Essa discussão gera transparência", afirma Gilson Sanches, diretor de serviços financeiros da EDS, com a experiência de quem já foi CIO da Credicard. Segundo Sanches, quanto mais longo o prazo do contrato, menor o risco e o valor da penalidade. Os fornecedores sabem que seus clientes estão sendo assediados pela concorrência com alternativas atraentes. A fase atual, portanto, é de experimentação, por isso nem fornecedor nem CIO conseguem afirmar qual será o modelo vencedor. A única certeza é que haverá muita discussão. E o nome do jogo é flexibilidade e redução de custos.

CARDÁPIO VASTO

AS VÁRIAS MANEIRAS DE COMPRAR SOFTWARE

  • Licença por usuário
  • Licença por CPU (ou processador)
  • Licença por faturamento da empresa
  • Licença por métrica setorial (leitos de um hospital)
  • Aluguel sem licença
  • Aluguel + infra-estrutura
  • Pagamento por suporte/manutenção/upgrade
  • Outsourcing com taxa fixa
  • Outsourcing com taxa variável (por transação, por volume)
  • Cartão pré-pago

INICIAR + FORMATAR + CONTRATO

OS PRIMEIROS PASSOS PARA A ESTRATÉGIA DE SOFTWARE

1. Separe os aplicativos
Defina quais são os softwares básicos e os operacionais que todo o mercado usa. Em outro grupo, relacione as ferramentas que compõem o diferencial competitivo.

2. Avalie os custos
No grupo de aplicativos-padrão ou comuns ao setor, a modalidade aluguel ou serviço permite economia. O software talhado para o negócio da companhia requer capital e tempo. Nesse caso, o pagamento de licença garante a amortização do investimento ao longo dos anos e a atualização tecnológica.

3. Pense no futuro
Com que freqüência o software será atualizado? O número de usuários deve crescer nos próximos meses? A companhia deve passar por fusão ou aquisição? Essas respostas servem para balizar um plano de atualização, manutenção e suporte do software. Se nada mudar em quatro anos, espere acabar o contrato para fazer o upgrade. Se a cada ano ou semestre a empresa tiver de rever sua estratégia de TI, exija atualização automática do software ou do serviço.

4. Considere o dual core
Separe os aplicativos entre os que pagam licença e os que são por aluguel. Coloque os do primeiro grupo em servidores de núcleo simples, para evitar cobrança extra caso queira adotar equipamentos dual ou multicore.

 

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