A estratégia anti-Amazon do Google para o e-commerce
Google quer se apresentar como uma opção mais barata para vendedores independentes, facilitando resultados nas buscas e nas vendas online. Vai funcionar?
Thiago Lavado
Publicado em 25 de abril de 2021 às 08h30.
O Google tentou copiar o manual da Amazon para se tornar o centro de compras da internet, com pouco sucesso. Agora, está tentando algo diferente: uma estratégia anti-Amazon.
O Google quer se apresentar como uma opção mais barata e menos restritiva para vendedores independentes. Seu foco é levar o tráfego para sites de vendedores, e não vender uma versão própria de produtos como faz a Amazon.
No último ano, o Google eliminou as taxas dos comerciantes e permitiu que os vendedores oferecessem seus produtos gratuitamente em seus resultados de busca. Além disso, está tentando facilitar o upload de produtos para pequenas lojas independentes, para que estes apareçam nos resultados de busca, e simplificar a compra de anúncios ao se unir ao Shopify, que alimenta lojas on-line de 1,7 milhão de comerciantes que vendem diretamente aos consumidores.
No entanto, como muitas das tentativas do Google durante as duas décadas em que compete com a Amazon, essa dá poucos sinais de estar funcionando. O Google não tem nada tão sedutor quanto os US$ 295 bilhões negociados pelo marketplace da Amazon em 2020. A quantidade de bens que as pessoas compram no Google é muito pequena em comparação – provavelmente cerca de US$ 1 bilhão, segundo Juozas Kaziukenas, fundador da empresa de pesquisa Marketplace Pulse.
A Amazon é quase um acessório na vida de muitos americanos. Usurpou do Google o ponto de partida para compras e se tornou igualmente essencial para os profissionais de marketing. O negócio global de publicidade da Amazon cresceu 30 por cento, para US$ 17,6 bilhões em 2020, ficando atrás apenas do Google e do Facebook nos Estados Unidos.
Contudo, como a pandemia forçou muitas lojas a vender on-line, surgiu uma nova brecha para o Google conquistar vendedores que preferem não acoplar seus negócios à Amazon.
Christina Stang, de 33 anos, abriu a Fritzy's Roller Skate Shop perto de Pacific Beach, em San Diego, na Califórnia, em março de 2020. Com o lockdown, resolveu montar uma loja on-line no Shopify.
E teve sorte. Estava com uma enorme oferta de patins quando a demanda aumentou, porque muitos vídeos de patinação se tornaram populares no TikTok durante a pandemia.
Stang vinculou sua conta do Shopify ao software de comércio do Google e começou a comprar os chamados anúncios de compras inteligentes. Trabalhando com um orçamento pré-determinado, os algoritmos do Google escolhem onde colocar anúncios e quais produtos apresentar. Ela contou que, em 2020, gastou US$ 1.800 nesses anúncios, que foram vistos 3,6 milhões de vezes e geraram US$ 247 mil em vendas.
Stang considerou vender seus produtos no marketplace da Amazon, mas temia que as taxas da Amazon diminuíssem ainda mais sua magra margem de lucro. Também gostou do fato de que o Google redirecionava as pessoas para seu site cuidadosamente montado, em vez de mantê-las na própria loja, como faz a Amazon. "Eu poderia vender na Amazon e não ganhar dinheiro real, mas ter uma presença on-line maior. Não me pareceu uma boa ideia."
Recentemente, no entanto, ela experimentou uma das desvantagens de ficar presa no meio da parceria entre o Google e o Shopify. Sua loja não consegue oferecer nenhum produto desde janeiro porque o Google suspendeu sua conta, alegando que seus custos de envio pareciam mais caros no Google do que em seu site do Shopify, mesmo não sendo diferentes.
O Shopify lhe informou que isso era um problema do Google. Os representantes de atendimento ao cliente recomendaram que Stang contratasse um web designer. Ela continua a trabalhar sem o Google, mas isso afetou sua experiência amplamente positiva. "Fui prejudicada. Sou um pequeno negócio e não tenho centenas ou milhares de dólares para resolver isso."
Os vendedores frequentemente reclamam das taxas da Amazon – que podem representar um quarto de cada venda, sem contar o custo da publicidade – e da pressão para gastar mais para ter sucesso. Os comerciantes da Amazon não têm uma relação direta com seus clientes, limitando sua capacidade de se comunicar com eles e gerar negócios futuros. E, como tudo está contido no mundo da Amazon, é mais difícil criar um visual único e expressar a identidade de uma marca como fazem as empresas nos próprios sites.
Todavia, desde 2002, quando começou um mecanismo de comparação de preços chamado Froogle, um confuso jogo de palavras com "frugal" que exigiu uma reformulação da marca cinco anos depois, o Google tem lutado para traçar uma visão coesa para sua experiência de compras.
Ele tentou desafiar diretamente a Amazon elaborando um serviço próprio de entrega no mesmo dia, mas cancelou o projeto quando os custos aumentaram. Tentou forjar parcerias com gigantes tradicionais do varejo, mas acabou vendo as alianças se desfazerem por falta de vendas. Construiu o próprio marketplace para facilitar a compra dos artigos encontrados no Google, mas não conseguiu acabar com o hábito que os consumidores têm de usar a Amazon.
No ano passado, o Google contratou Bill Ready, ex-diretor de operações do PayPal, para ocupar um novo cargo sênior e liderar uma revisão de sua estratégia de compras.
Na época de sua contratação, Sundar Pichai, executivo-chefe do Google, alertou os executivos seniores de que a nova abordagem poderia significar um recuo de curto prazo na receita publicitária, de acordo com duas pessoas familiarizadas com as conversas, que pediram anonimato porque não tinham permissão para discuti-las publicamente. Ele pediu às equipes que apoiassem a medida do e-commerce, porque era uma prioridade da empresa.
Quando a pandemia estimulou uma enorme demanda por compras on-line, o Google eliminou taxas, permitindo que os vendedores oferecessem produtos gratuitamente e rescindindo uma decisão de 2012 que permitia que apenas anunciantes exibissem mercadorias em seu site de compras.
Três meses depois da contratação de Ready, o Google divulgou que as ofertas apareceriam em seus principais resultados de pesquisa gratuitamente. Em seguida, afirmou que os clientes poderiam comprar produtos diretamente de comerciantes no Google sem comissões. Garantiu também que abriria sua plataforma para terceiros, como o Shopify e o PayPal, para que os vendedores pudessem continuar a usar suas ferramentas existentes para gerenciar estoques e pedidos e processar pagamentos.
A parceria com o Shopify foi especialmente significativa porque centenas de milhares de pequenas empresas se uniram à plataforma de software durante a pandemia.
Harley Finkelstein, presidente do Shopify, disse que a empresa estava desenvolvendo, com o Google, novas maneiras de os comerciantes venderem por meio dos serviços do site de buscas, adotando medidas como permitir que os clientes comprem itens diretamente no YouTube e mostrar no Google Maps os produtos oferecidos pelas lojas.
Ready estava na corda bamba em se tratando da Amazon, que é um grande comprador de anúncios no Google, mas deixou claro que acreditava que o domínio dela no e-commerce representava uma ameaça para outros comerciantes. "Ninguém quer viver em um mundo onde só há um lugar para comprar as coisas, e os varejistas não querem depender desse tipo de site", afirmou em uma entrevista.
O Google informou ter aumentado o número de lojas que aparecem em seus resultados em 80 por cento em 2020, com o crescimento mais significativo vindo de pequenas e médias empresas. E os varejistas existentes estão oferecendo mais produtos.
O que ainda não está claro é se o aumento do número de comerciantes e produtos no Google mudará os hábitos de compra on-line.
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