Logo da ICANN: segundo Valente, o modelo de gestão da internet está hoje submetido ao ICANN, que é "ligado ao Departamento de Estado norte-americano" (Andrew Cowie/AFP)
Da Redação
Publicado em 3 de setembro de 2013 às 16h16.
A Anatel defende, abertamente, uma mudança no modelo de gestão da internet entre os países como forma de assegurar maior seguranças das comunicações e equilibrar economicamente o tráfego internacional.
Segundo o conselheiro e vice-presidente da Anatel, Jarbas Valente, em apresentação à Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado para tratar do Marco Civil da internet, a questão da governança da internet vai hoje muito além da designação de domínios e endereços IP.
"A governança passa por proteção de dados, custos de interconexão entre redes e outros aspectos".
Segundo o conselheiro, o modelo de gestão da internet está hoje submetido ao ICANN, que é "ligado ao Departamento de Estado norte-americano". O conselheiro diz que a União Europeia é a única região que tem conseguido equilibrar esse modelo. "Mas hoje, tudo o que se precisa construir na internet precisa passar pelo governo dos EUA".
Ele lembra que o Brasil tem uma outra posição como Estado, defendida durante a última Conferência Mundial de Comunicação e Informação (WCIT) em Dubai, em 2012. "O debate é como isso deve evoluir. Se for um modelo de telecomunicações, seria um modelo aberto, discutido no âmbito da UIT. No modelo atual, fica difícil qualquer país se defender", lembrou Valente.
Para ele, o debate deve mais do que nunca "considerar a importância estratégica econômica, social e tecnológica comercial, além de aspectos relacionadas a segurança das aplicações da internet". Conforme o relato do conselheiro, a posição que o Brasil teve, antagônica à posição dos EUA e Europa, era justamente para assegurar a mudança desse modelo. "Queremos garantir que a internet tenha servidores-raiz no Brasil, pontos de troca de tráfego de nível 1 no nosso país, governança efetivamente multilateral".
Segundo Valente, a internet hoje tem problemas estruturais que decorrem do modelo de governança, o que levou a uma determinada topologia, gerando um desequilíbrio no trânsito IP, o que gera vulnerabilidades de segurança porque tudo passa pelos EUA. "Queremos fomentar rotas internacionais".
Vulnerabilidade
Questionado por este noticiário sobre a questão da vulnerabilidade dos equipamentos de telecomunicações, que ao obedecerem à legislação norte-americana CALEA permitiriam portas de acesso (backdoors) às comunicações brasileiras, Valente reconheceu que esse é um problema de difícil solução.
"É uma vulnerabilidade que é praticamente impossível de ser detectada. Não dá para analisar isso quando certifica um equipamento porque é uma questão do software, sobre o qual não conseguimos ter pleno controle. A solução para diminuir esse problema é rever a questão da governança, o que nos dará mais controle sobre o que acontece nas redes", diz ele
Neutralidade vs. rede
Valente também foi muito crítico à redação dada no Marco Civil em relação à questão da neutralidade. Segundo ele, pela primeira vez uma Lei definirá o que é internet, "e essa definição deixa claro que internet é inerente aos serviços de telecomunicações, pois engloba comunicação de dados".
Para o conselheiro, quando o Marco Civil escreve que é proibido "bloquear, monitorar, filtrar, analisar e fiscalizar" os dados, pode acabar criando dificuldades justamente para assegurar a neutralidade. "Não podemos falar apenas de apenas neutralidade de rede, mas neutralidade de dispositivo, neutralidade dos usuários, neutralidade das aplicações/serviços e conteúdos. Não tem como assegurar isso sem poder controlar a rede".
Para Valente, o projeto "deveria se abster de entrar em questões técnicas relacionadas a arquitetura, gestão, definição e operação da internet e suas redes de suporte".