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Por que manifestações políticas ganharam as Olimpíadas

Em resposta ao novo ativismo dos atletas, manifestações passaram a ser permitidas

Os atletas Tommie Smith e John Carlos nos Jogos Olímpicos de 1968: punhos cerrados em apoio aos Panteras Negras (Rich Clarkson / Rich Clarkson & Associates)

Os atletas Tommie Smith e John Carlos nos Jogos Olímpicos de 1968: punhos cerrados em apoio aos Panteras Negras (Rich Clarkson / Rich Clarkson & Associates)

Ivan Padilla

Ivan Padilla

Publicado em 15 de julho de 2021 às 05h09.

A regra é clara, como diria Arnaldo Cezar Coelho. Está lá no capítulo 50, anexo 2 da Carta Olímpica, um documento de normas adotadas pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) para os Jogos: “Nenhum tipo de manifestação ou propaganda política, religiosa ou racial é permitido em qualquer instalação olímpica, locais ou outras áreas”. Em um artigo recente publicado no jornal britânico The Guardian, o presidente do comitê, Thomas Bach, havia reforçado a orientação. “Os atletas personificam os valores de excelência, solidariedade e paz. Eles expressam essa inclusão e respeito mútuo também por serem politicamente neutros no campo de jogo e durante as cerimônias”, escreveu Bach.

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Segundo as diretrizes, os atletas olímpicos têm o direito de expressar opiniões, mas não durante as provas, em cerimônias de premiação e na Vila Olímpica. Eles não podem usar braçadeiras ou camisetas com mensagens políticas, fazer gestos que possam ter conotação política, como ajoe­lhar-se ou cruzar os punhos, ou desrespeitar algum protocolo de premiação, por exemplo. A punição seria a desqualificação do atleta ou da delegação. As manifestações podem acontecer nas coletivas de imprensa, nas reuniões de equipe e nas redes sociais dos competidores. No início de julho, uma revisão das regras passou a permitir a expressão dos atletas também nos locais das competições, desde que antes do início das provas. Na arena, pode. No pódio, não. 

A intenção da Regra 50 sempre foi delimitar o que é protesto e o que é expressão — e isso vinha gerando, vejam só, protestos. Em setembro do ano passado, Casey Wasserman, presidente do comitê dos Jogos de Los Angeles de 2028, enviou uma carta a Thomas Bach, presidente do COI, sugerindo mudança da medida. “Não acredito que o discurso antirracista seja um discurso político”, afirmou Wasserman. Um grupo de atletas americanos liderados por John Carlos, o velocista que ficou famoso por ter erguido o punho no pódio na Olimpíada de 1968, já pediu publicamente a abolição da norma. O chefe do Atletismo Mundial, Sebastian Coe, disse recentemente que o direito dos atletas olímpicos de fazer gestos de protesto político nos Jogos deve ser protegido.

A nova diretriz da Regra 50 aconteceu depois de uma consulta a 3.500 representantes de atletas. O receio dos organizadores é que se repitam em Tóquio cenas como a dos atletas Tommie Smith e John Carlos nos Jogos de 1968, de punhos levantados no pódio em apoio aos Panteras Negras, organização de apoio aos negros. Ou, mais recentemente, do craque Cristiano Ronaldo afastando uma garrafa de Coca-Cola, um dos patrocinadores da Eurocopa, em uma entrevista coletiva da competição. A repercussão foi enorme, por um simples motivo: Cristiano Ronaldo é a pessoa física com mais seguidores no Instagram no mundo. Na NBA, o brutal assassinato de George Floyd no ano passado gerou um sem-número de protestos por parte dos jogadores, de paralisação de partidas a uso de camisetas com a frase que não precisa de tradução “I can’t breathe”. Nos Jogos Pan-Americanos de 2019, o esgrimista americano Race Imboden se ajoelhou no pódio no momento da premiação em protesto pela desigualdade racial em seu país.

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O esgrimista americano Race Imboden nos Jogos Pan-Americanos de 2019: contra a desigualdade racial (Leonardo Fernandez/Getty Images)

O mesmo gesto, e pelo mesmo motivo, havia sido feito por Colin Kaepernick, quarterback do San Francisco 49ers, cinco anos atrás. O ato virou mote de uma célebre campanha da Nike, em que uma foto do jogador em preto e branco era estampada com o slogan “Acredite em algo, mesmo que isso signifique sacrificar tudo”. A publicidade foi criticada por apoiadores do então presidente Donald Trump e levou à queda de ações da marca.

Aparentemente, a Nike não agradou a nenhum dos lados da história. Neste ano, a atleta Simone Biles deixou a marca, com quem tinha acordo comercial, para se tornar embaixadora da Athleta.­ Em entrevista ao The Wall Street Journal, Biles disse que o motivo foi o compromisso da nova patrocinadora com a diversidade. “Sinto que a Athleta está comprometida com a  diversidade e a inclusão de todas as mulheres, origens, idades, tamanhos, habilidades e raças”, afirmou.

 “Com a exposição nas redes sociais e o engajamento em causas sociais, os jogadores hoje são maiores do que seus clubes”, afirma Marcos Motta Mavi, sócio da Bichara e Motta Advogados, que tem clientes como Neymar, Thiago Silva e Comitê Olímpico Brasileiro. “Eu digo que hoje não se considera mais o ROI, o retorno sobre investimento, e sim o ROO, retorno sobre objetivo. Hoje as marcas têm procurado atletas com propósito.

Elas querem transferir e se associar a valores em que acreditam ou que estão em alta, isso em todos os segmentos. Os contratos são mais baseados em biografias, e não só em resultados.” É nesse contexto que acontece agora a 32a edição da maior celebração do esporte.  

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