Revista Exame

Um começo promissor para o Supercade

Em pouco mais de dois meses, o Supercade vence o ceticismo e estreia aprovando aquisições de empresas em tempo recorde. A economia brasileira agradece

Vinicius Carvalho, presidente do Cade: mais tempo para o combate a casos de formação de cartel (Cristiano Mariz/EXAME.com)

Vinicius Carvalho, presidente do Cade: mais tempo para o combate a casos de formação de cartel (Cristiano Mariz/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 8 de setembro de 2012 às 06h00.

São Paulo - Nascida há 25 anos em Alagoas, a Companhia Brasileira de Açúcar e Álcool (CBAA) entrou em processo de recuperação judicial em 2009. Foi a saída encontrada por seu controlador, o grupo José Pessoa, para quitar débitos de mais de 270 milhões de reais.

Como parte do processo de recuperação, a companhia vendeu para a Canabrava Bioenergia, de Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, seu parque industrial de processamento de cana e produção de açúcar e etanol localizado na cidade. A transação foi notificada ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no dia 17 de julho.

Depois de 12 dias (ou nove dias úteis), a operação foi aprovada pelo Cade, o xerife da concorrência no país. Com o aval, a CBAA seguirá seu processo de recuperação, a Canabrava poderá ampliar suas atividades e a economia brasileira celebra o possível sucesso da repaginação das regras que garantem a concorrência entre empresas no país.

O negócio entre CBAA e Canabrava é um marco dos novos tempos na defesa do mercado sem concentração excessiva. Aprovada em tempo recorde, essa operação é a que mais rapidamente recebeu o aval do Cade desde que, em 20 de junho, o órgão, com novas incumbências, se transformou em “Supercade”.

“Esse prazo é excelente, mesmo se comparado ao desempenho das autoridades antitruste dos Estados Unidos e da Europa”, diz Aurélio Marchini Santos, sócio da banca paulistana Cascione, Pulino, Boulos & Santos, que assessorou as empresas na operação.

A lei que regia fusões e aquisições entre empresas era considerada um exemplar típico dos monstrengos que povoam o arcabouço legal brasileiro. Em vez de apenas um órgão antitruste, o Brasil tinha, na prática, três: além do Cade, havia a Secretaria de Direito Econômico, ligada ao Ministério da Justiça, e a Secretaria de Acompanhamento Econômico, subordinada ao Ministério da Fazenda.

Por causa disso, operações simples, como a realizada entre CBAA e Canabrava, podiam ter de esperar meses em vez de nove dias úteis. Desde 20 de junho, o Cade passou a concentrar as tarefas antes distribuídas entre os três órgãos.

Resultado: das 31 operações notificadas nesses pouco mais de dois meses desde a mudança da lei, 12 já foram aprovadas, como um acordo entre a ADM, uma das maiores empresas de agronegócios do mundo, e a Pará Pigmentos, que repassou à gigante americana uma operação portuária no terminal de Vila do Conde.

O tempo médio de espera pelo julgamento foi de 17 dias. No exterior, aprovações em até 30 dias são consideradas um ótimo desempenho. O que o Cade conseguiu até agora, como se vê, seria louvável mesmo em economias mais desenvolvidas.

Além de concentrar os poderes de três órgãos antitruste em um só, o novo Cade adotou a análise prévia das operações. Nesse modelo, a compra de uma empresa por outra só estará concluída depois da permissão do órgão. É um modelo consagrado no mundo todo, mas que ainda não tinha sido adotado no Brasil — o que atrapalhava os negócios e, por extensão, prejudicava a economia brasileira.


Aqui, as empresas selavam o negócio entre si, mas ele podia ser contestado indefinidamente. É por isso que até hoje a compra da Garoto pela Nestlé não está sacramentada. Em fevereiro, a aquisição completou dez anos — e não há perspectiva de que o martelo seja batido definitivamente.

“Adotamos o modelo de triagem de operações, o mesmo utilizado nos Estados Unidos. Só as mais complexas vão a julgamento”, diz Carlos Ragazzo, superintendente-geral do Cade. A criação da superintendência-geral está diretamente ligada à maior velocidade nas aprovações.

É ela que avalia as operações mais simples, nas quais o risco de surgir um monopólio é nulo ou mínimo. Se a operação de fato não representar risco à competição, a própria superintendência a aprova. Não há, portanto, necessidade de o caso ir a julgamento no tribunal do Cade.

Para o tribunal, formado pelo presidente e seis conselheiros, agora seguem apenas operações mais complexas. No ano passado, das 716 operações de fusão e aquisição apresentadas ao Cade, 600 — ou 84% do total — eram simples.

Teriam sido 600 operações a menos a travar a pauta de julgamentos do Cade se as regras atuais já estivessem valendo. “Agora o conselho pode se dedicar mais a casos de cartel. Será a nossa prioridade”, diz Vinicius Carvalho, presidente do Cade.

A mudança no Cade foi recebida com desconfiança na iniciativa privada. A unificação dos órgãos era bem-vinda, mas havia temor quanto à viabilidade de uma transição tão profunda ser feita com um raquítico quadro de 315 funcionários, sendo apenas 78 técnicos. No Cade, cada técnico analisa, em média, 11 operações complexas por ano; nos Estados Unidos, a média é de um caso mais complicado por técnico.

E havia um agravante: o órgão mudou de prédio-sede, em Brasília, na mesma semana da transição da lei. Por alguns dias, os técnicos analisaram operações em casa, já que o novo prédio ainda estava sem internet e telefone. Não por acaso, a fila para a notificação de novas operações cresceu muito nos dias que antecederam a mudança — foram 140 em duas semanas, volume cinco vezes maior que o normal.

Dessas, 113 já foram julgadas ou têm parecer para julgamento. O novo Cade ainda precisa passar pelo teste de uma operação complexa. Mas é inegável que a largada foi promissora. A economia brasileira torce para que continue assim — com menos burocracia, mais velocidade e a atenção do órgão voltada para o que realmente importa: a defesa da concorrência.

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