Revista Exame

Transição com equilíbrio

O Brasil desponta como uma potência em energia renovável, mas a transição para uma economia de baixo carbono é um processo gradual — no qual o petróleo e o gás ainda têm um papel relevante

Plataforma de petróleo na Baía da Guanabara: investimentos na produção de energia podem somar 489 bilhões de dólares até 2032 (Dado Galdieri/Bloomberg/Getty Images)

Plataforma de petróleo na Baía da Guanabara: investimentos na produção de energia podem somar 489 bilhões de dólares até 2032 (Dado Galdieri/Bloomberg/Getty Images)

Luciano Pádua
Luciano Pádua

Editor de Macroeconomia

Publicado em 10 de novembro de 2023 às 06h00.

Última atualização em 13 de novembro de 2023 às 14h15.

O Brasil se destaca como um dos líderes em energia limpa no planeta. Em 2022, a participação de fontes renováveis na matriz energética do país chegou a 47,4%, de acordo com os dados do mais recente “Balanço Energético Nacional”, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Em comparação, a média global de renováveis na matriz energética é de 14,1%, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE). Quando se consideram somente as fontes de energia usadas na geração de eletricidade, a vantagem do país salta ainda mais aos olhos: a energia limpa representa 87,9% da matriz elétrica brasileira, ante a média de 26,6% no mundo.

Atributos não faltam para tornar o país uma potência global em energia renovável e liderar os esforços para reduzir as emissões de gases de efeito estufa que causam as mudanças climáticas. O país tem grande quantidade de recursos naturais renováveis, como energia solar, eólica, hidrelétrica e biomassa, e apresenta condições para ocupar posição de destaque também nas novas fronteiras de geração de energia limpa, como a produção de hidrogênio verde, obtido a partir da eletrólise da água. “No setor de energia, podemos afirmar que somos um grande caso de sucesso, dada a amplitude de players internacionais presentes no Brasil, tanto em petróleo e gás quanto em energias renováveis”, diz Ana Paula Repezza, diretora de Negócios da ApexBrasil. “O interesse pelo país está em alta e precisamos aproveitar essa oportunidade de ser líderes globais na transição energética.”

Investimentos puxados pela demanda

No segundo trimestre de 2023, o consumo de eletricidade no Brasil cresceu 3,4% em relação ao mesmo trimestre de 2022 — acompanhando a expansão do PIB, que também avançou 3,4% no mesmo período. De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE), planejamento do Ministério de Minas e Energia que traça o cenário para o setor nos próximos dez anos, o consumo de energia elétrica poderá crescer 3,4% ao ano entre 2022 e 2032. Para sustentar essa expansão, os investimentos previstos nas atividades de exploração e produção de energia no Brasil podem chegar a 489 bilhões de dólares até 2032. Mais investimentos, de acordo com Ana Paula, vão permitir baratear o custo da energia, ampliar a competitividade das empresas, criar emprego e renda, promover o desenvolvimento regional e gerar royalties e receitas para o país, estados e municípios. No setor de energia, extremamente globalizado, é fundamental que as regras sejam claras e estáveis, que haja a previsibilidade de contratos e um ambiente de negócios favorável ao reinvestimento.

Petróleo e Gás

Ao mesmo tempo que avança rumo a uma matriz com crescente participação de fontes renováveis, o Brasil não pode perder de vista que a transição energética não é um processo que acontece da noite para o dia. Ela requer tempo e investimento para desenvolver infraestrutura, tecnologia e capacidade de produção para atender a uma demanda crescente. Nesse cenário, explorar as fontes não renováveis tradicionais é um caminho estratégico para o país suprir a crescente demanda de energia enquanto desenvolve alternativas limpas.

“É importante frisar que o processo de transição energética não exclui a necessidade de o mundo continuar utilizando o petróleo e o gás. Um mundo descarbonizado não é um mundo sem hidrocarbonetos”, afirma Roberto Ardenghy, presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP). Ele observa que, como as diversas estimativas apontam que a demanda por óleo e gás continuará crescente por pelo menos uma década, é fundamental manter a produção e a descoberta de novas fronteiras petrolíferas — não apenas para a indústria de óleo e gás mas também para a economia brasileira e para que a transição energética seja justa e inclusiva, sem deixar ninguém para trás. “Enxergamos a transição como um processo em que todas as fontes conviverão, garantindo a energia de que o mundo precisa”, diz Ardenghy.

Atualmente, o Brasil é o nono maior produtor e o oitavo maior exportador de petróleo e derivados do mundo, com receita superior a 56 bilhões de dólares em 2022. Tem potencial para muito mais. “As projeções da ANP, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, apontam que, mantidos os planos de investimentos no setor pelas operadoras já presentes no país, especialmente a Petrobras, o Brasil ocupará a quinta posição entre os principais produtores mundiais de petróleo até o final da década”, ressalta Ana Paula, da ApexBrasil. “Esse é um setor que representa cerca de 12% do PIB industrial do país, desenvolvendo tecnologias de ponta, gerando empregos e renda de qualidade e garantindo o suprimento de energia para o crescimento da economia.”

Sol e vento prósperos

Paralelamente aos investimentos em fontes tradicionais, o Brasil tem avançado na diversificação de sua matriz energética. Um dos destaques é a energia eólica, que encerrou 2022 com um parque de  904 usinas e uma capacidade de 25,3 gigawatts (GW), um crescimento de 18,9% em relação a 2021. O país tornou-se o terceiro maior instalador de turbinas eólicas no mundo, abastecendo cerca de 124 milhões de pessoas. A energia solar também avançou, com uma capacidade de 34 GW, o correspondente a 15,4% da matriz elétrica. Projeções indicam que, até 2050, a energia solar ultrapassará a capacidade instalada da hidreletricidade no país. Vale mencionar também a biomassa, proveniente sobretudo da produção do etanol de cana e milho. É uma fonte que apresenta grande potencial de expansão no país, graças à diversidade de culturas agrícolas e à abundância de matéria orgânica que pode ser utilizada na geração de bioenergia.

A fronteira do hidrogênio verde

Outra alternativa que vem ganhando espaço na busca por uma matriz energética mais limpa e sustentável é o hidrogênio verde, também conhecido como H2V. Diversos países, especialmente na Europa, têm investido em projetos nessa fonte de energia. No Brasil, há expectativas de investimentos significativos nessa área, com projeções indicando uma demanda de 2,8 milhões de toneladas anuais de H2V até 2040. No entanto, a indústria do hidrogênio verde enfrenta diversos desafios tecnológicos, de regulamentação e de mercado, que exigem atenção. A seguir, o leitor encontrará matérias que exploram os temas aqui expostos.

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