Revista Exame

"Temos obrigação de crescer", diz presidente do Santander

Quarto presidente do Santander no Brasil em oito anos, o carioca Sérgio Rial assumiu o cargo com o desafio de ganhar mercado sem fazer grandes aquisições


	Sergio Rial: o ano de 2016 será decisivo para determinar a duração da crise
 (Germano Luders/Exame)

Sergio Rial: o ano de 2016 será decisivo para determinar a duração da crise (Germano Luders/Exame)

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Da Redação

Publicado em 19 de janeiro de 2016 às 04h52.

São Paulo — Após gastar 40 bilhões de dólares nas últimas duas décadas para comprar uma série de concorrentes no Brasil — entre eles o Banespa e o Real —, o banco espanhol Santander parecia ter apetite para se tornar líder do mercado local.

Mas, quase nove anos depois da compra do Real, só conseguiu chegar à terceira posição entre os bancos privados, muito atrás de Itaú, que é quase duas vezes maior, e Bradesco, que tirou o banco espanhol da jogada e comprou o HSBC no ano passado.

A derrota na disputa pelo HSBC tirou do Santander qualquer chance de brigar de fato pela liderança no curto prazo: hoje, não há alvos de aquisição no mercado brasileiro grandes o bastante para encurtar a distância. Definir qual será a cara do Santander no Brasil é a missão do carioca Sérgio Rial, que assumiu a presidência do banco em janeiro.

Filho de espanhóis, Rial não tem o perfil típico do cargo — ele até foi executivo de bancos no Brasil e no exterior nas décadas de 80 e 90, mas se destacou mesmo na indústria. Fez carreira meteórica na gigante de alimentos americana Cargill e reestruturou o frigorífico Marfrig. Chegou ao Santander em março de 2015, como presidente do conselho de administração.

Em sua primeira entrevista, Rial diz a EXAME que não pretende fazer revoluções, mas que o banco tem a “obrigação de crescer e ganhar participação de mercado”.

Exame – Sua escolha para presidir o Santander foi atípica. O senhor chegou para mudar o banco?

Rial – O setor financeiro está passando por uma transformação e é necessário mudar a gestão. Aquela imagem do banqueiro tradicional, que faz a carreira toda no setor, não tem de ser a norma. Mas o Santander não precisa de uma revolução. Está na fase de consolidar o que já funciona. A obrigação é ser uma alternativa ao consumidor, que quer bons serviços, consistência e qualidade.

Há alguns anos, éramos o banco com mais reclamações no Banco Central. Hoje, estamos melhor do que nossos principais concorrentes. Logo após a abertura de capital, o banco era criticado pelos resultados. Os anos de 2014 e 2015 foram de reversão. O valor de nossas ações reflete isso: elas tiveram o melhor desempenho do setor bancário no ano passado (a alta foi de 28%).

Exame – As ações do Santander são pouco negociadas. O desempenho reflete os resultados do banco?

Rial – Quando os resultados eram piores, o desempenho das ações era visto como consequência disso. Agora que estamos bem a bolsa não explica nada? Não me parece coerente. O preço das ações é um sinal do que está acontecendo e do que poderá acontecer.

Vim para acelerar uma operação com tamanho suficiente para ter um papel relevante no Brasil. O Santander não é grande demais nem está envolvido num processo de integração com outro banco, o que nos permite pensar em agilidade. Não tenho medo do maior concorrente, mas sim do mais veloz.

Exame – Escala faz diferença no mercado bancário e, no passado, o Santander dizia querer ser o maior banco privado do país. O plano mudou?

Rial – Não. Investimos mais de 40 bilhões de dólares em aquisições no Brasil e temos 10% de participação de mercado. No segmento de cartões, temos 13%. No imobiliário, entre 12% e 13%.

E somos líderes em financiamento de veículos. A análise da escala precisa ter outro nível de sofisticação. Num mundo mais digital, o número de agências, clientes e ativos é o que realmente faz diferença? Ou temos de buscar uma base de clientes leal? Ter uma participação de mercado de um dígito no Brasil é complicado porque torna difícil crescer e ser competitivo em custos.

Passamos dessa marca. Quando surgiu a oportunidade de comprar o HSBC, que tem 1,8% do mercado, nos perguntamos se essa fatia era fundamental. Era importante a um determinado preço, tanto é que fomos até o fim do processo de venda. Não temos uma meta de atingir determinado percentual de participação, mas temos obrigação de crescer e ganhar mercado.

Exame – Como o Santander vai fazer isso, agora que não há mais grandes aquisições a fazer?

Rial – O Santander tem características singulares e o desafio é fazer o cliente ver valor nisso. A principal é o fato de ser o único banco internacional com presença no Brasil, e isso vai fazer di­ferença para os clientes. Encerramos o ciclo que mexeu com a pirâmide de renda do país e impulsionou o mercado interno.

Agora, para crescer, as em­presas, mesmo as de médio porte, terão de vender para outros países e podemos apoiá-las. Também queremos atuar mais no agronegócio. Vamos abrir agências no Centro-Oeste, onde os bancos privados têm presença tímida. Queremos fortalecer a imagem de banco de negócios.

Quando o juro pago pelos títulos públicos é alto, como acontece no Brasil, o incentivo que os bancos têm para efetivamente ajudar as empresas a prosperar é menor. Não devemos simplesmente aplicar pou­pança em títulos do governo. Esse é o papel dos fundos de investimento.

Exame – A rentabilidade de Bradesco e Itaú é maior do que a do Santander. Por quê?

Rial – Essa foi a primeira pergunta que fiz quando entrei no banco. A resposta é que a composição das receitas é diferente. Boa parte da rentabilidade dos concorrentes vem de empresas que processam operações com cartões, que têm margens altíssimas, do setor de seguros e da gestão de recursos.

Vendemos 50% de nossa gestora, mas estamos investindo em seguros e em nossa empresa de cartões, a GetNet. Nossa rentabilidade vai se aproximar da dos concorrentes. Mas, acima de tudo, queremos que o negócio bancário seja bem gerido e rentável.

Exame – O senhor passou uma década na indústria, onde a margem de lucro é menor. O setor financeiro tem algo a aprender com outros setores?

Rial – A margem da Cargill, que faturava 140 bilhões de dólares na minha época, era de 2%. A Marfrig nem margem tinha... Em empresas assim, controlar custos é uma questão de sobrevivência. No setor financeiro, não faz parte da cultura perguntar quanto as coisas custam.

Costumo dizer que temos de tirar o sofá de veludo da sala. Já iniciamos um trabalho de redução de despesas. O custo do dissídio para o sistema financeiro vai ficar em torno de 10,8% ao ano, incluindo os benefícios. Temos o compromisso de crescer nossos custos em, no máximo, 6%.

Exame – Como o banco está se preparando para a crise?

Rial – A preparação começou há dois anos, e isso explica o bom resultado em 2014 e 2015. Criamos um grupo para facilitar o refinanciamento das dívidas dos clientes. Também sugerimos ao Banco Central que parte dos depósitos compulsórios seja usada para financiar determinadas indústrias.

Não precisamos de subsídios. Há recursos represados no BC que podem facilitar essa caminhada no deserto. Mas é difícil saber quanto tempo a crise vai durar. O ano de 2016 dará essa dimensão.

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