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Aché está sem remédio para crescer

O paulista Aché é o único entre os maiores laboratórios do país a encolher no mercado de genéricos — e está cada vez mais distante da liderança do setor

Laboratório do Aché, em São Paulo: 120 milhões de reais para acelerar o desenvolvimento de novos produtos  (Lailson Santos/EXAME.com)

Laboratório do Aché, em São Paulo: 120 milhões de reais para acelerar o desenvolvimento de novos produtos (Lailson Santos/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 29 de março de 2011 às 06h00.

Uma série de recordes marcou o ano de 2010 como um dos mais intensos da história para a indústria farmacêutica brasileira. Com vendas de 36 bilhões de reais, o setor cresceu 20% em relação ao ano anterior — a maior taxa registrada em uma década.

Além do embalo da expansão do consumo, os laboratórios se valeram do fim das patentes e do lançamento de genéricos de alguns dos produtos mais bem-sucedidos da indústria farmacêutica mundial: o Lipitor, para tratamento de colesterol, e o Viagra, para disfunção erétil, ambos da americana Pfizer — respectivamente, o quinto e o 11o medicamentos mais vendidos no país.

Num cenário em que todos cresceram rapidamente, o paulista Aché, quarto maior do setor, aparece como uma exceção. O laboratório é o único entre os cinco maiores do país a perder participação no próspero mercado de genéricos, no qual ingressou em 2005, com a compra da Biosintética, na época a terceira maior fabricante de medicamentos desse tipo no país.

No ano passado, as vendas de genéricos cresceram 38%. As do Aché, no segmento, caíram 3%. “Colocamos o pé no freio para preservar a rentabilidade”, diz José Ricardo Mendes da Silva, presidente da empresa. Em termos estritamente financeiros, a estratégia funcionou. Em 2010, o faturamento do Aché cresceu 6%, atingindo 2,2 bilhões de reais — um quinto disso vindo da venda de medicamentos genéricos. Mas o lucro foi 20% superior. 

O pé no freio mencionado por Mendes ficou evidente na pequena lista de lançamentos do laboratório. Em 2010, o Aché obteve apenas 24 registros de novos medicamentos na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A atual líder de mercado, a EMS, do empresário paulista Carlos Sanchez, fez um número cinco vezes maior de lançamentos — foram 119 novos medicamentos colocados nas farmácias.

Sem novos produtos num mercado ávido por novidades, o Aché, maior companhia do setor até 2006, caiu da terceira para a quarta posição no ano passado, atrás de Medley, EMS e Sanofi-Aventis. “O Aché não acompanhou o ritmo de desenvolvimento dos concorrentes e ficou para trás”, diz Lourival Stange, consultor da área farmacêutica.


O retrato atual da empresa reflete em boa parte uma recente trajetória de tentativas, acertos e erros. Ao longo da última década, enquanto seus principais concorrentes se voltavam para o mercado de genéricos, o Aché testava diferentes fórmulas para crescer.

Criado em 1966 por Adalmiro Dellape Baptista, Antonio Depieri e Victor Siaulys, o laboratório nasceu copiando os produtos de sucesso dos concorrentes estrangeiros — com os chamados medicamentos similares —, que ainda hoje representam 70% de suas receitas.

A mudança drástica nas feições do mercado brasileiro com a chegada dos genéricos, em 1999, desencadeou uma longa disputa entre os sócios em torno da escolha de uma nova rota de crescimento — um impasse que praticamente paralisou a companhia por cinco anos. (Hoje, dos três sócios originais, apenas Baptista está vivo

. Aos 76 anos, ele preside o conselho de administração.) Em 2003, com os ânimos apaziguados, os executivos do Aché elegeram um novo foco de investimentos: os fitoterápicos. Naquela ocasião, anunciaram que o anti-inflamatório Acheflan, primeiro medicamento fitoterápico da companhia, deveria atingir um faturamento de 90 milhões de reais em três anos.

Hoje, porém, as vendas do produto representam pouco mais de um quarto do inicialmente planejado. Apenas em 2005 a companhia passou a produzir genéricos e anunciou que seu objetivo era aumentar sua participação no segmento — na época, de 12% — nos anos seguintes. Mas havia uma forte concorrência no caminho. E hoje a participação do Aché no setor de genéricos é de apenas 6%.

Tática de guerrilha

Uma das explicações para a queda seria a demora da empresa em aceitar a tática de guerrilha que rege o segmento. Só no início do ano passado, por exemplo, o Aché passou a reembolsar as farmácias, na forma de crédito para novas compras, pelos medicamentos cujo prazo de validade expire nas prateleiras. Os concorrentes faziam isso há anos.


Foi também só recentemente que 100 representantes do laboratório passaram a visitar as lojas das principais redes de drogarias para promover seus remédios junto aos balconistas — uma prática corriqueira no setor. “Depois dos genéricos, o poder saiu do consultório do médico para o balcão das farmácias”, diz um empresário do varejo farmacêutico.

Do mesmo modo, o Aché resistiu a aderir à política de descontos dominante no mercado de genéricos. Alguns laboratórios oferecem às redes de farmácias até 90% de desconto nesse tipo de medicamento — quase o triplo do que o Aché tradicionalmente concedia. Hoje, os descontos da empresa chegam a até 75%. Segundo executivos do mercado, o Aché perdeu a chance de ganhar traquejo mais rapidamente nesse mercado ao integrar a estrutura da Biosintética à sua própria.

A francesa Sanofi-Aventis, por exemplo, adquiriu a empresa brasileira de genéricos Medley em 2009 e a manteve como uma estrutura separada. Para não depender apenas do mercado ultracompetitivo dos genéricos, os executivos do Aché planejam rejuvenescer o portfólio com medicamentos de marca. Há 143 projetos em andamento, dos quais apenas 53 são de genéricos.

O investimento em desenvolvimento foi dobrado para 43 milhões de reais — e  outros 80 milhões devem ser aplicados em pesquisa nos próximos dois anos. O plano é lançar 50 produtos apenas em 2011. “Devemos crescer 40% com novos medicamentos de marca até 2012”, afirma Mendes, que  deve liderar o processo de abertura de capital até o fim deste ano. “Vamos apresentar aos investidores uma empresa de marca e pesquisa, com crescimento de faturamento e de margem.”

Além de fortalecer o caixa para investimentos em pesquisa, a estreia na bolsa poderá dar fôlego para aquisições. No radar, segundo Mendes, estão empresas com capacidade de inovação e pesquisa ou especializadas em áreas como oncologia. “O grande desafio será encontrar bons ativos à venda”, diz o consultor Stange. “Quase todos já foram comprados.”

Antes de enfrentar esse problema, porém, os executivos terão de ter capital nas mãos — e para isso será crucial mostrar aos investidores que a empresa pode, sim, voltar a crescer.

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