A apresentadora Oprah Winfrey: ela deve aparecer menos na nova emissora (Katy Winn/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 24 de janeiro de 2013 às 10h26.
Há mais de duas décadas a americana Oprah Winfrey tem um lugar cativo entre as personalidades mais influentes do mundo. Nesse período, a apresentadora do talk show mais famoso da história dos Estados Unidos - The Oprah Winfrey Show - fez e desfez produtos e reputações - e, dizem as más línguas, até elegeu um presidente da República em outubro de 2008. (Após dar seu apoio público a Barack Obama, a procura por referências ao então candidato na internet saltou 358% de um dia para o outro.) Seu programa alcança uma audiência semanal de 44 milhões de pessoas e é distribuído a emissoras em 145 países. Por tudo isso, é fácil entender por que anunciantes como Clinique, Pfizer, Disney e Kellogg fazem fila para aparecer em seu programa. Agora, Oprah está prestes a dar início a uma nova corrida - desta vez, na TV paga. No final de abril, a Procter&Gamble, maior anunciante do mundo, assinou um contrato de publicidade de aproximadamente 100 milhões de dólares com a Oprah Winfrey Networks (OWN), emissora de TV a cabo criada pela Harpo, empresa de Oprah, em parceria com a Discovery Communications. O contrato de patrocínio precede em quase um ano a estreia do canal, marcada para janeiro de 2011. Semanas depois, a rede de lojas de departamentos Kohl's assinou outro contrato, por um valor não revelado. A empresa vai patrocinar um reality show cujo objetivo é encontrar um apresentador para um dos programas da OWN. "Os grandes anunciantes costumam seguir os passos da Procter&Gamble", disse Larry Woodard, presidente da Graham Stanley Advertising, à rede americana ABC.
Tão logo Oprah anunciou a criação de seu próprio canal na TV paga, em janeiro de 2008 - e o consequente abandono de seu popular talk show diário na TV aberta, previsto para setembro de 2011 -, não foram poucos os executivos de marketing e vendas que ficaram apreensivos. Afinal, ao longo dos últimos 24 anos, Oprah se converteu numa máquina capaz de vender qualquer tipo de produto: de sabonetes a carros de luxo. Algumas marcas fizeram extravagâncias apenas para aparecer por alguns segundos em seu programa. Foi o caso da General Motors, que em 2004 distribuiu 276 sedãs Pontiac G6 a cada um dos membros da plateia na estreia da 19a temporada do The Oprah Winfrey Show. Uma ação de marketing de 7 milhões de dólares. O problema é que grande parte desse fenômeno midiático esteve - e ainda está - atrelada à figura carismática de uma mulher cuja ascensão meteórica de garota pobre no interior do Mississippi à apresentadora mais bem paga da TV americana ainda inspira pessoas em muitos países. "A presença da Oprah à frente das câmeras é fundamental para os anunciantes", diz Janice Peck, professora de estudos midiáticos da Universidade do Colorado e autora de um livro sobre a apresentadora. "É nisso que se baseia seu império de mídia."
Oprah será tão poderosa como mulher de negócios nos bastidores quanto é nos palcos? A resposta deve ser dada tão logo a OWN entre em operação. Especulase que ela aparecerá diante das câmeras três vezes por semana, no máximo. Sua maior concorrente na TV aberta, a comediante Ellen Degeneres, apresenta cinco programas semanais exibidos em canais como a NBC. O restante da grade da OWN será preenchido por documentários sobre personagens como o cineasta James Cameron e a popstar Lady Gaga, além de um reality show estrelado pela cantora country Shania Twain. "Encontrar anunciante para um único programa é relativamente fácil", diz Jonathan Taplin, da Universidade de Southern California. "Cooptar anúncios para um canal inteiro, 24 horas por dia, é uma tarefa bem mais complexa."
Para a Procter&Gamble, dona de uma verba publicitária anual na casa dos 2,5 bilhões de dólares, o patrocínio à OWN TV de Oprah é uma oportunidade única - e também um risco. Primeiro porque, como o canal ainda não estreou, não há nenhuma garantia de que os índices de audiência corresponderão à expectativa da empresa. Embora ainda conte com um dos maiores públicos da TV americana, o talk show de Oprah, hoje com 56 anos de idade, perdeu 30% de audiência na última década. Além disso, algumas atitudes recentes da apresentadora alertaram os anunciantes. Seu apoio irrestrito à candidatura de Barack Obama à Presidência dos Estados Unidos, em 2008, desempenhou um papel inegável na eleição do então senador, mas jogou contra a popularidade da apresentadora. Numa pesquisa realizada no início daquele ano pelo Harris Interactive com cerca de 2 000 americanos, Oprah foi eleita apenas a quarta maior personalidade da TV, caindo duas posições em relação a um já amargo segundo lugar em 2007. A primeira colocação do ranking só foi recuperada em janeiro deste ano, depois de uma série de entrevistas polêmicas ao longo de 2009, que incluíram a republicana Sarah Palin, a britânica Susan Boyle e a cantora Whitney Houston.
O segundo desafio enfrentado pela OWN TV - e, em última análise, pela pró pria Procter&Gamble - está no públi co-alvo da rede. Apesar de ter sido anunciada como um canal para toda a família, está claro que a maior parte dos programas será direcionada às mulheres, plateia cativa de Oprah na TV aberta - mas disputada a tapas no universo da TV paga. O segmento é hoje dominado por dois canais: o Oxygen Network, dono do reality show America's Next Top Model, e o Lifetime Entertainment, que veicula seriados como Desperate House wives. Além de disputar espaço com pro gra mas de moda, ginástica e dramas fa mi liares, Oprah terá de enfrentar a concorrência de nomes como o chef britânico Jamie Oliver, que estreou o polêmico programa Revolução na Comida na rede ABC em 26 de março. Nele, Oliver tenta fazer com que alguns americanos engulam goela abaixo uma espécie de extreme makeover em seu cardápio diário - principalmente trocando alimentos processados e cheios de gordura por opções mais saudáveis. Sua estreia foi vista por 7,5 milhões de americanos, a mais bemsucedida da história da TV até hoje.
Ao fechar um contrato de cifras astronômicas mesmo para os padrões americanos - um comercial de 30 segundos durante o cobiçado SuperBowl, o minuto mais caro da TV nos Estados Unidos, custa 3 milhões de dólares -, a Procter &Gamble tenta na realidade se proteger contra uma possível escalada de preços para seus anúncios, a exemplo do que aconteceu com a anglo-holandesa Unilever entre 2004 e 2008. Nesse período, a Unilever investiu quase 50 milhões de dólares para promover o sabonete Dove nas mídias controladas por Oprah - e foi seguida pelas concorrentes, que se viram obrigadas a despejar somas igualmente superlativas para promover suas marcas. A francesa L'Oréal investiu 49 milhões de dólares entre programas de TV e anúncios na revista O, parte do grupo de mídia de Oprah. A Johnson & Johnson, outros 71,5 milhões de dólares. A própria Procter&Gamble pagou 74,1 milhões para anunciar produtos das linhas Gillette e Wella. "Ao se antecipar aos concorrentes, a Procter consegue garantir preços menores para seus anúncios", diz o consultor Jack Myers, especializado em mídia. "Se Oprah conseguir repetir sua fórmula de sucesso na TV paga, o minuto de publicidade certamente será inflacionado." Na dúvida, a P&G decidiu pagar para ver.