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R$ 600 milhões para nada? Mercedes pode fechar fábrica em SP

A Mercedes-Benz pode fechar uma fábrica inaugurada há apenas um ano em São Paulo, segundo Philipp Schiemer, presidente da empresa no Brasil

Philipp Schiemer, da Mercedes: mudanças para retomar a liderança do mercado de caminhões (Germano Luders/Exame)

Philipp Schiemer, da Mercedes: mudanças para retomar a liderança do mercado de caminhões (Germano Luders/Exame)

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Naiara Bertão

Publicado em 6 de abril de 2017 às 05h55.

Última atualização em 6 de abril de 2017 às 05h55.

São Paulo — A montadora alemã Mercedes-Benz já pensa em fechar uma fábrica que inaugurou há pouco mais de um ano em Iracemápolis, no interior de São Paulo. O problema não é a recessão, mas a incerteza sobre o que vai acontecer com o programa de benefícios fiscais que levou a Mercedes a decidir montar a fábrica — a terceira no país e, hoje, a única que produz automóveis (as outras duas fazem caminhões e ônibus). O programa, que foi batizado de Inovar-Auto, estabeleceu cotas para a importação de veículos e deu incentivos a montadoras que passassem a produzir no país.

Foi anunciado em 2012, com prazo de validade até o fim deste ano — e executivos do setor temem que, se o governo não extinguir de vez os benefícios, deve pelo menos reduzi-los. Se ele terminar e não houver nenhuma contrapartida, a fábrica de Iracemápolis deixará de ser rentável e poderá ser fechada, segundo disse a EXAME o alemão Philipp Schiemer, presidente da Mercedes no Brasil desde 2013. A missão de Schiemer ao assumir o cargo era fazer a empresa retomar o primeiro lugar nas vendas de caminhões no Brasil, posição perdida para a MAN em 2012 — a Mercedes voltou a ser líder no ano passado. Foi uma vitória comemorada discretamente, já que as vendas de caminhões encolheram 30% em 2016.

Exame - A fábrica de automóveis da Mercedes foi inaugurada em plena recessão. O investimento fez sentido?

Philipp - Essa unidade fabrica cerca de 10 000 automóveis por ano, metade de sua capacidade. A crise reduziu a demanda, por isso não abrimos totalmente a unidade e, assim, controlamos os custos. Essa questão está resolvida. O maior problema, não apenas da Mercedes como também de outras montadoras que inauguraram fábricas para produzir automóveis premium, é o futuro do Inovar-Auto. As fábricas de carros de alto padrão surgiram no Brasil como consequência desse programa, que pode ser modificado ou mesmo extinto no fim do ano. Dependemos mais disso do que da economia, porque a crise vai passar e as vendas vão voltar a crescer.

Exame - A fábrica pode ser fechada?

Philipp - Sim, essa é uma possibilidade se a unidade deixar de ser rentável. É claro que seria ruim perder o investimento de 600 milhões de reais, mas não perderíamos o mercado, porque os carros continuarão a ser vendidos, só que importados. Fábricas que produzem de 20 000 a 30 000 veículos por ano nunca serão tão competitivas como as que fabricam 300 000 unidades, a não ser que tenham incentivos.

Exame - Por que a Mercedes decidiu construir a fábrica, já que o Inovar-Auto sempre teve data para acabar?

Philipp - Ficamos sem opção. O programa estabeleceu uma cota de importação de 4 800 veículos por ano, bem menos do que vendemos. Se não fizéssemos a fábrica, perderíamos competitividade — temos uma rede de concessionárias para manter aqui, e a conta não fecharia. Era isso ou sair do mercado. Não posso falar pelas outras montadoras, mas certamente estão todos preocupados. A Anfavea [associação que representa as montadoras] está discutindo soluções com o governo e acredito que o programa possa mudar para melhor.

Exame - Mudar como?

Philipp - Poderia se tornar uma política industrial de longo prazo. É preciso facilitar a entrada de novas tecnologias no Brasil para podermos agregar valor e competir no mercado mundial. Gosto do modelo da Embraer, de importar mais e exportar mais também.

Exame - A maior parte do resultado da Mercedes no Brasil depende da venda de caminhões e ônibus, segmentos muito afetados pela crise. Quando a recuperação deve começar?

Philipp - Começamos neste ano vendendo menos do que em 2016. Nosso negócio depende, essencialmente, de juros baixos, porque a maioria dos clientes financia a compra, e do crescimento econômico. Sabemos que o mercado de caminhões vai voltar, porque é responsável por 60% do transporte no país, mas, para isso acontecer, o PIB precisa voltar a crescer. Se as reformas forem aprovadas, o que contribuirá para a retomada da economia, é possível que a situação de nosso mercado melhore no segundo semestre. Haveria uma ajuda com incentivos para a troca da frota brasileira, hoje uma das mais velhas do mundo.

Exame - Como foi retomada a liderança no mercado de caminhões?

Philipp - Em 2013, nossos custos eram elevados, as fábricas estavam ineficientes e os produtos pouco atraentes. Investimos 730 milhões de reais na modernização das fábricas e dividimos a produção: a fabricação das cabines acontece na unidade de Juiz de Fora [Minas Gerais] e a montagem em São Bernardo do Campo [São Paulo]. Ainda estamos comprando novas máquinas para São Bernardo para que, em 2019, essa seja uma das fábricas mais modernas da companhia no mundo. Para melhorar a oferta, fizemos pesquisas e nos comparamos com os concorrentes. Quase toda a linha de produtos mudou: aumentamos o conforto, reduzimos o consumo de combustível e diminuímos a necessidade de revisões para manutenção, por exemplo. Mas também tivemos de demitir: 5 500 funcionários saíram, a maioria por meio de um programa de demissão voluntária. Isso representava 40% do nosso quadro. Com todas as mudanças, ganhamos cerca de 20% de produtividade.

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