Jack Dorsey, da Square: a empresa decepcionou na bolsa de valores (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 14 de dezembro de 2015 às 04h56.
Última atualização em 21 de março de 2018 às 11h33.
São Paulo — Em novembro de 2013, a investidora americana Aileen Lee escreveu um artigo num site de tecnologia que colocou uma palavra nova no vocabulário das startups: unicórnio. O animal mitológico passou a servir de sinônimo para empresas de tecnologia novatas avaliadas em mais de 1 bilhão de dólares. Assim como unicórnios, essas empresas, dois terços delas americanas, exercem um enorme fascínio.
Há dois anos, quando a expressão foi criada, havia 39 unicórnios. Desde então, o número saltou para 144, puxado pelo interesse cada vez maior dos investidores. O exemplo máximo dessa fase é o Uber, o polêmico serviço de transporte urbano avaliado em 51 bilhões de dólares, mais de duas vezes o valor da montadora Fiat Chrysler.
Os unicórnios atraíram a atenção dos fundos de capital de risco e da mídia especializada, mas na hora de estrear na bolsa de valores estão decepcionando. A maioria continua valendo mais de 1 bilhão de dólares. O problema é que eles estão sendo negociados muito abaixo da expectativa que se tinha poucos meses atrás.
Em novembro, a Square, empresa de meios de pagamento para smartphones e tablets criada e dirigida pelo presidente do Twitter, Jack Dorsey, fez uma aguardada abertura de capital nos Estados Unidos. Depois da estreia, o valor de mercado da empresa está em 3,9 bilhões de dólares. Nada mal, certo? Há um ano, porém, a estimativa de valor era de 6 bilhões.
Desde o lançamento, o preço da ação subiu, mas ainda está longe do patamar sonhado até o ano passado. “O que aconteceu com a Square não foi uma surpresa. Muitos unicórnios estão seriamente sobrevalorizados”, diz Max Wolff, economista-chefe do banco de investimento Manhattan Ventures, de Nova York.
Na lista das startups que não corresponderam às projeções ao chegar à bolsa de valores estão a companhia de armazenamento de arquivos online Box; a Hortonworks, que desenvolve aplicações corporativas na nuvem; e a New Relic, que faz softwares para o segmento de big data.
Com esse sinal vindo dos investidores, algumas startups estão adiando a estreia na Nasdaq, como o serviço de armazenamento na nuvem Dropbox. Com base nos investimentos que já recebeu dos fundos de capital de risco, o Dropbox foi avaliado no ano passado em 10 bilhões de dólares.
O mercado esperava que a abertura de capital ocorresse neste ano, mas dezembro chegou e até agora nada de a startup anunciar sua entrada no mercado de ações. “O valor estimado do Dropbox é insano. É mais de 25 vezes a receita do ano passado. O risco de tomar um tombo na bolsa é enorme”, afirma Michael Dempsey, analista da consultoria americana CB Insights, especializada em investimentos.
O medo do fiasco entre as startups acabou criando um gargalo. Em tempos de unicórnios, o número de aberturas de capital na Nasdaq é o menor dos últimos seis anos. Por que, afinal, essas empresas que ainda têm o capital fechado estão sobrevalorizadas? Uma das explicações é a entrada em cena de um novo tipo de investidor.
Nos últimos anos, fundos que preferiam não investir em empresas de tecnologia, como os familiares, decidiram entrar nesse segmento. Resultado: o valor aplicado em startups em estágio avançado de operação nos Estados Unidos saiu de 3,1 bilhões de dólares, em 2012, para 6,9 bilhões de janeiro a setembro deste ano. Essa disputa dos investidores fez subir o valor das startups que ainda não abriram o capital.
Tanto dinheiro fez crescer o temor de que o setor de tecnologia dos Estados Unidos seja uma bolha prestes a estourar. “O Vale do Silício tornou-se um lugar especulativo e insustentável. Com certeza, veremos alguns unicórnios morrendo no próximo ano”, disse recentemente numa conferência Bill Gurley, sócio do fundo Benchmark Capital e um dos investidores mais respeitados dos Estados Unidos.
Os que negam a existência de uma bolha argumentam que a soma do valor de mercado de todas as startups bilionárias é inferior ao de uma grande empresa de tecnologia, como o Google, que vale 515 bilhões de dólares. “Veremos uma correção, com a diminuição dos investimentos, e voltaremos para avaliações normais”, diz Wolff, do banco Manhattan Ventures.
A proliferação de smartphones ampliou o número de usuários de software, abrindo espaço para uma nova geração de empreendedores. Alguns unicórnios têm inegavelmente um grande futuro. Mas a pergunta central para os investidores de bolsa continua sendo a mesma: a empresa dá lucro?
“Estrear na bolsa de valores e ser obrigado a se tornar lucrativo antes da hora pode ser mortal mesmo para um grande negócio”, afirma Michael Dempsey, analista da consultoria americana CB Insights. A experiência mostra que ganhar popularidade não é igual a dar retorno financeiro. A maior referência disso é o site de compras coletivas Groupon.
A empresa levantou 700 milhões de dólares em sua abertura de capital em 2011, enfrentou uma onda de concorrentes e até hoje roda no vermelho. Quando a ação do Groupon foi lançada, ela valia 26 dólares; e atualmente não chega a 3.
Cerca de 60% das empresas de tecnologia que abriram o capital no último ano têm ações negociadas por um preço inferior ao da estreia na bolsa. Unicórnio ou não, todas morrem de medo de ser a nova Groupon.