Revista Exame

Petrobras pode perder R$ 40 bi com decisões de sindicalistas

Os sindicatos ganharam peso político e mais recursos nos anos do PT. Ameaçados pelo desemprego e pelo novo governo, querem mais. Adivinha à custa de quem?


	 Potesto a favor da Petrobras: um grupo de 30 sindicalistas tomou decisões que podem causar perdas de 40 bilhões de reais — eles estão de saída da estatal
 (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Potesto a favor da Petrobras: um grupo de 30 sindicalistas tomou decisões que podem causar perdas de 40 bilhões de reais — eles estão de saída da estatal (Rovena Rosa/Agência Brasil)

DR

Da Redação

Publicado em 12 de setembro de 2016 às 13h32.

São Paulo — No início de 2015, milhares de sindicalistas protestaram Brasil afora em defesa da Petrobras. O objetivo era prestar solidariedade aos funcionários da estatal diante do escândalo de corrupção revelado pela Operação Lava-Jato, que havia completado um ano.

Os fatos que se apresentaram a partir dali, no entanto, mostram que era justamente a Petrobras que precisava ser defendida de um punhado de sindicalistas. Eles foram colocados em cargos de administração na estatal depois que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva anistiou dirigentes punidos por participar de greves consideradas abusivas pela Justiça na década de 90.

A maioria tinha passagem pela Federação Única dos Petroleiros, associada à Central Única dos Trabalhadores, historicamente ligada ao Partido dos Trabalhadores. Em cargos de gerência da Petrobras, ganhavam salários de até 70 000 reais. Mas o maior custo veio dos danos que causaram.

Denúncias de funcionários feitas anonimamente à nova diretoria da empresa mostram que a Petrobras pode ter perdas de até 40 bilhões de reais com 18 decisões do grupo de sindicalistas em questão. A mais danosa foi igualar os salários de quem trabalhava em setores administrativos aos das áreas de risco, que têm direito a um adicional de 30% na remuneração.

A mudança abriu espaço para uma avalanche de processos trabalhistas que podem tirar da empresa 20 bilhões de reais. Em nota, a Petrobras diz que investiga as denúncias. Mas está indo além: dos 30 sindicalistas, 11 já foram demitidos ou deixaram o cargo.

Os mais conhecidos são Diego Hernandes, ex-gerente de recursos humanos, e Wilson Santarosa, ex-gerente de comunicação — seu sucessor, Luis Nery, que não era sindicalista, mas é muito ligado a Santarosa, foi demitido em julho após a descoberta de uso de dinheiro da estatal para pagar ingressos de Carnaval. “A gestão atual começou a limpar a empresa”, disse a EXAME por e-mail o grupo de denunciantes. 

O revés dos sindicalistas não se dá apenas na Petrobras. Com a troca de governo, os dirigentes sindicais ocupam menos cargos em ministérios, postos de confiança no Planalto e cadeiras no Congresso. Dados do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar mostram que a bancada sindical caiu de 72 parlamentares, em 2011, para 51, em 2015.

“Os sindicatos ascenderam na máquina pública junto com as administrações petistas, mas a situação está mudando”, diz o jurista Almir Pazzianotto, que foi advogado sindical nos anos 70 e ministro do Trabalho de 1985 a 1988. Outro golpe duro vem da própria crise econômica, que fez 3 milhões de pessoas perder o emprego desde 2014.

Ou seja, há menos gente no mercado de trabalho formal sustentando o sistema sindical. Os dirigentes das entidades dos trabalhadores já perceberam a ameaça de ficar com o “dinheiro curto”. Uma reação está sendo armada. Deputados ligados à bancada sindical criaram no ano passado uma comissão especial para discutir o financiamento da atividade.

Em julho, saiu o resultado: um projeto de lei para cobrar mensalmente do trabalhador até 1% da remuneração anual mediante uma taxa chamada de assistencial ou negocial — ou seja, um aumento da carga tributária do trabalhador. O objetivo é custear as despesas que os sindicatos têm nas negociações coletivas.

Pela proposta, caso o trabalhador não queira pagar, terá de passar por um constrangimento: expor pessoalmente sua oposição durante uma assembleia. O potencial de arrecadação da nova taxa é estimado em 10 bilhões de reais por ano, considerando que todas as entidades apliquem o máximo de 1%.

“Estamos regulamentando uma taxa que já é cobrada, mas colocando um teto porque há casos em que ela chega a 3% ao mês”, diz o deputado Bebeto (PSB-BA), autor da proposta. O argumento não deixa de ser verdadeiro, mas está incompleto.

O Ministério Público do Trabalho só permite a cobrança de quem é filiado aos sindicatos — uma opção pessoal — e o projeto estende a obrigação a todos os trabalhadores. Os sindicatos patronais também poderiam aplicar a contribuição aos empregadores.

Consultadas, a Confederação Nacional do Comércio e a da Agricultura disseram ser contra a proposta, pois seria mais um peso para os empresários às voltas com a crise. O potencial de arrecadação nesse caso é de 3 bilhões de reais.

“Seria reforçar o dinheiro de entidades que servem mais ao interesse político e pessoal de seus líderes do que à defesa da classe empresarial”, diz Romeu Zema, presidente da rede mineira de lojas Zema. Advogados têm criticado a proposta pelo fato de o imposto sindical já existir para cobrir as despesas de representação. A bancada sindical está preparada para a batalha.

“Podemos negociar a proposta junto com a reforma da Previdência”, diz o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP). Ele já trabalha para que o projeto deixe de passar nas três comissões que avaliam o conteúdo e vá diretamente ao plenário da Câmara — dali, sairia para o Senado. Não é que os sindicatos recebam pouco dinheiro.

Com o imposto sindical, os trabalhadores já destinam a essas entidades um dia de salário por ano, conforme a lei criada nos tempos da ditadura de Getúlio Vargas. Além do imposto, os que são filiados aos sindicatos pagam taxas de, em média, 40 reais por mês. Há ainda a taxa assistencial e alguns ganhos indiretos, como deixar de pagar 2 bilhões de reais em salários a 50 000 funcionários cedidos pelas empresas.

Sem contar as irregularidades. Alguns sindicatos mais fortes conseguem até mesmo receber contribuição das empresas. O presidente da filial de uma multinacional alemã afirmou a EXAME que a empresa paga 1 milhão de reais por ano desde 2007 a um “fundo de qualificação” do sindicato da categoria a que pertencem seus empregados.

“Nunca tivemos nenhum empregado treinado com recursos do fundo”, diz o presidente da empresa. Um levantamento feito por EXAME mostra que, a cada ano, os sindicatos amealham mais de 11 bilhões de reais no país. Se a nova proposta vingar, o valor poderá subir para 17 bilhões de reais. Por que os sindicatos querem mais dinheiro? A máquina sindical custa caro e não para de crescer.

As regras existentes funcionam como incentivos para a criação de entidades. O imposto sindical é um dinheiro garantido, não ocorre fiscalização, há autonomia para definir as regras internas e não existe competição — em cada município, só pode haver um sindicato por categoria. A cada ano, são formados 381 sindicatos no país. Em 2015, o número total já beirava 11 000.

Nesse universo, as centrais sindicais tornaram-se verdadeiros gigantes depois que foram regulamentadas em 2008 e passaram a receber uma parcela do imposto sindical. A CUT, com 3 440 entidades filiadas, recebe 55 milhões de reais por ano. A Força, com 1 635 sindicatos, recebe 41 milhões.

“Com a criação das centrais, a representação dos trabalhadores ficou mais forte do que a dos patrões”, diz Paulo Sérgio Rosa, consultor de relações trabalhistas. “Os escândalos de corrupção recentes tendem a fazer com que os patrões fiquem ainda mais enfraquecidos na mesa de negociação.” A gana dos sindicalistas por mais dinheiro também é para sustentar regalias.

Há casos de salário duplo: um pago pelo sindicato e outro mantido pela empresa em que trabalhavam. Existem entidades que dão aos diretores uma ajuda de custo mensal sem pedir comprovação do gasto. Um dos maiores atrativos é, em muitos casos, ter praticamente um emprego vitalício.

De acordo com a ONG Contas Abertas, há 8 500 sindicalistas que estão há mais de dez anos no mesmo cargo, incluindo presidentes e diretores. No sindicato dos motoristas de São José do Rio Preto, no interior paulista, o presidente Daniel Caldeira esteve à frente da entidade por quase três décadas. Ele mudou o estatuto para que o mandato durasse oito anos, sem limite de reeleições.

Não que Caldeira fosse um bom gestor. Há reclamação de trabalhadores de que o sindicato impedia a desfiliação, cobrava taxa assistencial de até 3% do salário ao mês e de que havia desvio de dinheiro. A diretoria de Caldeira foi afastada em junho e está sendo investigada. A família Mata Roma ficou cinco décadas no Sindicato dos Comerciá­rios do Rio de Janeiro.

Lá, 12 membros do clã foram empregados com salários de até 60 000 reais até outubro de 2014. Eles fraudavam eleições, não pagavam impostos e deixaram um buraco de 100 milhões de reais nas contas. De acordo com o Ministério Público do Trabalho, há 268 investigações de fraudes administrativas e financeiras em sindicatos no país.

“As irregularidades ocorrem porque há um distanciamento entre sindicato e os trabalhadores, numa crise de representação”, diz o procurador do trabalho João Carlos Teixeira. É essa máquina que pede mais dinheiro.

Acompanhe tudo sobre:Capitalização da PetrobrasCombustíveisEdição 1118EleiçõesEmpresasEmpresas abertasEmpresas brasileirasEmpresas estataisEstatais brasileirasIndústria do petróleoOperação Lava JatoPetrobrasPetróleoSindicatos

Mais de Revista Exame

Linho, leve e solto: confira itens essenciais para preparar a mala para o verão

Trump de volta: o que o mundo e o Brasil podem esperar do 2º mandato dele?

Ano novo, ciclo novo. Mesmo

Uma meta para 2025