Gesner Oliveira, presidente da Sabesp: esforço para internacionalizar a empresa (Gabriel Rinaldi/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h38.
No próximo mês de julho, os executivos da Idaan, estatal encarregada do saneamento básico do Panamá, receberão uma visita atípica. Pela primeira vez em seus pouco mais de 100 anos de história, a empresa abrirá as portas a um time de forasteiros que deverão percorrer todas as instalações à procura de possíveis focos de desperdício de água. Cinco dos 12 técnicos que vão trabalhar nessa tarefa nos próximos três anos são brasileiros - todos eles funcionários da Sabesp, estatal de saneamento do estado de São Paulo. A viagem desse grupo é representativa de dois movimentos que a Sabesp começou a fazer recentemente. O primeiro deles é a internacionalização, cujo início será marcado pelo projeto no Panamá. O segundo, a diversificação dos negócios - em outras palavras, a venda de serviços que vão muito além do tratamento de água e esgoto, como consultoria para redução de desperdício e comercialização de água de reúso, utilizada para fins industriais e na limpeza de ruas. Apesar de relativamente recentes (o primeiro contrato foi firmado no final de 2007), tais iniciativas renderam à Sabesp cerca de 320 milhões de reais nos resultados do ano passado. É um valor modesto se comparado aos 6,7 bilhões de reais que a estatal faturou em 2009, mas oferece uma boa pista do caminho que a empresa deverá seguir daqui para a frente. "Assim como a Petrobras se tornou uma empresa de energia, queremos ser reconhecidos como uma companhia de soluções ambientais", diz Gesner Oliveira, ex-presidente do Cade e presidente da Sabesp desde 2007, numa alusão direta ao fato de a Petrobras investir hoje em negócios que não estavam originalmente em seu DNA, como o etanol.
Fundada em 1973, a Sabesp, maior companhia de saneamento do Brasil e quinta maior do mundo, é - e será por um longo tempo - essencialmente uma empresa de saneamento básico. Sua função é fundamentalmente levar tratamento de água e esgoto aos 645 municípios do estado de São Paulo. Atualmente, 60% das cidades paulistas são abastecidas pela Sabesp e 72% da rede de atendimento tem seu esgoto tratado, o maior índice em um país ainda vergonhosamente carente desse tipo de serviço. A companhia vinha reinando absoluta no setor até que, em janeiro de 2007, a aprovação da Lei do Saneamento e do marco regulatório abriu o mercado para a competição, inclusive por parte de empresas privadas, como a espanhola OHL e a Foz do Brasil, do grupo Odebrecht. "De uma hora para outra, a Sabesp precisou buscar novas formas de atuação", diz Alexandre Montes, analista da corretora de valores Lopes Filho. Foi aí que surgiu a ideia de oferecer serviços voltados para o mercado corporativo, algo até então proibido por lei. Uma das primeiras iniciativas nesse sentido foi o serviço de telemedição, que detecta aumentos anormais no consumo em prédios comerciais - em dois anos, a Sabesp fechou contratos desse tipo com 2 000 clientes públicos e privados.
Embora a busca por novas fontes de receita com base em soluções ambientais seja uma tendência entre as grandes empresas de saneamento no mundo - esse tipo de serviço responde por aproximadamente 20% da receita da francesa Suez, por exemplo -, foi somente agora que a Sabesp conseguiu dar vazão a alguns projetos mais inovadores. Em fevereiro, a empresa leiloou duas concessões para a construção de pequenas centrais hidrelétricas na bacia da Cantareira, responsável pelo abastecimento de boa parte da capital paulista. Juntos, os dois projetos devem gerar uma receita adicional de 1,6 milhão de reais para a Sabesp por ano - sem que a empresa tenha investido um centavo na empreitada. "Nossa ideia era aproveitar as quedas dágua já existentes na represa para gerar energia", diz Oliveira. Em outra frente, a Sabesp está investindo 8 milhões de reais para a construção de seu primeiro aterro sanitário, na cidade de São João da Boa Vista, a 220 quilômetros de São Paulo. A previsão é que o projeto seja concluído até o final deste ano e que gere uma receita da ordem de 2 milhões de reais. A iniciativa mais audaciosa, no entanto, deve começar a sair do papel em junho. Trata-se do Aquapolo Ambiental, a maior estação de água de reúso do hemisfério sul, com capacidade de processar até 1 000 litros por segundo. A construção será realizada em parceria com a Foz do Brasil e servirá para abastecer o polo petroquímico de Capuava, no ABC paulista. Dos 252 milhões de reais investidos na estação, aproximadamente 120 milhões sairão do caixa da Sabesp.
Mais do que fazer as pazes com a natureza ao desenvolver soluções ambientalmente responsáveis, a Sabesp tenta dar conta de um problema inerente a seu negócio: o desperdício de água. Hoje, a empresa conta com um índice de perda de água de 26% - valor relativamente baixo se comparado à média brasileira, de 40%, e à média mundial, de 50%, mas considerado elevadíssimo em relação à taxa europeia, que oscila de 10% a 14%. Estima-se que tais perdas, resultado principalmente de vazamentos nas adutoras, evaporação nas estações de tratamento e uso descuidado da água por parte do consumidor final, façam com que a Sabesp deixe de faturar cerca de 1,5 bilhão de reais por ano - dinheiro que escorre pelo ralo.
"Nossa meta é diminuir esse índice para 13% até 2019", diz Oliveira. Para chegar lá, a Sabesp foi buscar inspiração na estatal japonesa Jica e na israelense Mekorot, consideradas as companhias de saneamento mais eficientes do planeta, com um índice de desperdício próximo de 6%. No ano passado, as duas empresas selaram uma parceria com a Sabesp para transferência de tecnologia, que inclui a importação de software e equipamentos. Para os investidores, porém, esses esforços ainda devem demorar a trazer resultados significativos. "Para quem compra os papéis da Sabesp, as soluções am bientais não têm muita relevância", afirma Montes, da corretora Lo pes Filho. "O que ainda importa mesmo é a ampliação da rede de coleta e tratamento de es goto." Pelo menos por enquanto.