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Viagem | Paraíso sem carbono em Noronha

O arquipélago mais famoso do Brasil é um refúgio em estado selvagem. E em breve terá combustão zero

Vista da Baía dos Porcos:  uma das paisagens deslumbrantes deste Patrimônio da Humanidade (Dorival Moreira Lucindo / AGB Photo/Exame)

Vista da Baía dos Porcos: uma das paisagens deslumbrantes deste Patrimônio da Humanidade (Dorival Moreira Lucindo / AGB Photo/Exame)

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Da Redação

Publicado em 20 de junho de 2019 às 05h16.

Última atualização em 25 de junho de 2019 às 14h47.

Quem escolhe visitar Fernando de Noronha, esse arquipélago formado por ilhas, ilhotas e rochedos de origem vulcânica na altura de Pernambuco, está à procura de trilhas que dão acesso a praias desérticas e paradisíacas, mergulhos ao lado de golfinhos e contemplação (a distância) de tubarões, contato com espécies raras de vegetação, cantoria de pássaros, céu azul, vento no rosto e, como ninguém é de ferro, um pescado local preparado por um nativo. Para coroar o dia, cabe até um controverso aplauso do pôr do sol em algum monte com vista privilegiada.

Convenhamos, em um cenário como esse, um ser motorizado causa ruído — não só à audição mas também ao senso estético. A última coisa em que se pensa ao procurar um refúgio para descansar a mente, colocar o corpo para se mexer e ativar os sentidos é entrar em contato com algo que lembre a civilização industrial. Só que um carrinho é fundamental para andar de um canto a outro ali, percorrendo uma pequena parte dos cerca de 17 quilômetros quadrados do território principal. Não sejamos radicais, portanto. O ideal é que eles, os animais do asfalto, componham com a paisagem local, em uma união de diferentes em prol do bem comum.

O Twizy, da Renault: doação para a ilha que antecipa medida de proteção ambiental | Divulgação

E era justamente assim que eu me sentia, completamente integrado, passando por pontos paradisíacos, como a Baía dos Porcos e a Praia da Cacimba do Padre, enquanto estava ao volante do Zoe, o modelo 100% elétrico da Renault, campeão de vendas na Europa e disponível no mercado brasileiro. Dirigia sem fazer barulho, sem espantar os bichos, sem causar ruído na sinfonia da natureza, porque o motor elétrico, sabemos, age na surdina, sem fazer alarde.

Dirigia ciente de que não estava poluindo, porque o motor elétrico, sabemos também, não emite gases tóxicos. E, dispondo de uma autonomia de 300 quilômetros do Zoe, não tinha dúvida de que teria energia suficiente para eu subir e descer a BR-363, a menor do país, com seus cerca de 6 quilômetros de comprimento — não, não me aventurei a sair do caminho…

A pergunta que cabe é: o que um carro como o Zoe, na vanguarda da tecnologia, estava fazendo ali, um pedaço que parou no tempo (e é bom que continue assim, longe do desenvolvimento urbano), tão distante do continente? Não, não foi nadando, com um pedido de desculpas pela descontração, até porque, já dissemos, a região é infestada de tubarões… O Zoe, melhor dizendo, três deles chegaram acompanhados de dois Twizy, veículo pequeno de dois lugares, e um furgão Kangoo Z.E., todos elétricos, entregues pela Renault em regime de comodato para ser utilizados pela administração de Fernando de Noronha, como parte do Projeto Noronha Carbono Zero. O anúncio da parceria movimentou a Praia do Porto de Santo Antônio, não apenas pelas celebridades motorizadas como pela presença dos atores globais Carol Castro, Giovana Cordeiro, Bruno Gagliasso e Jonathan Azevedo, o NegBlack, todos apoiadores da causa. A causa agradece.

Sim, é um número com pouca expressão, considerando que a frota local, segundo o IBGE, chegava a 1.330 veículos em 2018, mas este é só o começo. Decreto assinado pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara (pendente de aprovação na Assembleia Legislativa do estado), prevê que, a partir de 2022, não será mais permitida a entrada de carros, motos, ônibus e caminhões que emitam dióxido de carbono. E, de 2030 em diante, veículos com motores a combustão terão de sair de vez de Noronha. Nem mesmo híbridos serão tolerados. Será o primeiro território brasileiro a adotar essa medida.

Ou seja, é questão de tempo para essa frota mudar o tom do motor. Tanto que a Renault já abriu a venda de modelos elétricos para moradores da ilha, com condições especiais de pagamento — a ser detalhadas. Hoje, os preços são os seguintes: Zoe, 149.990 reais; Kangoo Z.E., 128.990 reais; e Twizy: 82.990 reais. Conversando com os motoristas locais, essas cifras os faziam arregalar os olhos. Mas, diante da possibilidade das tais “condições especiais de pagamento”, o que mais os incomodava era o perfil do carro ideal para aguentar o tranco ali. Diziam que tinha de ser algo forte, com suspensão alta, tração nas rodas suficiente para enfrentar ladeiras e pisos escorregadios, tipo os SUVs da Mitsubishi e Toyota que circulam regularmente por lá.

Com a sabedoria local, não tenho como discutir, evidentemente. Como mero visitante, atesto: ao volante de um elétrico, em estrada asfaltada, rodei de cabeça erguida, ciente de que não era um intruso devastador do meio ambiente, naquele que é considerado pela Unesco um Patrimônio Mundial da Humanidade desde 2001.

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