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J. R. Guzzo | Onde está o inimigo

Não fomos “nós mesmos” que inventamos os problemas. Eles foram criados pela sucessão de governos que o Brasil vem tendo há muito tempo

Resistência à privatização: em sete anos, a folha das estatais consumiu 70 bilhões de reais, 10 bilhões mais do que o investido em infraestrutura (Newton Menezes/FuturaPress)

Resistência à privatização: em sete anos, a folha das estatais consumiu 70 bilhões de reais, 10 bilhões mais do que o investido em infraestrutura (Newton Menezes/FuturaPress)

JG

J.R. Guzzo

Publicado em 12 de setembro de 2019 às 05h12.

Última atualização em 12 de setembro de 2019 às 10h54.

Num mundo e numa época de questões complicadas, há coisas muito fáceis de consertar no Brasil. É bom, porque Deus sabe que temos nossa cota de espinhos — e qualquer oportunidade deve ser aproveitada para tirar da frente as dificuldades que foram colocadas aí por nós mesmos, e que podem ser resolvidas pela mera vontade real de trocar o errado pelo certo, pelo uso da cabeça e pela aplicação de uma dose mínima de competência. Melhor dizendo: não fomos “nós mesmos” que inventamos os problemas.

Eles foram criados pela sucessão de governos que o Brasil vem tendo há muito tempo, e criados sempre da mesma forma — no escuro, por grupos equipados com os meios de gerar despesas nas contas do Estado e pela ação de quem manda no aparelho administrativo do país. Esses problemas são problemas só para os 210 milhões de brasileiros; para seus criadores são uma belíssima solução. Servem para atender a seus interesses particulares, sempre, com a desculpa de que são indispensáveis para o desenvolvimento nacional, para o “avanço social” e para o triunfo geral da virtude. Atendem por um nome que acabou por tornar-se amaldiçoado: “empresas estatais”.

Esses interesses você sabe muito bem quais são. Empregos pagos com salários altos e dinheiro público, possibilidade de fazer negócios privados em benefício pessoal, atendimento a familiares e amigos. Não há, jamais, a necessidade de produzir algum resultado. Ninguém é responsabilizado por nada. A noção de metas a cumprir, ou outros mandamentos rudimentares até para a operação de um carrinho de pipoca, é desconhecida. Funcionam, em grande parte, como usinas de corrupção. Todas as empresas do Estado são assim? É claro que não. Há as exceções — com pessoas competentes, trabalho sério e benefícios para a população. Mas não é essa a regra.

Nada disso, claro, é a descoberta da pólvora. Mas tem sido pela exposição permanente das aberrações do mundo estatal que o Brasil vem avançando, pouco a pouquíssimo, em sua redução. Não só foram obtidos progressos. Interrompeu-se, também, a criação de novos atrasos. As últimas estatais são criações dos governos do PT, e talvez nenhuma delas revele tão bem a desgraça toda como a alucinante empresa do “Trem-Bala” — mas o PT não está mais aí.

Vale a pena, assim, aproveitar toda e qualquer chance que apareça para expor a demência disso tudo e tentar apressar ao máximo sua progressiva liquidação. É o caso de uma recente intervenção do deputado federal Vinicius Poit, do Partido Novo de São Paulo. Em sete anos, mostrou Poit, as estatais brasileiras gastaram 70 bilhões de reais com salários; em algumas, a remuneração média — média, não a mais alta — é de 300.000 reais por ano.

Nesses mesmos sete anos, os gastos totais com infraestrutura no Brasil somaram 60 bilhões de reais, ou 10 bilhões menos. Pergunta do deputado: “Dá para entender, agora, por que 100 milhões de brasileiros não têm esgoto até hoje?” Sim, dá para entender perfeitamente — é impossível fazer uma conta mais clara do que essa. Ele poderia acrescentar: “Dá para entender, agora, quem é realmente o seu inimigo?”

Poit mencionou apenas os funcionários das empresas estatais. Há o quadro de horrores do alto serviço público, onde os ocupantes de cargos no Judiciário, no Ministério Público e nos Tribunais de Contas ganham, em média, mais de 500.000 reais por ano; os titulares de cartórios embolsam mais que o dobro, ou 1,1 milhão anualmente.

Entra na cabeça de alguém que o Brasil tenha dinheiro para pagar esse tipo de salário, a não ser metendo a mão no bolso da população inteira? Há pouco a fazer com os barões do funcionalismo público. Mas com estatal é só vender ou fechar. É o que está sendo feito, pela primeira vez depois de 20 anos, pelo governo atual. Ainda agora, anunciou-se a liquidação de mais um lote de nove dinossauros — entre eles alguns dos antros mais sinistros do atraso, da inépcia e da corrupção neste país, como a Docas de Santos, a Armazéns Gerais de São Paulo, Os Correios e outras aberrações. Tem de ser por aí.

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