André Esteves: “Períodos de baixo crescimento são piores para a atividade bancária” (Lailson Santos/VEJA)
Da Redação
Publicado em 24 de julho de 2014 às 06h00.
São Paulo - A compra do banco suíço BSI por 3,7 bilhões de reais, anunciada no dia 14, foi um marco para o banco de investimento BTG Pactual. Após a conclusão do negócio, que precisa ser aprovado por reguladores, pouco mais da metade das receitas e do lucro do BTG virá de operações no exterior — e dois terços dos cerca de 3 000 funcionários estarão fora do país.
Trata-se de um feito sem precedentes, já que as grandes instituições brasileiras sempre relutaram em avançar para valer no exterior. Em 2012, o BTG fez duas aquisições internacionais, das corretoras Celfin, do Chile, e Bolsa Y Renta, da Colômbia. Neste ano, anunciou a compra de subsidiárias da resseguradora Ariel Re, que tem sede em Londres e nas Bermudas.
Além disso, montou, há um ano, uma área para operar commodities globalmente. Com o BSI, os ativos totais do BTG deverão crescer cerca de 30%, segundo projeções de analistas, o que faria o banco subir uma posição no ranking de maiores do Brasil (de oitavo para sétimo) e encostar no HSBC.
Dono do banco Pan, comprado em 2011 do Grupo Silvio Santos prestes a quebrar, e de uma carteira de investimento próprio em 31 empresas (28 delas brasileiras), o BTG também assessora fusões, aquisições e ofertas de ações, faz gestão de recursos e opera ações, moedas e títulos de renda fixa.
O que explica a decisão de crescer no exterior? O Brasil decepcionou? André Esteves, presidente do BTG, diz que este é um bom momento para crescer lá fora. “É mais uma questão de boas oportunidades no exterior do que de falta de oportunidades aqui”, afirmou, pouco antes de embarcar para Lugano, na Suíça, sede do BSI.
EXAME - Os bancos brasileiros têm uma presença tímida no exterior. Por que o BTG Pactual decidiu crescer mais lá fora?
André Esteves - O Brasil está começando a criar uma cultura de multinacionais. A Ambev (fabricante de bebidas), a Gerdau (siderúrgica) e a Vale (mineradora) são algumas empresas brasileiras que se tornaram líderes globais em seu setor.
E a nossa experiência pode trazer um exemplo desses para a área financeira. Para o BTG, a vantagem é poder diversificar as fontes de receita e ter mais opções de crescimento.
EXAME - O Brasil está se tornando um mercado mais complicado para as instituições financeiras?
André Esteves - Não necessariamente. Sempre crescemos e ganhamos dinheiro aqui, temos orgulho disso e vamos manter nossa sede no país. Mas, conjunturalmente, existem momentos de maior e menor crescimento econômico. E períodos de baixo crescimento são piores para a atividade bancária.
Temos de saber aproveitar cada um desses ciclos. A compra do BSI e nosso crescimento no exterior são muito mais uma questão de boas oportunidades no exterior do que de falta de oportunidades aqui.
EXAME - Com a compra do BSI, que parcela do resultado do BTG passa a vir do exterior?
André Esteves - Pouco mais da metade das receitas e do lucro será gerada fora. Antes dessa aquisição, 50% de nossos funcionários ficavam fora do Brasil — parte na América Latina, parte na Europa e nos Estados Unidos.
Com a compra do BSI, teremos dois terços dos funcionários no exterior. Se considerarmos que as áreas de suporte estão majoritariamente no Brasil, é natural que receita e lucro estejam cada vez mais ligados à presença no exterior.
EXAME - Por que comprar o BSI?
André Esteves - Foi uma oportunidade única de comprar uma plataforma desse tamanho, com 100 bilhões de dólares em ativos sob gestão e uma marca forte, em condições comerciais interessantes. Isso foi possível porque vivemos um momento atípico no sistema financeiro mundial.
Com as restrições regulatórias, os grandes bancos na Europa e nos Estados Unidos não conseguem fazer aquisições relevantes, o que abre espaço para bancos baseados em mercados emergentes. Além disso, essa é uma área que conhecemos bem e queremos expandir.
Fazemos gestão de fortunas desde a fundação do Pactual, há 30 anos. Com a compra do BSI, ficamos com 200 bilhões de dólares em ativos e temos mais produtos para oferecer a nossos clientes.
EXAME - O sistema financeiro na Suíça também está mudando. A “cultura” do segredo está ficando para trás. Isso pode abrir espaço para outros concorrentes estrangeiros, além do BTG, começarem a operar no país?
André Esteves - Há uma transição do modelo do segredo para o modelo do serviço. O que as próprias autoridades reguladoras da Suíça esperam é que haja mais instituições capazes de assessorar clientes em gestão de risco, oferecer bons produtos financeiros e fazer gestão de portfólio.
Não é mais só uma questão de manter a conta ali, como era no passado. Isso nos interessa e deverá chamar a atenção de concorrentes também.
EXAME - O BTG tem participação em dezenas de empresas, e algumas delas enfrentam dificuldades. A compra do BSI é uma tentativa de tirar o foco dessa estratégia?
André Esteves - Não. Nossa operação cresceu em cima da boa performance de nossa gestão de recursos. Somos reconhecidos por isso. Mas é normal que as áreas se desenvolvam de acordo com as oportunidades.
Com o BSI, a gestão de fortunas dá um salto, mas outras áreas vão continuar crescendo. No passado, os Rothschild, os Morgan, que foram os precursores dos bancos de investimento, usavam a poupança deles e a dos clientes para dar recursos para as empresas crescerem. Nós nos vemos assim.
EXAME - O BTG também investiu para operar commodities em vários países. Isso ainda faz parte do plano de expansão internacional?
André Esteves - Essa operação surge com nossa presença na América Latina, que é o principal polo de commodities do mundo em três ramos centrais: agrícola, mineração e petróleo e gás. Se conhecemos a fundo o mercado global de açúcar ou soja, por exemplo, podemos oferecer crédito a nossos clientes recebendo a mercadoria em troca.
Também podemos prestar um serviço a eles elaborando relatórios com informações sobre a próxima safra. Temos aproximadamente 200 pessoas nessa área, em Nova York, Londres, Genebra, Singapura e São Paulo. Queremos concorrer com as multinacionais do setor, como Cargill e Bunge.
EXAME - Há mais oportunidades de compra no exterior? Há bancos baratos?
André Esteves - Sempre estamos abertos para negociar. Mas, agora, o bom senso sugere uma imersão no BSI. Precisamos ir atrás das aprovações regulatórias e nos concentrar na obtenção de sinergias. Temos de colocar nossa cultura, direção e ambição no banco. Olhando para o longo prazo, nosso foco são os mercados emergentes, que deverão crescer mais que a média mundial.
Daqui a dez anos, é razoável supor que o Oriente Médio, o Sudeste Asiático, a China e a própria América Latina vão crescer mais do que a Europa. Precisamos ter uma presença robusta global para crescer.