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Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h38.
Durante os anos 70, quando freqüentava o curso que lhe deu o título de Ph.D em administração educacional na Claremont Graduate University, a americana Andrea McAleenan foi aluna de um senhor velho conhecido dos leitores de EXAME: Peter Drucker, o guru dos gurus da administração.
Duas décadas depois, Andrea voltou a freqüentar o campus de Claremont, mas não na condição de aprendiz. Há pouco mais de um ano ela aceitou o convite de Drucker para ser seu braço-direito na Peter F. Drucker Graduate School of Management, a faculdade de administração de empresas daquela universidade. Drucker foi buscá-la na University of California at Los Angeles, a UCLA, onde Andrea era responsável pelos currículos do curso de administração. Aos 89 anos, completados no último dia 19, e ainda em franca produção intelectual, Drucker delegou a Andrea o trabalho de planejar currículos, desenvolver parcerias com empresas e representar a Drucker School em seminários, entre muitas outras tarefas que constam na sua agenda. Como é ser sucessora de Drucker? "É um privilégio, mas ao mesmo tempo uma pressão e uma responsabilidade enormes", diz Andrea.
Nestes tempos em que a competitividade é cada vez mais dura dentro das empresas, a meta da Drucker School tem sido não apenas formar administradores, mas líderes. Como um curso universitário pode construir um líder? O que é preciso saber para ser líder? Foi sobre essas questões que Andrea conversou com EXAME em São Paulo, onde esteve recentemente para participar de um seminário. Eis os principais trechos da entrevista:
Liderança é uma característica que nasce com a pessoa ou pode ser aprendida? Qualquer um pode vir a ser um líder?
Nem todos os que se esforçam para ser líderes têm condições de chegar lá, mas também não é verdade que a pessoa já nasce líder. Existem habilidades que podem ser aprendidas.
Magnetismo pessoal é como inteligência ou beleza - a pessoa tem ou não tem?
Isso é carisma, paixão em expressar idéias. Na maioria dos casos não é uma característica crucial. Há vários estilos de liderança. É possível ser do tipo quietinho e conseguir que as suas idéias sejam implementadas por outras pessoas. Tudo depende do capital intelectual que o executivo possui.
Cite um grande líder que não tenha carisma.
Deixe-me ver... hummmmm... (silêncio)
Difícil, não? Mas nomes como Jack Welch e Andy Grove, que esbanjam carisma, vêm logo à mente.
De fato. É difícil ser um grande líder quando falta carisma.
Então como um curso sobre liderança, como o oferecido pela Drucker School, pode ajudar um executivo a se tornar um líder?
A chave é elaborar um currículo que permita ao aluno adquirir experiência com outros líderes. Freqüentar aulas, estudar e fazer os exames não é suficiente. É preciso que o aluno teste suas idéias num estágio em uma empresa ou mesmo numa entidade sem fins lucrativos. Dessa forma é possível observar um líder em ação - mesmo que não seja um Jack Welch - e ter a chance de implementar algo que faça a diferença.
Como se fosse um laboratório? Dê um exemplo.
Um de meus alunos foi trabalhar numa associação da comunidade coreana em Los Angeles. Ali, ele ajudou a desenvolver práticas gerenciais mais eficientes. Conduzir aquelas pessoas enriqueceu sua experiência. Ele nunca havia sequer imaginado que um ambiente como aquele poderia ajudá-lo a desenvolver suas habilidades de líder. Meu aluno sempre se enxergou trabalhando numa corporação. A lição que lhe ficou foi: se fui capaz de fazer isso aqui por que não conseguirei o mesmo numa empresa?
Liderança é um assunto que causa ansiedade. Muitos consomem tudo o que encontram pela frente: livros, cursos, palestras. Como identificar um bom curso?
Muitos executivos imaginam que esses produtos vão levá-los a um emprego ou promoção, mas não passa de ilusão. Um bom curso de liderança tem de permitir ao aluno fazer uma auto-avaliação séria com alguém que o ajude a ser realista, a identificar os pontos fortes e fracos e definir o que, de fato, ele pode fazer.
Por que é tão difícil ser líder?
Porque você precisa ter uma tremenda disciplina, muita perseverança e integridade. E tudo isso não é fácil.
Você se considera uma líder no seu trabalho?
(Longo silêncio) Eu...bem...eu acho... A resposta é: sim. Mas a prática da minha liderança é inspirar as pessoas a ter idéias que resultem em possibilidades concretas de crescimento profissional. É ajudá-las a dar forma para as suas idéias e conseguir os recursos para transformá-las em realidade. Isso é o que eu gosto de fazer.
Eu notei que você se emocionou ao falar sobre sua profissão. Como foi ter sido convidada para trabalhar com Peter Drucker?
É um privilégio, mas ao mesmo tempo uma pressão e uma responsabilidade enorme essa, de estender seu legado. Estamos falando de uma pessoa que tem impacto em tantas organizações, tantos países! Aos 89 anos, ele ainda leciona uma vez por semana. São três horas de aula. Geralmente ele esquece de olhar o relógio e avança. Ele está escrevendo um livro e acaba de ter um extenso artigo publicado na revista Forbes. Esse homem é absolutamente produtivo em tudo que faz.
Por que Drucker a convidou para ser seu braço-direito?
Até algum tempo atrás a Drucker School recebia executivos de nível sênior. Com o tempo o perfil dos alunos mudou. Agora há também aqueles em início de carreira. Muitos são estrangeiros. Meu papel é de integração: construir um ambiente de aprendizagem que dê conta dessa diversidade.
E a sua vida mudou desde que você aceitou o convite?
Mudou muito. Não temos tantos recursos como os de uma grande universidade pública como a UCLA (University of California at Los Angeles), onde eu trabalhava. São menos funcionários, não há tanto dinheiro. Eu praticamente fico lá sete dias por semana. E não estou fazendo o que Drucker ensina.
Como assim?
Ele acredita muito em equilíbrio entre trabalho e lazer. Ele sempre me pergunta: você está se divertindo na sua vida?
E você está se divertindo?
Estou trabalhando muito mais que na UCLA. Eu nem acho que gosto de trabalhar demais assim.
Analisando as empresas desse ponto de vista - ter prazer em trabalhar - você acha que as coisas estão melhorando ou piorando?
Ainda que lentamente, as empresas estão melhorando, mas devido ao fato de alguns se levantarem e dizerem: vocês não podem nos tratar dessa maneira. Suas vozes estão sendo cada vez mais ouvidas, mas eu acho que as empresas não teriam de passar por isso. Cabe ao líder ser sensível e propiciar condições para que os funcionários tenham prazer com seu trabalho. Isso é tarefa do líder, não é só traçar estratégias e cobrar resultados.
O estereótipo do chefe é aquele sujeito estressado, gordo, que fuma demais, que grita. Precisa ser assim?
Certa vez eu conheci um executivo de Hollywood que era a pessoa mais cheia de energia que já vi. Numa conversa de 50 minutos ele fez mais de dez outras coisas. Obviamente um sujeito como ele está submetido a muita pressão. A ansiedade pode ser alimentada pela ambição ou pela necessidade de se manter no mercado. O problema é que quando alguém está investindo toda a sua energia em algo que não tenha um significado sincero para si mesmo, não vai agüentar fazer isso por toda a vida. Veja o que muitas vezes ocorre, por exemplo, com mulheres executivas que tiveram de agir como um homem para conseguir chegar aonde queriam: um dia elas podem perceber que se anularam. E as empresas correm o risco de perder gente talentosa dessa forma.
Por que nas grandes corporações ainda há tão poucas mulheres ocupando o posto de executivo número 1?
Uma razão é que a presença de mulheres em cargos intermediários ainda é pequena para que desses níveis surja o principal executivo. A tendência é um número maior de mulheres assumir esse papel. Mas muitas, justamente quando estariam prontas para assumir a liderança da empresa, descobrem que estão sacrificando demais sua vida pessoal e dizem: não quero mais, é muito duro. Outras preferem ficar em casa com os filhos. E, olha, são muitas as histórias desse tipo.
E mais mulheres que homens tomam essa decisão?
Escolher o que traz felicidade para você? Sim, mais mulheres do que homens optam pela felicidade.
O que você acha dessas mulheres altamente capacitadas que renunciam à carreira para ficar em casa cuidando das crianças?
Eu vejo isso com simpatia.
Por quê?
Porque desempenhar papéis múltiplos é muito difícil. Não é mesmo para todo mundo. Quem não tiver estômago não vai conseguir.
E para você, como é lidar com esse dilema entre trabalho e família?
Eu tive de conciliar. Sou separada e crio meus filhos sozinha há 18 anos, desde que eram pequenos. O mais velho, Kevin, de 27 anos, acabou de se formar em Direito na Universidade de Chicago. O outro, Mark, de 23 anos, joga futebol americano e vai voltar a cursar faculdade de Ciências Sociais. Eles sempre se envolveram com meu trabalho. Nós fazíamos nossos deveres de casa juntos. Sentávamos à mesa juntos para tomar decisões domésticas. Agora eles estão grandes e podem se virar sozinhos, mas para mim começou outro capítulo. Meus pais são idosos, já têm 60 anos de casamento e precisam de apoio. Continua não sendo nada fácil.
Meu filho Lucas tem 10 anos. Como eu poderia ajudá-lo a se tornar um líder no futuro, independentemente da carreira que ele escolher?
Respeitando suas necessidades, escutando o que ele tem a dizer e compreendendo as coisas com as quais ele se importa. Dessa forma, a relação de vocês vai dar condições a ele de fazer o mesmo nos relacionamentos profissionais que vier a ter. Seu filho vai aprender a ter respeito pela dignidade das pessoas, característica fundamental no verdadeiro líder.