Revista Exame

Conheça o bilionário anônimo da bolsa brasileira

Luiz Alves Paes de Barros é um dos maiores investidores da Bovespa — mas quase ninguém sabe quem ele é. Como ele transformou 10 000 dólares numa fortuna e onde aplica hoje


	Luiz Alves Paes de Barros e a Bovespa (foto): boa parte de seus investimentos - cerca de 1,5 bilhão de reais - estão aplicados na empresa
 (Germano Luders/EXAME.com)

Luiz Alves Paes de Barros e a Bovespa (foto): boa parte de seus investimentos - cerca de 1,5 bilhão de reais - estão aplicados na empresa (Germano Luders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 18 de maio de 2014 às 09h05.

São Paulo - É num escritório despretensioso na avenida Brigadeiro Faria Lima, na zona oeste de São Paulo, que trabalha um dos maiores investidores individuais da bolsa brasileira.

Dono de uma fortuna estimada em 1,5 bilhão de reais, Luiz Alves Paes de Barros, de 65 anos, não tem nem vaga na garagem do prédio: todos os dias, deixa seu carro num estacionamento a dois quarteirões de distância e vai a pé até o edifício.

Dificilmente seria reconhecido na rua. Alves não dá entrevistas, não faz palestras nem participa de eventos do mercado financeiro. Sua rotina é vasculhar a bolsa atrás de ações baratas e participar dos conselhos de administração das empresas em que investe. Tornou-se bilionário assim, aplicando na Bovespa, sem nunca ter tido patrão ou qualquer emprego “convencional”. Começou com 10 000 dólares.

Sua grande tacada foi o investimento nas ações do banco Real, antes da venda ao holandês ABN Amro em 1999. Durante quase 20 anos, Luiz Alves, como é mais conhecido, acumulou uma participação de cerca de 5% no capital do banco — e vendeu tudo quando o ABN decidiu fechar o capital da instituição.

Recebeu 100 milhões de dólares, cerca de 40 vezes mais do que havia gasto, depois de uma dura negociação com o ABN que levou os holandeses a pagar aos acionistas minoritários um valor por ação próximo ao que foi pago ao controlador do Real, o banqueiro Aloysio Faria.

Depois disso, continuou aplicando no Banco Alfa, instituição criada por Faria após a venda (hoje, tem 16% do banco). “Ele sempre diz que a ação do Alfa é uma nota de 100 reais que custou 50”, diz um amigo. 

O mais impressionante foi o começo de Luiz Alves no mercado financeiro. Segundo contam pessoas próximas, seu capital inicial era de cerca de 10 000 dólares (algo como 80 000 dólares em valores corrigidos pela inflação).

Formado em economia pela Universidade de São Paulo e vindo de uma família de classe alta de São Paulo, Alves decidiu usar o dinheiro dado pelos parentes para aplicar em ações. Na época, havia pouquíssimos investidores individuais na Bovespa e, assim, ele se aproximou de alguns dos grandes nomes do mercado.

Em 1979, fundou com o então operador Luis Stuhlberger — hoje, talvez o gestor mais bem-sucedido do país — e outros sócios a corretora Griffo (que, mais tarde, uniu-se à corretora Hedging e foi vendida ao banco Credit Suisse em 2006). Mas ficou pouco tempo ali.

Quem o conhece diz que ele não gosta de chefes, muito menos de clientes. “Cliente é como patrão, reclama e cobra, não quero isso”, responde a quem sugere que abra uma gestora de recursos.


Também não costuma indicar ações a ninguém — dizem que ficou abalado quando uma tia perdeu dinheiro ao comprar, por recomendação sua, os papéis da americana Willys Overland, que fabricava veículos nos anos 70, antes de a companhia ser vendida à montadora Ford e ter seu capital fechado.

Hoje, suas aplicações estão reunidas num fundo, o Poland, que só aplica seu dinheiro. Desde 2003, quando foi criado, rendeu 1 000%, enquanto o Ibovespa subiu cerca de 300%.

Diário oficial

Executivos de mercado que acompanham a estratégia do Poland dizem que a principal meta de Luiz Alves é comprar ações comprovadamente baratas. “Ele precisa ver que o valor da empresa é baixo em relação aos lucros ou ao patrimônio, e essa conta tem de ser simples”, diz um deles.

Mantém poucas ações em carteira — no máximo, 15 — e costuma saber de cabeça os principais dados sobre a companhia e seu setor.

Também procura acompanhar tudo o que é publicado sobre essas empresas: quem o conhece diz que ele não começa a operar sem antes ler os jornais do dia, incluindo os balanços publicados no Diário Oficial.

No mundo ideal, as ações são compradas para ser mantidas em carteira por anos — ou décadas, como ocorreu com o Real. Em geral, o objetivo é acumular mais de 5% do capital para ter direito a um assento no conselho de administração — e, como volta e meia é o caso, brigar por seus interesses.

Sua disputa mais recente foi com a Comgás, maior distribuidora de gás natural do país, comprada pela empresa de energia e logística Cosan no ano passado.

Dono de 40% das ações preferenciais e de menos de 0,1% dos papéis ordinários (que têm direito a voto), ele conseguiu barrar a migração da empresa para o Novo Mercado, segmento que reúne as companhias mais transparentes da Bovespa, por exigir um prêmio 10% maior para converter suas ações (as empresas do Novo Mercado só podem ter ações ordinárias).

Sua justificativa era que as preferenciais recebem um dividendo 10% superior ao das ordinárias. Se a conversão fosse feita com esse critério, haveria uma diluição da participação da controladora Cosan, e a empresa acabou desistindo da operação (procurada, a companhia não deu entrevista). Por enquanto, ninguém ganhou dinheiro com a pendenga: neste ano, as ações da Comgás caíram 8%. 

Antes disso, Alves já havia conseguido, por meio de seu fundo, mudar o controle da fabricante de produtos médicos e hospitalares Cremer. A empresa tinha controle pulverizado (portanto, sem controlador definido).

Mas uma cláusula conhecida como “pílula de veneno” impedia mudanças no comando. Essa cláusula impunha um ônus financeiro a quem comprasse mais de 20% do total de ações. O grupo de acionistas minoritários, Luiz Alves entre eles, insatisfeito com o desempenho da empresa, defendia uma troca no comando.


Após uma difícil negociação, a cláusula foi invalidada e a gestora Tarpon comprou o controle da Cremer. A Tarpon foi fundada por José Carlos Magalhães, um dos sobrinhos de Luiz Alves (leia mais sobre outros parentes dele também do mercado financeiro no quadro ao lado). É possível que sua próxima batalha seja travada com a trading japonesa Marubeni, dona da brasileira Companhia Iguaçu de Café Solúvel (Alves tem 15% da empresa).

A Iguaçu dá prejuízo há dois anos. Suas ações, que são pouquíssimo negociadas, caíram 36% desde o fim de 2011. Ela contratou a empresa americana Kroll para  investigar suspeitas de fraude numa subsidiária, e Alves é responsável pela indicação de um conselheiro fiscal. Agora, segundo pessoas próximas, ele avalia se é o caso de entrar na Justiça para obter mais informações.

Luiz Alves não faz questão alguma de ser — e não é — um sujeito popular no mundo corporativo. Embora tenha ficado amigo de Aloysio Faria e de Eli Horn, dono da incorporadora Cyrela, por quem foi convidado para ser conselheiro entre 2005 e 2009, costuma trabalhar e circular sozinho. Não tem equipe — apenas uma secretária dá expediente em seu escritório.

Embora tenha 1,5 bilhão de reais, é mais conhecido como o tio do Zeca, da Tarpon. Alves geralmente recusa convites para eventos e quem o conhece diz que é comum vê-lo mal-humorado.

Ao pedido de entrevista de EXAME, respondeu, por telefone: “Acho isso muito chato, não me interessa”. Seus amigos dizem que ele não costuma frequentar restaurantes caros e que já andou várias vezes até o largo da Batata, região de comércio popular de São Paulo distante alguns quilômetros de seu escritório, para cortar o cabelo por 10 reais — em vez de pagar 70 reais a um barbeiro mais próximo.

Ele não acha que é perda de tempo. Para ele, andar vale a pena porque assim ele paga exatamente quanto um corte de cabelo deveria custar. E, lá, é improvável que encontre alguém do mercado financeiro.

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