Revista Exame

As empresas ficam na cola do consumidor com smartphones

Cada vez mais empresas usam a tecnologia dos smartphones para rastrear clientes e enviar automaticamente ofertas específicas quando detectam a presença deles nas proximidades das lojas


	Loja da Best Buy, nos Estados Unidos: mensagens para quem entra nas lojas
 (Spencer Platt/Getty Images)

Loja da Best Buy, nos Estados Unidos: mensagens para quem entra nas lojas (Spencer Platt/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 24 de agosto de 2013 às 08h00.

São Paulo - Quem entra numa das 1  500 lojas da varejista americana de eletrônicos Best Buy pode receber uma saudação pouco convencional na tela do celular — uma mensagem automática de boas-vindas seguida de um anúncio com desconto em produtos. É uma tentativa de aumentar as vendas, que caíram 15% no ano passado, para 44 bilhões de dólares.

Por trás dela está um engenhoso mecanismo de reconhecimento dos consumidores. Uma espécie de radar dentro do estabelecimento emite uma frequência de som inaudível, mas detectada por um aplicativo que os clientes podem instalar no celular, o ­Shopkick.

Atualmente, 250 000 pontos de venda nos Estados Unidos e 5 milhões de usuários estão conectados ao Shopkick, criado em 2009 com a proposta de detectar a presença de consumidores e apresentar ofertas quando eles estão mais propensos a aproveitá-las: nas proximidades ou dentro das lojas.

Segundo a consultoria Nielsen, o tempo médio de uso do aplicativo por mês entre os americanos é 2 horas e 37 minutos — e já supera o obtido pelas varejistas online eBay e Amazon.

O avanço do Shopkick representa uma tendência em ascensão — o rastreamento dos consumidores pelos pontos de venda. O uso crescente de smartphones no mundo só impulsiona o movimento. As vendas globais desses aparelhos ultrapassaram as de celulares convencionais pela primeira vez no primeiro trimestre deste ano.

De acordo com a consultoria americana IDC, foram vendidos 418 milhões de aparelhos no mundo de janeiro a março de 2013 — dos quais 216 milhões eram smartphones. A previsão é que, nos Estados Unidos, o investimento em anúncios baseados em localização chegue a 3,4 bilhões de dólares em 2015 — mais do que o triplo do registrado em 2012.

“Cada vez mais, as inovações tecnológicas se aperfeiçoam em localizar o consumidor”, disse a EXAME David Reibstein, especialista em marketing da escola de negócios Wharton, na Pensilvânia. “Nunca houve tantas possibilidades como hoje.”

Há décadas a tecnologia ajuda na observação do comportamento dos consumidores. Desde os anos 80, o pioneiro nos estudos dessa área, o consultor americano Paco Underhill, colecionou cerca de 20 000 horas de vídeos em que gravou o comportamento de clientes dentro de supermercados e traçou padrões que guiaram os varejistas e a indústria por décadas.


Nos anos 2000, popularizou-se uma espécie de versão 2.0 dessa observação. Em vez de simplesmente alguém assistir às cenas flagradas no momento da compra, programas de computador processam automaticamente informações e produzem estatísticas. É possível, por exemplo, identificar corredores mais e menos frequentados apenas num clique de computador. 

O sistema também consegue calcular quanto tempo em média os consumidores ficam em frente a cada uma das prateleiras antes de escolher um produto.

Com o rastreamento pelo celular, o monitoramento pode ser ainda mais preciso, além de permitir o diálogo com os consumidores — por meio das ofertas direcionadas. As possibilidades são tantas que suscitam a discussão sobre o limite da privacidade dos consumidores.

Neste ano, a rede varejista americana Nordstrom iniciou uma polêmica ao rastrear por diversos meses a movimentação de clientes que carregavam smartphones pelas lojas.

A companhia publicou um anúncio para avisar aos consumidores que havia decidido vigiá-los — o que aconteceu mesmo nos casos em que eles não se conectavam à rede Wi-Fi local. Apesar do aviso, a empresa foi alvo de manifestações de quem sentiu que sua privacidade tinha sido invadida.

Para não ter o mesmo problema, boa parte das empresas tem usado aplicativos em que os consumidores voluntariamente se habilitam a ser localizados e receber mensagens direcionadas, como no caso do Shopkick. Nos Estados Unidos, o aplicativo de navegação Waze também permite que as empresas enviem anúncios aos usuários.

Por exemplo, ao passar ao lado de um posto da rede Shell, o motorista pode receber um cupom com desconto no litro de combustível. Um episódio que mostra o valor dessa corrida foi a queda de braço entre as empresas de tecnologia Google e Facebook pelo Waze, aplicativo de mapas interativos com 47 milhões de usuá­rios no mundo. A batalha foi vencida em junho pelo Google, com uma oferta de 1,3 bilhão de dólares.

No Brasil, poucas empresas rastreiam seus consumidores. Mas, dada a expansão do uso de celulares no país, trata-se de um terreno fértil. A presença dos smartphones no país aumentou para 18% da população em 2012, duas vezes mais do que no ano anterior — embora o alcance ainda esteja bem abaixo da média global, de 48%.


Algumas iniciativas já começaram a surgir por aqui. O aplicativo de compras Belezuca, espécie de Shopkick brasileiro, foi lançado em maio. Entre os parceiros do Belezuca, que iniciou suas operações no Rio de Janeiro, estão algumas franquias da rede de lanchonetes Subway.

O Belezuca permite que as empresas saibam qual é o perfil dos consumidores que entram nas lojas — quando se registram voluntariamente no sistema — e enviem ofertas direcionadas para cada segmento do público.

Ficção científica 

Concorrentes já começam a aparecer. A espanhola Telefônica Vivo também está fazendo investimentos para conseguir oferecer o serviço. No ano passado, montou uma equipe brasileira dedicada a pensar exclusivamente no tema, que tem como desafio entender como explorar serviços que envolvem o recurso da localização do usuário.

Na Inglaterra, a operadora de telefonia O2 fez uma parceria com a marca de bebidas alcoólicas Bulmers. A empresa instalou radares nas proximidades de mais de 1 000 bares no país, de modo a reconhecer quem passasse nas redondezas portando um smart­phone, e enviou automaticamente uma mensagem com uma oferta para comprar a bebida com desconto.

Metade das pessoas clicou no anúncio e 25% delas compraram o produto. O que só acontecia em história de filme de ficção científica já começa a virar negócio para muita gente.

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