Revista Exame

"Estamos apanhando muito", diz o presidente da Deloitte

Após descoberta de rombos nos balanços de dois de seus maiores clientes, os executivos da Deloitte buscam preservar a imagem da empresa

Juarez Araújo, da Deloitte: duas semanas hospedado num hotel ao lado do escritório depois do anúncio das fraudes no PanAmericano (Germando Lüders/EXAME.com)

Juarez Araújo, da Deloitte: duas semanas hospedado num hotel ao lado do escritório depois do anúncio das fraudes no PanAmericano (Germando Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 1 de junho de 2012 às 09h34.

São Paulo - Ninguém escapa ileso de um escândalo contábil. Independentemente de quem sejam os culpados, perdem os donos, perdem os executivos, perdem os investidores, perdem os clientes da companhia envolvida na fraude.

No caso das auditorias, cuja função primordial é detectar distorções nas contas das empresas, ver o próprio nome no epicentro de uma crise pode se tornar um pesadelo ainda maior. No dia 9 de novembro, esse drama se materializou na operação brasileira da Deloitte Touche Tohmatsu.

Na tarde daquela terça-feira, o paulista Juarez Araújo, presidente da Deloitte no país, preparava-se para uma reunião rotineira quando recebeu a notícia do rombo de 2,5 bilhões de reais no balanço de um de seus clientes, o banco PanAmericano, descoberto pelo Banco Central.

Um mês antes, o grupo francês Carrefour também anunciara um rombo de 400 milhões acumulados pela subsidiária local nos últimos anos (nas semanas seguintes a empresa admitiria que o buraco era ainda maior, totalizando 1,2 bilhão de reais) — todos os balanços da operação brasileira foram auditados pela Deloitte entre 2001 e 2009.

Durante os 14 dias seguintes ao anúncio do PanAmericano, Araújo se hospedou num hotel perto da Deloitte para evitar perder quase 3 horas deslocando-se entre o escritório e sua casa, na Granja Viana, na Grande São Paulo.

Nesse período, antecipou em cerca de 2 horas sua chegada ao escritório (para as 7 da manhã) e trabalhou inclusive nos fins de semana. “Precisava ficar perto, não tinha tempo a perder”, disse Araújo a EXAME, em sua primeira entrevista sobre o assunto. “Estamos apanhando muito.”

Mais de um mês após o início do caso PanAmericano, Araújo afirma que ainda não restabeleceu a rotina normal. Ele já voltou para casa, mas as longas jornadas permanecem. Um dos compromissos que se somaram à já atribulada jornada de fim de ano é a ronda intensiva aos clientes.


Ele e os outros 135 sócios da Deloitte fizeram 436 visitas a empresas desde a divulgação das primeiras notícias sobre os problemas com o banco de Silvio Santos. Tudo para tentar acalmar os clientes.

Além disso, como outras partes envolvidas no escândalo do PanAmericano, a Deloitte faz parte das investigações, o que implica dedicar tempo para atender aos pedidos de dados e documentos feitos pelo Banco Central.

Todo o cuidado visa reduzir possíveis efeitos colaterais, como a perda de profissionais e de clientes, num processo que, pelos prognósticos mais otimistas, deverá ser concluído no começo de 2011. “Não perdemos ninguém”, diz Araújo.

Punição

Para organizar a reação, a Deloitte colocou em ação seu comitê de risco e reputação, formado por Araújo e outros seis sócios. No mesmo dia da divulgação da fraude no PanAmericano, eles se reuniram por 7 horas para elaborar um plano.

Em primeiro lugar, determinaram a checagem dos procedimentos adotados pelos auditores nos balanços do banco. (No caso do Carrefour, a auditoria entendeu que o rombo resultara “da decisão da administração do Carrefour de alterar a forma de contabilizar procedimentos” e, assim, dispensava investigação.)

A conclusão dos auditores é que não houve falha. “Todos os procedimentos foram realizados corretamente”, diz Araújo. “A responsabilidade de passar as informações certas era dos administradores.”

Um esforço intensivo de comunicação para tranquilizar funcionários e clientes recebeu prioridade a partir daí. No dia seguinte à revelação da fraude no banco, todos os sócios foram convocados a participar de uma conferência por telefone para esclarecer dúvidas. Em dois encontros posteriores na sede, os sócios definiram as orientações que deveriam ser repassadas aos 4 500 funcionários.

Além das visitas aos clientes, a Deloitte enviou um esclarecimento sobre sua atuação, por e-mail e carta, a 7 000 pessoas das 5 000 empresasclientes com as quais a firma tem relacionamento no país (tanto na área de auditoria quanto na de consultoria). Dois anúncios também foram publicados em seis jornais brasileiros — um a respeito do caso do PanAmericano e outro sobre o Carrefour.


Evitar estragos na imagem, nos casos das auditorias, tem se mostrado tão crucial quanto provar a própria inocência. Nesse ramo, não basta ser correto. É preciso parecer correto. Os escândalos envolvendo companhias como Enron e WorldCom no início da década passada são emblemáticos disso.

Embora as auditorias não tenham sofrido punições de órgãos oficiais, elas pagaram um preço alto. No caso da Arthur Andersen, que auditava os balanços da Enron, a mancha na reputação culminou com o fim de suas atividades em 120 países. Em maio de 2005, quando já não operava, a Arthur Andersen foi absolvida numa investigação que levou três anos.

Na recente quebradeira que assolou Wall Street, também sobrou para os auditores. Hoje, a Ernst&Young vem sendo investigada pela Accountancy and Actuarial Discipline Board (AADB), associação independente britânica, pela conduta na avaliação das contas do quebrado Lehman Brothers.

Na Deloitte, os anúncios alteraram o humor de um ano que poderia entrar para a história por razões mais lisonjeiras. Em outubro, a Deloitte declarou que tomou a liderança mundial da PricewaterhouseCoopers, por uma diferença mínima de 9 milhões de dólares, somando um faturamento de 26,6 bilhões de dólares no ano fiscal de 2010, encerrado em maio.

Boa parte desse crescimento se deve a países como o Brasil. Com receitas de 738 milhões de reais, a operação brasileira mantém uma expansão média de 20% ao ano — o dobro da taxa global. A missão de Araújo é manter esse índice, a despeito da turbulência atual. “Não tem sido fácil”, diz ele. “Mas tenho dito a todos: paciência, essa onda vai passar.”

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