Revista Exame

Para a Walmart, está difícil copiar a matriz

A subsidiária brasileira do Walmart tenta aplicar no país a mesma política de preços que fez da empresa criada por Sam Walton a maior rede de varejo do mundo — mas esbarra em atritos com fornecedores e na resistência dos consumidores

Marcos Samaha, do Walmart: o fim das promoções afugentou os clientes das lojas (Germano Lüders/EXAME.com)

Marcos Samaha, do Walmart: o fim das promoções afugentou os clientes das lojas (Germano Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 1 de setembro de 2011 às 06h00.

São Paulo - Na relação tradicionalmente tensa entre varejistas e fabricantes, qualquer mudança nas regras do jogo costuma dar origem a uma série de negociações extenuantes. O executivo paulista Marcos Samaha, de 44 anos, presidente do Walmart no Brasil, tem sentido na pele até que ponto pode chegar essa queda de braço.

Desde janeiro, ele vem tentando estabelecer por aqui a mesma política de preços que fez da matriz, fundada em 1962 por Sam Walton, a maior varejista dos Estados Unidos: oferecer preços menores do que a concorrência diariamente sem precisar lançar mão de ofertas pontuais.

Na prática, isso implica negociar descontos regulares maiores com os fornecedores — o que, como é de imaginar, não agrada a todos eles. Um dos casos mais emblemáticos envolveu a Pepsico, terceira maior empresa de alimentos do mundo e dona de marcas como Pepsi, Toddy e Elma Chips.

No final de maio, depois de tentar, sem sucesso, aumentar os preços cobrados do Walmart, a Pepsico interrompeu o fornecimento de seus produtos à rede. Em retaliação, a varejista determinou a retirada dos salgadinhos da Pepsico das gôndolas localizadas ao lado dos caixas, um dos locais mais disputados dos supermercados.

A situação levou uma semana para ser normalizada — e ambos os lados já haviam perdido vendas. “Somente depois de mostrar que o rea­juste seria repassado aos demais varejistas é que chegamos a um acordo”, afirma Romulo Dantas, vice-presidente comercial da Pepsico. 

Foi justamente para tentar se antecipar a embates desse tipo que Samaha iniciou as negociações com os fornecedores do Walmart bem antes do lançamento oficial do projeto, em janeiro deste ano.

Um grupo de cinco diretores de sua área comercial passou os últimos nove meses de 2010 visitando empresas como Ambev, Kraft e Nestlé para explicar os ganhos decorrentes do novo sistema, sobretudo no que diz respeito à logística. Sem as promoções, diziam eles, não seria mais necessário contratar caminhões extras para dar conta de picos nas entregas.

A princípio, 120 fornecedores foram procurados e toparam participar do projeto — número que subiu para 300 ao longo deste ano. O problema é que, para parte deles, os resultados ainda não apareceram.

“Com o novo sistema, consigo aproveitar melhor a frota, já que não preciso entregar 70% dos produtos no fim de semana”, diz Rafael Oliveira, diretor de vendas da Ambev. “Mas as vendas no primeiro semestre ficaram 5% abaixo das registradas nas outras redes na Região Sul.”


Há um ano no cargo e há 13 no Walmart, Samaha tem pela frente um desafio enorme: mudar a forma como os brasileiros fazem suas compras. Uma combinação de anos de hiperinflação com baixo poder aquisitivo fez com que os consumidores se habituassem a aproveitar promoções pontuais para estocar em casa produtos com preços baixos — daí empresas como Pão de Açúcar e Carrefour se utilizarem tão fortemente desse expediente.

Embora o fantasma da hiperinflação tenha ficado para trás e a renda média do brasileiro tenha aumentado 20% nos últimos cinco anos, um recente levantamento realizado pela consultoria Kantar World Panel com 8 200 domicílios no país mostra que pelo menos um quinto das compras ainda são motivadas por promoções pontuais.

“Nosso trabalho é quase pedagógico”, diz Samaha. “Queremos mostrar que é possível economizar mesmo sem as ofertas.” Os primeiros resultados, no entanto, apontam para um trabalho de evangelização mais difícil que o esperado.

O fluxo de clientes nas lojas do Walmart no país caiu 8% e 4,6% no primeiro e no segundo trimestre, respectivamente, em comparação com os mesmos períodos de 2010. “Essa queda inicial estava dentro do esperado, no segundo trimestre as vendas cresceram e iremos compensar até o final do ano”, diz Samaha.

A dificuldade de Samaha em replicar no Brasil a estratégia de “preço baixo todo dia” da matriz está relacionada ao tamanho do Walmart aqui. Diferentemente do que acontece nos Estados Unidos e no México, onde detém a liderança, a rede ocupa a terceira posição no mercado brasileiro, com vendas de 22 bilhões de reais e 11% de participação.

“Para realizar uma mudança de cultura como essa é fundamental que o Walmart tenha escala”, diz Daniela Bretthauer, analista de varejo do banco Raymond James. Ao mesmo tempo que negocia com fornecedores, Samaha enfrenta outros desafios dentro de casa.

Desde que assumiu a presidência, demitiu 470 funcionários da área administrativa, entre eles 20 diretores e oito vice-presidentes — mesmo assim, o Walmart conta com quatro vezes mais executivos no alto escalão do que o Pão de Açúcar.

Recentemente, voltaram a circular rumores de que o Walmart estaria negociando a compra da operação local do Carrefour, algo negado pelo presidente mundial da empresa, Lars Olofsson, em sua visita a São Paulo no início de agosto. Samaha, porém, é menos enfático na negativa. “Nunca deixamos de analisar oportunidades”, diz ele. Os fornecedores que o digam.

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