Revista Exame

As mulheres estão fazendo falta no Japão e na Coreia

Japão e Coreia, os dois países mais ricos da Ásia, começam a enfrentar um problema antigo — estão sendo forçados a dar às mulheres um papel na economia

Aeromoças em Tóquio: metade das mulheres japonesas não trabalha  (Kiyoshi Ota/Getty Images)

Aeromoças em Tóquio: metade das mulheres japonesas não trabalha (Kiyoshi Ota/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 24 de janeiro de 2014 às 05h00.

São Paulo - A Coreia do Sul vem sucessivamente surpreendendo o mundo com sua capacidade de se reinventar. De uma economia subdesenvolvida nos anos 70, a Coreia virou um país rico em três décadas.

Hoje, é o sétimo maior exportador mundial graças à compe­titividade­ de sua indústria. A força coreana é tamanha que, mesmo em 2013, um ano difícil para a maioria dos países ricos, cresceu quase 3%. A expectativa para 2014 é de cerca de 4% de expansão do PIB. Parece, em suma, estar tudo bem — mas não está.

Olhando para a frente, a economia coreana é ameaçada por um problema gravíssimo: a demografia. Nenhum país envelhece tão rápido. A partir de 2018, a força de trabalho coreana começará a diminuir.

Essa é, de longe, a maior fonte de preocupação dos dirigentes coreanos. E o que aumenta sua angústia é um dado que beira o bizarro — metade das mulheres coreanas de 15 a 64 anos não trabalha. São 3,5 milhões de pessoas que poderiam resolver os problemas demográficos do país e empurrar sua economia pelas próximas décadas. Mas elas continuam em casa, e fazem cada vez mais falta. 

A baixa participação feminina no mercado de trabalho é uma realidade em boa parte da Ásia, assim como na África e no Oriente Médio. A situação da Coreia do Sul se assemelha à do Japão, onde também metade das mulheres está fora da força de trabalho.

Nesse critério, os dois países só perdem para a Malásia e para a Índia, onde 66% e 77%, respectivamente, do total de mulheres com idade de 15 a 65 anos não trabalham. Mas, ao contrário da maioria das mulheres de nações asiáticas emergentes, as coreanas e as japonesas constituem um contigente altamente educado e qualificado.

Sua ausência reforça uma situação de desigualdade entre homens e mulheres inimaginável para o grau de desenvolvimento das duas economias.

De acordo com um ranking de desigualdade de gêneros elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, no qual são avaliados 136 países, Japão e Coreia do Sul aparecem na 105ª e na 111ª posição, respectivamente. As mulheres coreanas ganham 40% menos do que os homens, a maior diferença entre os países ricos. 

É obviamente uma questão cultural, com a qual esses países convivem há séculos — a diferença é que, no caso de Japão e Coreia, as forças da demografia tornam a complacência inaceitável. “As mulheres foram desencorajadas de participar do mercado de trabalho e incluí-las não é uma questão de curto prazo”, diz Dwight Perkins, professor de política econômica na Harvard Kennedy School.


Nos últimos anos, tanto Japão como Coreia adotaram legislações específicas para promover a maior participação das mulheres, como dar estabilidade de emprego durante a licença-maternidade, mas os resultados ainda não são significativos.

Pressionados pelo rápido envelhecimento de suas populações, o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, e a presidente da Coreia do Sul, Park Geun-Hye, já sabem que têm de atacar o problema. A promessa mais recente veio de Abe, que pretende criar 400 000 vagas em creches até 2017.

Ele quer também criar incentivos para que as mulheres ocupem 30% dos cargos de liderança nas empresas e no governo. Se de fato essas medidas forem implementadas, o Japão pode entrar numa mais que desejada rota de crescimento.

Um estudo da consultoria Booz&Co. aponta que, se a participação feminina no mercado de trabalho fosse igualada à dos homens, o PIB japonês poderia ser ampliado em até 9% até 2020. Numa economia de 5 trilhões de dólares, é uma fábula de riqueza represada.

A inserção das mulheres no mercado de trabalho é relativamente recente e problema semelhante já foi enfrentado por outras nações. Nesse sentido, a Holanda é considerada um dos melhores exemplos. Em 30 anos, ampliou de 35% para 80% a participação das mulheres.

Contribuíram para o resultado mudanças na lei, como flexibilização da jornada de trabalho, estabilidade de emprego e subsídios às empresas para o pagamento de salários durante o perío­do de licença-maternidade.

No caso da Ásia, o desafio cultural é considerado uma barreira mais difícil de ser superada do que em outros lugares. “A maioria delas ainda deixa o mercado de trabalho após o primeiro filho”, diz o economista Ku-Hyun Jung, professor da escola de negócios coreana Kaist e autor do livro Where Are We Heading to? (“Para onde estamos indo?”, numa tradução livre).

A questão do emprego, sem dúvida, é um dos grandes desafios de qualquer governante. A maioria costuma lidar com a escassez de postos de trabalho e as agruras do desemprego, mas administrar o extremo oposto é igualmente difícil. A falta de mão de obra implica salários em alta e perda de produtividade.

A Coreia do Sul tem, hoje, a menor taxa de desemprego de sua história, de 2,9%. O Brasil, curiosamente, vive momento semelhante nesse aspecto. Mas os motivos não poderiam ser mais diferentes. Aqui, ao contrário de lá, há escassez de trabalhadores qualificados, resultado de falta de investimento em educação — algo que Japão e Coreia resolveram décadas atrás.

O Brasil, é bem verdade, também tem muito a avançar na inserção das mulheres no mercado — apenas 60% delas trabalham. Mas o principal problema por aqui, todos concordam, é a falta de gente preparada. Por lá, as mulheres já são bem formadas: basta incentivá-las a trabalhar. O desafio de Japão e Coreia é grande. Mas, visto ao lado do desafio brasileiro, nem parece tão difícil assim.

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