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A disputa da interatividade na TV

Depois de dois anos de espera, vem aí o sistema de interatividade da TV digital - e a competição com a internet promete ser dura

Novela 2.0: informações extras sobre a programação vão mudar a experiência da televisão (Nana Moraes)

Novela 2.0: informações extras sobre a programação vão mudar a experiência da televisão (Nana Moraes)

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Da Redação

Publicado em 15 de março de 2011 às 15h36.

Ano de Copa do Mundo, no Brasil, é época de trocar de TV. Quem for às lojas a partir deste mês procurando os mais modernos aparelhos vai encontrar novidades não apenas nos televisores que oferecem imagens 3D ou naqueles equipados com a tecnologia LED. Os compradores precisarão decidir - nas lojas ou depois que chegarem em casa - como vão usar as novíssimas TVs e seus serviços interativos, uma das grandes promessas de novidade do sistema digital implantado no país. O sistema que promove a interatividade na TV foi aprovado no começo de abril pela União Internacional de Telecomunicações. Agora, há duas possibilidades de conectividade pela televisão. O embate da vez vai colocar frente a frente os padrões de internet e das emissoras de TV aberta, numa disputa que lembra a divisão entre as fitas de vídeo Betamax e VHS, na década de 80, e a recente oposição entre os padrões Blu-ray e HD-DVD para os discos digitais de alta definição.

O Ginga, como foi batizado o sistema de interatividade da TV digital brasileira, foi prometido para os primeiros meses após o início das transmissões digitais, em dezembro de 2007. Mas o padrão demorou muito mais do que o previsto para ficar pronto e a internet saiu na dianteira. Em parceria com o portal Terra, a fabricante coreana Samsung lançou, em março do ano passado, um modelo que permite que alguns conteúdos da internet sejam acessados diretamente pelo televisor. Outros fabricantes, como a Sony, lançaram produtos semelhantes. Hoje, a navegação permite acesso a sites de notícias esportivas, como o do canal ESPN, além de serviços como Skype e Twitter. A lista não para de crescer. As empresas já estabelecidas na internet desenvolvem versões de seus sites para a tela grande com o objetivo de conquistar outras telas além da dos computadores.

"É um modelo que se assemelha mais ao padrão que a Apple usa para oferecer seus aplicativos via iPhone", diz Daniel Simmons, analista da Screen Digest, empresa especializada em pesquisas de mídia.


Quem acessa a internet pela TV da sala de estar não assiste à programação das emissoras. Isso significa que há mais um competidor pela atenção dos telespectadores. Quando o televisor se torna essencialmente um novo monitor de computador, as empresas de internet entram diretamente na briga pela audiência em horários e locais da casa que eram cativos das empresas de mídia tradicionais. É por isso que as emissoras querem que a interatividade esteja atrelada à sua programação.

AÍ ENTRA EM CENA O GINGA. A coreana LG foi a primeira a lançar um aparelho que dá acesso a esse novo sistema. O modelo, que custa cerca de 4 000 reais (1 000 a mais que um de alta definição), vem equipado com um botão especial no controle remoto. Ao selecionar esse comando, a TV mostra conteúdos complementares ao programa que está sendo exibido no momento. O Ginga é uma plataforma de software. Hoje, os aplicativos que rodam nas TVs estão sendo criados prioritariamente pelas emissoras de televisão aberta, como Globo, Record, SBT e MTV. "Mais de 30 programas passaram por testes nos últimos dois anos em nossos laboratórios e estão prontos para rodar", diz Marcelo Zuffo, professor do departamento de engenharia de sistemas eletrônicos da Universidade de São Paulo.

A expectativa é que metade dos 6 milhões de televisores de tela fina fabricados neste ano venha com o sistema Ginga embutido, em geral os modelos top de linha. A realidade é que a adoção da TV digital no país, e especialmente do sistema interativo, deve caminhar a passos lentos. Quem tem um modelo mais antigo e acessa a TV digital com um conversor externo ou pela TV paga não poderá, por enquanto, contar com esses recursos de interatividade. E a venda dos conversores externos também não é muito expressiva. Apesar de o Fórum Nacional de TV Digital comemorar os resultados dizendo que a mudança é lenta e gradual, estima-se que, até o final do ano passado, aproximadamente 2 milhões de sintonizadores tenham sido vendidos, e esse número inclui aqueles que são acoplados a computadores e os que são embutidos em alguns modelos de telefone celular.


A disseminação do sistema Ginga, porém, é apenas um dos desafios a superar. Existe outro fundamental: a criação de aplicativos que seduzam os telespectadores. "Conteúdo de boa qualidade é fundamental", afirma Simmons, da Screen Digest. A Globo investe especialmente em ferramentas de informações complementares a seus programas. Nas novelas, haverá informação extra sobre os capítulos anteriores ou dados adicionais de cenas. Outra ideia é criar enquetes que possam ajudar o autor a definir os rumos da história. Nas transmissões esportivas, o torcedor pode ter acesso às estatísticas da partida. No reality show Big Brother Brasil, uma das ideias é oferecer na própria TV o diário de um participante. "Estamos no início dos testes e vamos evoluir para uma experiência interativa mais enriquecedora", afirma Raymundo Barros, diretor da Central Globo de Engenharia.

As duas opções - ter uma programação televisiva verdadeiramente interativa ou ver o conteúdo da web na TV - não são excludentes. É possível imaginar um futuro próximo em que, entre um canal e outro, o telespectador dê uma espiada em sua página do Orkut ou no Twitter sem deixar o sofá nem esticar o braço para alcançar o notebook. Mas o fato é que a experiência de assistir à televisão está mudando, e quem tem de defender o terreno do ataque são as emissoras tradicionais. Na última edição da maior feira de emissoras de televisão do mundo, a National Association of Broadcasters, realizada nos Estados Unidos, a discussão prioritária girou em torno da adaptação das emissoras às novas formas de fazer televisão - e negócios - usando novas tecnologias. "As radiodifusoras têm medo, mas deveriam abraçar as mudanças", disse o futurista Ray Kurzweil, interlocutor de Bill Gates e Steve Jobs. A chance delas é apostar em sistemas parecidos com o Ginga para continuar garantindo que a receita publicitária caia em seu bolso - em vez de ser pulverizada entre as infinitas concorrentes que hoje estão na web.

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