Revista Exame

Brasil está ficando para trás, diz diretor do Morgan Stanley

Para Ruchir Sharma, do banco Morgan Stanley, as economias do México e da Índia, países hoje mais abertos a reformas, deverão se sair melhor do que a do Brasil nos próximos anos


	Enfim, juntos? Resta ver se o banco de desenvolvimento anunciado pelos presidentes de Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul vai vingar
 (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Enfim, juntos? Resta ver se o banco de desenvolvimento anunciado pelos presidentes de Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul vai vingar (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

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Da Redação

Publicado em 31 de julho de 2014 às 08h30.

São Paulo - Como diretor de mercados emergentes do banco americano Morgan Stanley, o indiano Ruchir Sharma administra uma carteira de 25 bilhões de dólares em investimentos nos países em desenvolvimento. Parte de seu trabalho é percorrer o mundo para observar a economia real desses países.

Em julho, ele visitou o Brasil, onde se encontrou com figuras como o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, coordenador das propostas econômicas da campanha de Aécio Neves à Presidência, e assistiu à final da Copa do Mundo no Maracanã.

“Não poderia deixar de ver um jogo da Copa no ­país do futebol”, afirma Sharma. Nesta entrevista a EXAME, ele fala sobre quais economias poderão se destacar nos próximos anos e como o Brasil correrá o risco de ficar para trás caso não empreenda reformas estruturais. 

EXAME - Até há pouco tempo, o Brasil era a bola da vez para os investidores. Atualmente, essa posição foi perdida para outros emergentes. Por que é tão difícil se manter como um dos favoritos do mercado?

Ruchir Sharma - O principal motivo está na forma como os ciclos políticos funcionam. Quando a economia de um país vai bem, seus governantes ficam complacentes e acabam descuidando das reformas necessárias ao desenvolvimento do ­país. Essas reformas costumam acontecer nos momentos de crise.

Foi assim na década de 90, quando os países emergentes em­preenderam mudanças que levaram a mais abertura comercial, ao fortalecimento dos mercados e a ajustes fiscais.

Na última década, no entanto, a valorização do preço das commodities proporcionou uma fase de crescimento fácil. Resultado: as reformas foram deixadas de lado e agora a economia desses países estagnou. Isso afasta os investidores.

EXAME - Agora os emergentes estão crescendo menos. Isso facilita a retomada da agenda de reformas?

Ruchir Sharma - Estamos vendo em alguns países a chegada de líderes com um discurso favorável às reformas. Eles estão se tornando os queridinhos do mercado. Entre os exemplos eu destacaria Filipinas, Índia, Indonésia e México.

­Essas economias têm boas chances de se destacar nos próximos três a cinco anos. Perto deles, os governantes de países como Rússia, Turquia e África do Sul parecem acomodados.

EXAME - O presidente do México, Enrique Peña Nieto, assumiu o cargo há pouco mais de um ano e meio. Desde então, levou adiante algumas reformas na economia. Mas seu governo é cada vez mais impopular entre os mexicanos. Por quê?

Ruchir Sharma - Até agora, o México falhou na tarefa de entregar crescimento de curto prazo. Peña Nieto deveria se empenhar um pouco mais nisso. Desse modo, afastaria o risco de sua imagem ser muito danificada enquanto os resultados das reformas de longo prazo não chegam.

O desapontamento da população vem daí. Veja o caso do primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe. Ele tomou uma série de medidas para bombar o crescimento de curto prazo, e sua popularidade vai bem. O ideal seria mesclar as reformas mais estruturais com iniciativas de resultado mais imediato.

EXAME - Como o Brasil pode recuperar a confiança dos investidores? 

Ruchir Sharma - O Brasil sempre despertará interesse por causa do tamanho de sua economia. Agora os grandes investidores estão voltando a olhar com mais atenção para o Brasil porque sentem a possibilidade de uma mudança política no país. Algo semelhante acontece com a Argentina.

Existe um sentimento de que o kirchnerismo está perto do fim. Comprar ativos argentinos, hoje extremamente baratos, pode ser um bom negócio. A mudança política passou a ser determinante para tornar um mercado mais ou menos atraente.

EXAME - O governo brasileiro atribui a desaceleração da economia à crise de 2008. Isso é razoável?

Ruchir Sharma - Seria razoável se admitisse que os anos de crescimento acelerado na última década ocorreram por causa dos aumentos no preço das commodities. O que a maioria dos governos faz é tomar para si o crédito quando a economia vai bem e culpar o cenário internacional quando as coisas vão mal.

Dito isso, nos últimos três anos, o crescimento anual médio de mercados emergentes caiu de 7,5% para 4%, enquanto a expansão da economia brasileira passou de 4% para 1%: uma queda bem mais acentuada­.

EXAME - Na última década, as economias emergentes impulsionaram o crescimento global. Isso deverá mudar nos próximos anos?

Ruchir Sharma - Sim. As fontes de crescimento deverão ser mais diversificadas. E não há motivo para esperar uma onda a ser aproveitada por todos os emergentes. Esses países hoje respondem por 35% da economia e 80% da população do mundo, mas não dá para tratá-los como um grupo homogêneo.

Eles são considerados emergentes por terem um produto per capita abaixo de 25 000 dólares. E, fora isso, há pouca coisa em comum. Caso queiram se fortalecer em conjunto, o que podem fazer é construir alianças regionais, como a Aliança do Pacífico, que foi formada por México, Peru, Chile e Colômbia. 

EXAME - O Brasil tentou fazer isso com o Mercosul. Por que não deu certo? 

Ruchir Sharma - O Brasil escolheu mal os parceiros. Mais importante, porém, é o fato de o país ter uma infinidade de barreiras ao comércio exterior, como os impostos sobre importação, que são muito pesados. É uma das economias mais fechadas do mundo.

A média de comércio externo em relação ao PIB dos emergentes está perto de 100%. No Brasil, é de cerca de 30%. O país precisa ser mais internacional. Mesmo que estivesse com bons parceiros, seria difícil se beneficiar da integração regional. 

EXAME - E o que esperar de iniciativas como a criação de um banco de desenvolvimento anunciada pelos presidentes de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul?

Ruchir Sharma - Não vejo o banco dos chamados Brics como uma alternativa viável, porque as demais economias emergentes não levarão esse banco a sério. Por que o México aceitaria o Brasil como representante da América Latina? A economia da Nigéria é do tamanho da sul-africana. Você acha que eles vão aceitar a África do Sul como o principal representante do continente?

EXAME - O novo banco não poderia beneficiar pelo menos os cinco países que são membros desse bloco?

Ruchir Sharma - Talvez, mas isso só será realmente testado no caso de uma crise. Por enquanto, o banco de desenvolvimento dos Brics nada mais é do que uma boa estratégia para pressionar por mudanças na hierarquia de instituições como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial.

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