Revista Exame

Para a rede de lojas de brinquedos Ri Happy, crescer é divertido

A Amazon e os jogos online aniquilaram o varejo de brinquedos nos Estados Unidos. No Brasil, a Ri Happy aposta em divertir os clientes para crescer

Carlos Fernandes, da Ri Happy: lojas mais divertidas para pais e filhos (Germano Lüders/Exame)

Carlos Fernandes, da Ri Happy: lojas mais divertidas para pais e filhos (Germano Lüders/Exame)

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Denyse Godoy

Publicado em 18 de março de 2019 às 05h05.

Última atualização em 18 de março de 2019 às 05h05.

rápido avanço dos joguinhos online e dos tablets vem tirando o sossego dos varejistas de brinquedos em todo o mundo. Nos Estados Unidos, principal mercado para brinquedos, a septuagenária rede Toys “R” Us pediu falência, sufocada por 5 bilhões de dólares em dívidas, e fechou 700 pontos de venda em 2018. De olho nas consequências críticas que a falta de modernização pode trazer, a rede Ri Happy, a maior do Brasil, com 276 lojas (incluindo as da marca PBKids, adquirida em 2012), está correndo para aumentar a digitalização de sua operação e reformulando suas unidades.

A ideia é oferecer mais informação aos pais e entretenimento às crianças. “Continuamos com nosso carro-chefe, que são os brinquedos, mas enxergamos outras avenidas de crescimento. Não existe outra maneira de sobreviver no varejo”, diz Carlos Fernandes, diretor de operações da companhia, controlada pelo fundo de investimento americano Carlyle Group.

O Carlyle comprou a Ri Happy em 2012. Em março do ano passado, suspendeu mais uma vez a oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) em meio à hesitação dos investidores por causa das incertezas macroeconômicas e dúvidas quanto à capacidade da Ri Happy de se adaptar aos novos tempos. Na transação, estudada desde 2013, o fundo esperava captar 860 milhões de reais com a venda de até 80% da empresa, estimando o valor de mercado da Ri Happy entre 1,2 bilhão e 1,7 bilhão de reais. Em 2017, a rede havia faturado 1,7 bilhão, 4% mais do que em 2016, com alta de quase 7% nos ganhos antes de juros, impostos, depreciação e amortização, para 141 milhões de reais.

O prejuízo de 6,5 milhões de reais em 2016 virou um lucro de 16,3 milhões no ano seguinte. Não foi nada espetacular, mas pode ser considerado uma vitória no Brasil de baixas expectativas daquele ano. Porém, chamava a atenção o fato de que apenas 5% das receitas da empresa vinham do comércio online. Embora a Ri Happy prometesse medidas para impulsionar o crescimento, os investidores ficaram receosos de colocar dinheiro na empresa sem saber se os projetos dariam certo.

Captar recursos para acelerar a expansão é uma das prioridades do IPO, mas a companhia decidiu começar logo a reformulação para não perder o bonde. Assim, também poderá se destacar na longa lista de candidatas a vender ações na bolsa nos próximos meses, possibilitando ao Carlyle finalmente embolsar os ganhos de sua aposta na rede. Além da Ri Happy, os investimentos mais relevantes do fundo no país estão na Rede D’Or São Luiz, de hospitais, na universidade Uniasselvi e na empresa de serviços de assistência Tempo Participações. Em 2016, o Carlyle saiu da operadora de turismo CVC ao vender, junto com o fundador da companhia, Guilherme Paulus, uma fatia de 45% por 1,2 bilhão de reais. Neste ano, a bolsa B3 espera abrigar 30 operações, entre IPOs e ofertas de capital subsequentes. 

A Ri Happy foi criada em 1988. Cansado de ter problemas com inquilinos, o pediatra Ricardo Sayon pediu à mulher, Juanita Sayon, que montasse um negócio para ocupar um imóvel de sua propriedade no bairro dos Jardins, na capital paulista. O nome da empresa surgiu de uma brincadeira de Juanita: significava “para deixar o Ricardo feliz”. No ano seguinte, ele chamou o primo Roberto Saba para a sociedade. Depois de abrir quatro pontos de venda e acumular prejuízos, em 1991 a dupla decidiu sair do ramo.

Sayon foi pessoalmente à Estrela, fabricante de onde vinham 70% das mercadorias da Ri Happy, para negociar a devolução do estoque. Foi convencido por um diretor da empresa de brinquetos, Hans Becker, a perseverar. Estudou gestão, largou a medicina e expandiu a rede para o Brasil inteiro, investindo na qualidade do atendimento. Os vendedores eram treinados para dar orientações sobre que tipo de brinquedo comprar dependendo da idade e dos gostos da criança. Sayon deixou a companhia definitivamente em 2014, dois anos depois da venda para o Carlyle por um montante não divulgado. Mas o princípio de municiar o consumidor de informações continua sendo a base da estratégia.

A primeira vertente do plano da Ri Happy para apressar sua modernização é aumentar a ligação dos pontos de venda físicos com o site. A rede vai permitir que o cliente adquira uma mercadoria online e retire na unidade que desejar. A compra por esse processo poderá até ser feita de dentro da loja, por meio de totens, dando ao consumidor acesso aos itens que não fazem parte do sortimento oferecido pela filial.

A Ri Happy passará, ainda, a despachar os produtos adquiridos na internet a partir da unidade mais próxima da casa do cliente, reduzindo os prazos de entrega. O sistema está em teste em cinco lojas de São Paulo e deverá atingir 30 unidades até o fim do ano, melhorando a penetração da companhia especialmente nas regiões Norte e Nordeste. O Acre é o único estado em que a rede não está presente nem com unidades próprias nem com franquias, que são atualmente 41, o correspondente a 15% do total de lojas.

CVC: o fundo Carlyle saiu da operadora de turismo em 2016, ao lançar ações na bolsa | Germano Lüders

A plataforma de vendas online está sendo reformada para oferecer itens de parceiros que não estão disponíveis nas lojas físicas, a exemplo dos videogames. Também vai oferecer serviços como troca de brinquedos usados e contratação de bufês de festas infantis. A rede tem aumentado a propaganda em mídias não tradicionais, como o Instagram, e investido em um canal próprio de brincadeiras e curiosidades no YouTube. O orçamento para a digitalização deverá totalizar de 30 milhões a 40 milhões de reais até 2020, o equivalente a até 2,5 vezes o lucro de 2017. Os dados referentes a 2018 não foram divulgados.

O faturamento do segmento cresceu 7,5% em 2018 em comparação a 2017, para 6,9 bilhões de reais, segundo dados da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos. Pela concorrência com a internet, cujas vendas subiram de 1,7% do total, em 2011, para 22,4%, em 2018, as lojas especializadas vêm fechando as portas. Depois que a PBKids foi comprada pela Ri Happy, não restou nenhuma outra grande rede com alcance nacional. Além de competir com supermercados e magazines, a líder no mundo real precisa, também, enfrentar a ameaça do gigante digital Amazon, que no ano passado expandiu a atividade no país para além dos livros. A Amazon é a segunda maior varejista de brinquedos dos Estados Unidos, atrás da rede de supermercados Walmart.

Outro pilar da reformulação da Ri Happy é a melhoria da experiência nas lojas físicas. No ano passado, a empresa abriu 19 lojas. Os funcionários estão sendo treinados para divertir e brincar com as crianças usando os produtos à venda. As dez unidades dedicadas a bebês vêm recebendo atenção especial, já que podem ser o início do relacionamento da família com a rede. Até o fim de março, as cinco unidades localizadas no Rio de Janeiro serão remodeladas como piloto de um projeto para personalizar o atendimento ao consumidor, com vendedores capazes de dar dicas aos pais desde a gravidez.

As filiais regulares estão ampliando as linhas de itens geeks, de papelaria e de produtos de beleza e maquiagem infantil. A receita seguida pela Ri Happy é parecida com a de outras varejistas mundo afora. A americana FAO Schwarz, fundada em 1862 e lançada à fama mundial depois que Tom Hanks apareceu tocando um piano gigante com os pés — em cena do filme Quero Ser Grande, de 1988 —, voltou à ativa em 2018 após três anos fechada. Era parte do grupo Toys “R” Us até quebrar em 2015. Agora, planeja abrir uma loja de 2.600 metros quadrados em Pequim com entretenimento para pais e filhos. “Produtos se tornaram commodities. O que faz a diferença são o serviço e a experiência”, diz Jean Paul Rebetez, sócio da consultoria de varejo GS&Consult. As lojas de brinquedos, enfim, precisam ser divertidas. 

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