Como montar uma fábrica de gente (Marcelo Calenda/EXAME)
Da Redação
Publicado em 15 de julho de 2014 às 20h21.
1- Em boa parte das empresas existe o discurso de que a contratação de “jovens talentos” é uma importante maneira de oxigenar a estrutura e formar a próxima geração de líderes. Mas o que vejo, na verdade, é que muitos dos participantes de programas de trainees acabam soterrados sob rígidas estruturas hierárquicas e poucos podem, de fato, mostrar a que vieram. Qual é o sentido de manter discurso e prática tão desconectados? Larissa Correa, de São Paulo
O que é o "Programa de Trainees" em sua empresa? Usamos as mesmas palavras para significados diferentes. O programa de trainees da AmBev, que considero modelo, nada tem a ver com o treinamento tradicional conduzido todos os anos por muitas empresas. A AmBev aloca aproximadamente 30 vagas anuais para seu programa de trainees e os recruta interna e externamente — daí a primeira diferença.
Uma pessoa pode entrar na AmBev e depois de um ano decidir concorrer ao programa. As pessoas escolhidas para fazer parte desse time recebem treinamento especial intensivo, no qual têm a chance de conhecer a fundo todas as áreas da empresa, e são rapidamente testadas em cargos de gerência para verificar sua capacidade de liderança.
Se o profissional se mantém alinhado aos valores da empresa, bate suas metas e se prova líder, ele continuará subindo na hierarquia. Hoje, dos exparticipantes do programa, 51 são sócios da companhia e 16 estão no exterior em funções-chave. A maioria dos presidentes da ABInBev em diversos países são ex-alunos do programa de trainees. Para que essa fábrica de líderes funcione bem é necessário que haja boa seleção do pessoal, treinamento excepcional e a abertura de oportunidades imediatas possibilitando a perspectiva de crescimento profissional.
Recentemente fui a uma empresa e, numa conversa, seu presidente me falou que iria acabar com o programa de trainees porque era caro, e o pessoal, depois de treinado, acabava por ir embora. Francamente, fiquei olhando para ele sem ter o que falar. Falar o quê? Que a empresa dele era “bola murcha” e que logo todos esses jovens excepcionais percebiam aquilo e saíam dali? A mistura de método de gestão e gente excepcional e bem aproveitada é explosiva.
2- Acabo de voltar de uma experiência de dois anos no escritório de uma grande empresa do setor financeiro em Miami para ocupar uma diretoria em São Paulo. Percebo uma incômoda diferença na rotina: o excesso de reuniões. Chego a passar dias inteiros fechado numa sala. Meus colegas percebem e concordam, mas preferem alimentar essa falsa cultura de eficiência. Como conviver com essa realidade? Anônimo
Não existe nada de errado com reuniões desde que seram convocadas para resolver problemas e façam parte de uma rotina planejada. É normal haver reuniões rotineiras mensais programadas para acompanhamento de resultados. É também normal que pessoas sejam convocadas para ajudar a resolver problemas desde que possam contribuir para encontrar as causas e as soluções.
Para saber se no seu caso existe ou não um exagero na carga desse tipo de compromisso, o ponto central é descobrir que tipo de problema deve chegar até você. Alguns assuntos realmente pedem a participação de diretores. O problema começa quando existe a centralização excessiva das decisões. Sem o método de solução de problemas espalhado por toda a organização, de modo que muitas soluções sejam apontadas já no nível operacional, por exemplo, tudo sobra para o escalão superior. Como resultado, a liderança fica sobrecarregada.
Tente fazer o seguinte: anote todas as reuniões que você teve de ir, divida em dois grupos — reuniões rotineiras de acompanhamento de resultados e reuniões circunstanciais de solução de problemas. Para o segundo tipo, antes de decidir se você tem ou não de estar presente, tente responder se você é dono do problema.
Se o dono for realmente a diretoria, pois é uma questão relativa a uma função estratégica da empresa, então você terá de estar lá. No entanto, se for um problema operacional, algo está errado na divisão de trabalho. Procure saber a porcentagem de tempo gasto nesses problemas operacionais e converse com seu chefe a respeito. Se for o caso, vale a pena repensar toda a organização para que o trabalho seja mais bem dividido.