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Alô com a rede dos outros

Com atraso de mais de uma década, começam a chegar ao país as primeiras operadoras móveis virtuais

Call center da Porto Seguro: experiência em atendimento levada à nova operadora virtual (Germano Lüders/EXAME.com)

Call center da Porto Seguro: experiência em atendimento levada à nova operadora virtual (Germano Lüders/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 14 de março de 2011 às 06h00.

Como muitas tecnologias sofisticadas, a telefonia móvel veio ao mundo com uma singela e preciosa missão: tornar mais simples a vida de seus usuários. Não por acaso, aparelhos fáceis de usar e bons serviços de atendimento são, desde o início, atributos tidos como essenciais para a comunicação por meio de celulares.

Dos primeiros tijolões ao iPhone, o passar do tempo trouxe avanços aos aparelhos. O mesmo, porém, dificilmente pode ser dito sobre os serviços de telefonia móvel. No Brasil, como em boa parte do mundo, operadoras de celular estão entre as empresas que mais recebem reclamações de consumidores — somente no Reclame Aqui, site que registra queixas contra 25 000 empresas no Brasil, as quatro maiores operadoras somaram juntas 38 000 reclamações no último ano.

Poucos setores têm a imagem tão desgastada — e tão pouca percepção de distinção entre concorrentes. Para os insatisfeitos, porém, há uma boa notícia. Uma resolução aprovada em novembro pela Anatel, agência reguladora do setor, promete mudar a cara do setor no país. Em breve, a contratação de serviços de telefonia móvel poderá ocorrer não apenas em shoppings e lojas especializadas mas também em supermercados, bancos, farmácias e lojas de departamentos.

Com atraso de mais de uma década em relação a países da Europa e dos Estados Unidos, as operadoras móveis virtuais, ou MVNOs, estão liberadas para atuar no Brasil. Grosso modo, uma MVNO é uma empresa que oferece serviços de telefonia móvel como uma operadora, mas que não possui licença própria de espectro. Para funcionar, essas companhias adquirem grandes volumes de voz e dados das operadoras — capacidade que depois é repassada, com novas embalagens e novos preços, a seus clientes.

Pioneirismo

Com 3,5 milhões de clientes, a Porto Seguro é uma das maiores seguradoras do país. A companhia é também um dos grandes compradores de serviços de telefonia móvel no Brasil. Todos os anos, entre chamadas recebidas e realizadas, a Porto Seguro contabiliza mais de 20 milhões de ligações; diariamente, mais de 500 000 veículos são rastreados por chips através de redes de celular. Suprir necessidades internas da empresa foi a motivação natural para o lançamento, programado para o segundo semestre deste ano, daquela que será a primeira operadora móvel virtual do país.

Com investimentos de 70 milhões de reais e um contrato de aluguel da rede da TIM, a Porto Seguro Telecomunicações nasce com a meta de chegar a 1 milhão de usuários em três anos. “Queremos clientes que usam muito o celular, mas que queiram um serviço diferente”, diz Fábio Luchetti, vice-presidente executivo da empresa.

Para atingir a meta, mais de 23 000 corretores espalhados pelo país oferecerão chips de celular à base de clientes. Uma das principais estratégias do novo negócio é transferir parte da experiência adquirida em pós-venda no negócio de seguros para a MVNO. Pacotes e produtos estão em fase de estudos, mas a ideia é oferecer serviços hoje relegados pelas grandes operadoras — o rastreamento de veículos via SMS, por exemplo. Pelo modelo, ainda, o uso do celular poderá ser revertido em benefícios aos clientes, como descontos na renovação do seguro. “Acreditamos que podemos agregar valor dentro do sistema de telefonia celular”, diz Luchetti.


No mundo, cerca de 105 milhões de celulares funcionam hoje através de 600 operadoras virtuais em atividade. Na Europa e nos Es­tados Unidos, aparelhos de MVNOs representam cerca de 10% da base de celulares. De início, a possibilidade de entrar em um mercado bilionário, como o da telefonia móvel, atraiu empresas de todo tipo. Outras, como a finlandesa Blyk, foram criadas com propostas inovadoras na disputa por novos clientes.

Mirando o público jovem, a Blyk se lançou em 2007 como a primeira operadora de celular gratuita. O negócio era sustentado por propagandas direcionadas, que chegavam aos celulares dos usuários. Com dificuldades para alcançar um número de assinantes mini­mamente viável, a Blyk fechou as portas dois anos depois. Outras empresas, que entraram para competir em mar aberto apenas com preços mais baixos, tiveram destino parecido.

Em todo o mundo, prevalece hoje o modelo de MVNOs de nicho, que atende públicos específicos e que, em geral, estão ligadas a marcas estabelecidas, que possuem grandes bases de clientes. Um dos casos de êxito é a Virgin Mobile, fundada em 1999 no Reino Unido. Antes de ser comprada pela operadora Sprint, em 2009, a Virgin Mobile fez sucesso entre clientes fiéis da marca criada pelo empreendedor Richard Branson. Hoje, possui 15 milhões de clientes. “As MVNOs não devem ser uma operação de combate e concorrência direta com as operadoras”, diz Wilson Otero, principal executivo da Datora, empresa de telecomunicações que possui 20% de participação na nova Porto Seguro Telecom.

Além da Porto Seguro, outras empresas sinalizam interesse em lançar operadoras virtuais no mercado brasileiro. Há expectativa de que o Carrefour, que mantém MVNOs em quatro países, traga o negócio ao Brasil ainda neste ano. Circulam rumores de que o grupo Pão de Açúcar também esteja ensaiando o mesmo caminho. Para essas empresas, o objetivo deverá ser reproduzir experiências como a da varejista britânica Tesco, que, com a distribuição de chips gratuitos e promoções em que minutos gastos com celulares da Tesco Mobile são convertidos em pontos no programa de fidelidade, atingiu a marca de 2,5 milhões de usuários. Outro setor forte candidato a entrar no mercado de MVNOs é o financeiro.

Com a flexibilidade e a customização de serviços permitidos a uma operadora virtual, até mesmo celulares simples podem ser transformados em terminais bancários. A estratégia viria ao encontro de outras facilidades, como o home banking, que representa economia de gastos ao evitar que o cliente visite uma agência física.

Apesar das expectativas, a entrada tardia das MVNOs no Brasil deverá ter consequências sobre a adoção do modelo como um todo. Diferentemente dos cenários europeu e americano no início dos anos 2000, a telefonia móvel no Brasil é hoje um mercado em que há alta penetração — um momento da história em que existem, literalmente, mais chips de celular ligados do que pessoas vivas no país. (O último levantamento da Anatel indica a existência de 205 milhões de aparelhos em operação.)

Para 2015, a estimativa é que as MVNOs cheguem a 15 milhões de usuários no Brasil. “Há menos espaços vazios no mercado brasileiro”, diz Frederico Barbosa, diretor executivo da consultoria Europraxis. “Será preciso apresentar propostas realmente novas para atrair os usuários.”

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