Revista Exame

Bartenders brasileiros se destacam e inovam com ingredientes nativos

Bartenders brasileiros se destacam no cenário internacional e impulsionam a inovação com ingredientes nativos

 (Divulgação/Divulgação)

(Divulgação/Divulgação)

G

GabrielJusto

Publicado em 19 de agosto de 2021 às 05h21.

↑ Ana Paula Ulrich

Qual é a cor da amizade? Qual é o sabor do afeto? É com questionamentos abstratos assim que a curitibana Ana Paula Ulrich começa a pensar nos drinques que desenvolve, criando narrativas que, ao final, se transformam em experiências que vão além do paladar. Como o amanayara, por exemplo, que leva tequila silver, mel de cacau e jaca (que estimulam a produção de serotonina, o hormônio da felicidade), ácido de champanhe, flor de sal e uma folha de capuchinha.

Servido em um copo de cerâmica e acompanhado de uma velinha, a bebida faz alusão ao otimismo e à tradição ritualística dos brasileiros. E rendeu a Ulrich o primeiro lugar do concurso Patrón Perfectionists em 2019. 

“O desenvolvimento desse coquetel foi como um desenho. Eu sabia que precisava ter um verde, algum trabalho manual…”, explica Ulrich, que sempre quis ser atriz, se formou em design e, preocupada com os boletos, até começou a estudar engenharia florestal. O universo da coquetelaria, no entanto, acabou tomando conta de sua vida. Neste ano, ela foi finalista brasileira do maior campeonato de coquetelaria do mundo, o World Class Competition, promovido pela Diageo.

“Na coquetelaria eu consigo aplicar o raciocínio e os questionamentos do design e todo o conhecimento de botânica da engenharia florestal, revertendo uma frustração que eu tinha com a faculdade, de não conseguir gerar o impacto que eu gostaria no mundo”, conta Ulrich, que há três anos comanda o bar do luxuoso Palácio Tangará, em São Paulo, e durante a pandemia tem compartilhado seus conhecimentos pelo Instagram. “Isso me dá a clareza e a satisfação de saber que eu estou mesmo fazendo o que deveria estar fazendo.”


(Divulgação/Divulgação)

Alê D’Agostino

Quando Alexandre D’Agostino começou a trabalhar no bar do tradicional Spot, em 1998, o gim ainda era uma bebida malvista, “o último estágio do alcoolismo”. De trás do balcão do clássico restaurante próximo à Avenida Paulista, o bartender viu o destilado se tornar o queridinho da clientela, impulsionando o desenvolvimento da coquetelaria no Brasil. Com toda essa bagagem e já um pouco cansado de bater cartão, em 2017 ele decidiu tocar o próprio negócio: a APTK Spirits, marca de drinques engarrafados.

Em pouco tempo, o showroom da marca em Pinheiros acabou se tornando o menor bar da cidade — eram apenas 17 metros quadrados, rodeados por uma área externa que garantia o ambiente democrático e informal que Alê imaginara. No começo de 2020, o bar fechou para reforma e, com a chegada da pandemia, nunca mais voltou. Mas os drinques engarrafados, o core original do negócio, logo se provaram uma ideia bastante conectada com o espírito do tempo. Em vez de um novo bar, Alê tirou do papel uma fábrica.

“Essa coisa de escalar é outro mundo. Tem de pensar em outra metodologia de produção e manter a criação, pensando no processo”, afirma. No verão passado ele chegou a inaugurar o bar Apothekario, na Pousada do Sandi, em Paraty, em que testava frutas da Mata Atlântica nas receitas, mas que já fechou. Enquanto negocia a volta do bar em São Paulo, o bartender desenvolve receitas e cardápios para marcas e hotéis. “Tudo isso é legal, mas gosto de ter um lugar para receber as pessoas.”


(Leandro Fonseca/Exame)

↑ Diogo Sevilio

Para Diogo Sevilio, vencedor da final brasileira do World Class em 2017, trabalhar do lado de dentro do balcão foi, por muito tempo, um jeitinho de garantir uma grana extra para o rolê. Por anos, ele se dividiu entre lojas de shopping e os balcões de festas, até que um dia foi chamado para trabalhar em bares de restaurantes como o do italiano Vito, em São Paulo, onde conheceu de perto a gastronomia e a coquetelaria.

“Ao lidar diretamente com o consumidor fui vendo quanto isso tem um potencial transformador”, conta Sevilio, que em seus drinques no Cozinha 212, em Pinheiros, usa frutas incomuns, como o cambuci, o que gera demanda para pequenos produtores e lhes permite continuar cultivando um fruto que, para eles, também é uma expressão cultural. “Esse tipo de relação me fez cravar minhas raízes nesse meio. A forma como transformamos o alimento nos transforma e nos permite transformar nossa realidade também.”

E, nessa vibe, Sevilio, que não bebe há três anos (“já bebi de tudo, não preciso mais”), trabalha para transformar a coquetelaria em um universo não só acessível mas acolhedor. Ao recriar coquetéis clássicos com bebidas “marginalizadas” mas de igual qualidade — como colocar o rabo de galo no lugar do manhattan —, ajudou a equilibrar as contas do bar, abriu o paladar da clientela para novas possibilidades e ainda inflou a autoconfiança de sua brigada, que se encanta em vender algo que, ao contrário dos drinques caros, faz mais parte de sua realidade. O conceito se desdobrou, então, na festa Marginália, que até antes da pandemia oferecia drinques “marginalizados” por apenas 12 reais em bares e botecos tocados pelos próprios donos. “Isso aumenta a autoestima desses caras e diz para pessoas de fora do rolê AAA que a coquetelaria também é para elas”, comemora o bartender que não bebe.  

Acompanhe tudo sobre:BaresBebidasbebidas-alcoolicasRestaurantes

Mais de Revista Exame

Linho, leve e solto: confira itens essenciais para preparar a mala para o verão

Trump de volta: o que o mundo e o Brasil podem esperar do 2º mandato dele?

Ano novo, ciclo novo. Mesmo

Uma meta para 2025